Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -A campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) montou uma operação de guerra no domingo para tentar afastar o candidato à reeleição de Roberto Jefferson, ao reforçar a condenação às ações do ex-deputado e ao mesmo tempo tentar ligar o presidente de honra do PTB a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e assim buscar conter possíveis danos eleitorais a uma semana do segundo turno, de acordo com duas fontes ouvidas pela Reuters.
Aliado de Bolsonaro, Jefferson disparou tiros de fuzil e lançou granadas ao resistir na manhã de domingo a uma ordem de prisão do Supremo Tribunal Federal (STF), deixando dois agentes da Polícia Federal feridos.
O ministro do STF Alexandre de Moraes havia revogado uma prisão domiciliar do petebista --concedida em janeiro deste ano em razão de problemas de saúde-- por ele ter desrespeitado várias vezes medidas cautelares, entre elas quando divulgou vídeo na sexta-feira passada com graves ofensas contra a ministra do Supremo Cármen Lúcia.
O petebista --que passou a apoiar a apoiar Bolsonaro no segundo turno de 2018-- havia sido inicialmente preso em caráter preventivo em agosto de 2021 pela PF, por determinação de Moraes, em uma investigação que incitação ao crime e ataques a instituições.
De fevereiro a julho do ano passado, em várias ocasiões, Jefferson atacou ministros do Supremo e incitou crimes de racismo e homofobia. Em uma entrevista, ele chegou a equiparar LGBT, drogado, traficante e assaltante de banco à "demolição moral da família". Ele virou réu nesse caso.
Nesta segunda-feira, Jefferson foi indiciado, segundo a corporação, pela tentativa de quatro homicídios ao atirar na direção de agentes da PF.
ELEVANDO O TOM
Bolsonaro foi elevando o tom da resposta ao episódio ao longo do domingo. Em seu tuíte inicial sobre o tema, o presidente repudiou as ofensas a Cármen Lúcia e a "ação armada" da Jefferson, mas também criticou a "existência de inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição e sem a atuação do MP", numa referência a investigação que apura a existência de uma organização criminosa digital voltada para atacar instituições democráticas, alvo de críticas constantes dele.
Nas publicações e aparições públicas seguintes, Bolsonaro já se referia a Jefferson como bandido e ainda tentava levar algum crédito pelo desfecho do episódio.
"Como determinei ao ministro da Justiça, Anderson Torres, Roberto Jefferson acaba de ser preso. O tratamento dispensado a quem atira em policial é o de bandido. Presto minha solidariedade aos policiais feridos no episódio", disse.
O presidente tinha chegado a determinar a ida de ao Rio de Janeiro para acompanhar o andamento do que chamou de "lamentável episódio". Contudo, segundo uma fonte, ele recuou e deixou Torres monitorando a situação de Juiz de Fora (MG) após Moraes ter emitido uma segunda ordem de prisão contra Jefferson e alertado que qualquer autoridade que interviesse no caso poderia responder por prevaricação.
Na sequência, além de se referir a Jefferson como bandido, o presidente e aliados se referiram ao ex-deputado "criminoso" e "infrator" e passaram a tentar ligá-lo a Lula, por ter dado sustentação ao governo do adversário em 2003 e só teria se afastado após o escândalo do mensalão, no qual foi o delator em 2005.
"Tem gente aí, como o candidato fujão (numa referência a Lula) que quer tirar proveito da situação dizendo que ele (Jefferson) coordena minha campanha e é meu amigo. Ele não coordena minha campanha e não tem nada de amizade", disse Bolsonaro, na sabatina da Record de domingo à noite.
O presidente ainda citou em entrevista à Record que Jefferson entrou com uma queixa-crime contra ele e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, no Superior Tribunal Militar (STM) por prevaricação. Ele se refere a uma ação em que o petebista questiona o fato de que Bolsonaro e o titular da Defesa não terem acionado as Forças Armadas contra o que seria arbitrariedades do Supremo. O foro dos dois, no entanto, seria o STF e não o STM.
Para tentar se distanciar, o candidato à reeleição chegou até a falar que não tinha foto com Jefferson, mesmo com dezenas de encontros registrados entre os dois nos últimos anos, inclusive no Palácio do Planalto.
Nesta segunda-feira no final da tarde, em entrevista ao portal Metrópoles, Bolsonaro seguiu com a estratégia ao ser questionado sobre o assunto.
"Tenho vários amigos pelo Brasil, se algum faz besteira o que eu tenho a ver com isso?", questionou ele, num primeiro momento.
"Roberto Jefferson, no meu entender, tinha tudo para continuar a sua batalha por liberdade. Agora quando ele atira em direção aos policiais e lança uma granada --que seja uma granada de efeito moral-- ele perdeu completamente a razão e vai responder agora por tentativa de homicídio. Lamento, mas não posso concordar com isso", acrescentou.
Pesquisa AtlasIntel divulgada nesta segunda mostrou que 66,7% dos entrevistados têm uma imagem negativa de Jefferson, incluindo 46,7% daqueles que se declaram bolsonaristas. Apenas 3,8% dos entrevistados disseram ter imagem positiva, enquanto 29,5% disseram não saber. Entre os bolsonaristas, 13,4% têm imagem positiva do ex-deputado, e 39,9% disseram não saber.
Para 59,7%, a decisão do STF de prender Jefferson é justa, enquanto 16,4% disseram considerar injusta e 23,9% disseram não saber do caso. Entre os bolsonaristas, 25,9% disseram considerar justa, ante 36,8% que consideraram injusta.
A reação de Jefferson contra os agentes da PF foi considerada injustificada por 64% dos entrevistados, enquanto 8,5% disseram ser totalmente justificada e 7,3% disseram ser parcialmente justificada. Apenas entre os apoiadores de Bolsonaro, 44,9% disseram ser injustificada, enquanto 7,6% disseram ser totalente justificada e 16,6%, parcialmente justificada.
Uma fonte da campanha admitiu que o episódio envolvendo Jefferson quebrou o discurso de vitimização do bolsonarismo em relação ao Supremo porque gerou uma onda de solidariedade à ministra Cármen Lúcia e também acabaram, de maneira geral, por dar razão às medidas que Moraes tomou contra o petebista.
Não à toa, houve quem no núcleo bolsonarista mais ideológico --em especial nas redes sociais-- chegasse a dizer que Bolsonaro deveria ficar do lado de Jefferson na resistência ao Supremo. Mas esse caminho é minoria no núcleo da campanha.
"Muita preocupação com as próximas pesquisas. Vamos torcer para que seja igual à crise das venezuelanas. Muito barulho, mas pouco impacto eleitoral", disse uma das fontes.
"É olhar para frente e torcer que não haja um impacto eleitoral", reconheceu ela, ao acrescentar que a ordem é buscar falar de ações do governo e comparações com a gestão petista. Segundo a fonte, a campanha deve lançar nos próximos dias 22 propostas --o número eleitoral de Bolsonaro-- para o eleitorado. Isso era para ter ocorrido no sábado.
O candidato à reeleição terminou o primeiro turno 6,2 milhões de votos atrás de Lula. As pesquisas eleitorais têm mostrado que a vantagem do petista tem se estreitado.
(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier, no Rio de JaneiroEdição de Alexandre Caverni e Pedro Fonseca)