Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou nesta quinta-feira o julgamento da chapa eleitoral encabeçada por Jair Bolsonaro em 2022 que poderá tornar o ex-presidente inelegível em ação a que responde por ter promovido, em julho do ano passado, uma reunião no Palácio da Alvorada com embaixadores em que atacou o sistema eleitoral brasileiro.
Na sessão desta quinta, o relator da ação, Benedito Gonçalves, abriu o julgamento ao apresentar seu relatório do processo, um resumo de todas as principais questões abordadas na ação.
O relator ressaltou a competência da Justiça Eleitoral para apurar desvios de finalidade por um chefe de Estado a fim de obter possíveis vantagens eleitorais.
Na sequência, manifestaram-se os advogados do PDT, autor da ação, e da chapa composta por Bolsonaro e pelo ex-candidato a vice Walter Braga Netto, além do representante do Ministério Público Eleitoral (MPE). O julgamento foi suspenso e será retomado na terça-feira da próxima semana, dia 27.
O MPE pediu a inelegibilidade de Bolsonaro por "abuso de poder político" e "uso indevido dos meios de comunicação" durante a reunião com embaixadores. Para o vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet Branco, o encontro serviu para propagar notícias falsas e conclusões falaciosas e tinha o intuito "apenas e nitidamente eleitoreiro".
"Está caracterizado o uso da função pública para benefício eleitoral indevido", destacou. O MPE também reforçou o pedido de rejeição de uma eventual punição para Braga Netto.
Em sua fala, o advogado do PDT, Walber Agra, disse que é nítida a configuração de abuso de poder político na realização da reunião com embaixadores e que o caso de Bolsonaro não tem qualquer relação com a absolvição da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, em 2017, por ilegalidades eleitorais.
"A configuração de abuso de poder político foi nítida... Viramos uma democracia da fake news. Viramos uma democracia da relativização de preceitos morais", disse Agra em sua fala inicial.
O advogado do PDT ainda argumentou que a inclusão no processo da chamada "minuta do golpe" encontrada na residência do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres em operação da Polícia Federal se trata do "desdobramento dos fatos" incluídos na ação da acusação.
"A responsabilidade da minuta do golpe está no Palácio do Planalto", ressaltou ele, ao considerar que a tentativa de golpe em 8 de janeiro foi uma consequência dos atos inciais.
Já o advogado de Bolsonaro, Tarcísio Vieira, disse que, se julgado que o ex-presidente "queimou a largada" em matéria de propagando eleitoral ao realizar a reunião, que seja aplicada uma multa, e não a suspensão de seus direitos políticos.
"Talvez em um tom inadequado, ácido, excessivamente contundente (Bolsonaro) fez colocações sobre o sistema eleitoral brasileiro", disse Vieira em fala inicial. "Em um escrutínio severo, teriam cordão de gerar multas."
Vieira ainda afirmou que a ação do PDT contra Bolsonaro é "impostora" e "fadada ao insucesso", e que a ligação da reunião com os atos antidemocráticos de 8 de janeiro é uma narrativa "inventiva e falaciosa".
"Em uma nova narrativa inventiva e falaciosa, aquela simples reunião de julho do ano passado passou a ser tida como o ascender de um rastilho de pólvora que redundou na lamentável explosão dos atos de 8 de janeiro", afirmou Vieira.
Após a sessão de quinta, o advogado de Bolsonaro disse a jornalistas que espera que os ministros julguem, antes de darem os votos sobre o mérito do processo, pedidos preliminares, entre eles a retirada de fatos referentes à "minuta do golpe". Reforçou, conforme dito em entrevista à Reuters publicada na terça-feira, que deverá recorrer ao Supremo Tribunal Federal em caso de derrota.
EXPECTATIVA
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, encerrou a sessão desta quinta-feira após as sustentações orais, e o julgamento será retomado na próxima terça-feira com o voto do relator. A expectativa é que o julgamento seja concluído até a quinta-feira da próxima semana com os votos dos demais ministros.
Fontes do tribunal e que acompanham o processo ouvidas pela Reuters avaliam que, ao final das esperadas três sessões de julgamento da ação movida pelo PDT, Bolsonaro sofra uma inédita condenação por crimes que vão de abuso de poder político, desvio de função e tentativa de deslegitimar o processo eleitoral.
Deverá pesar contra o ex-presidente o chamado "conjunto da obra", após a inclusão no processo da minuta do golpe e também a sombra das revelações da orquestração para se impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que derrotou Bolsonaro na eleição do ano passado.
Ainda que a análise do seu caso esteja no início, o ex-presidente, que viajou para o Rio Grande do Sul para participar de eventos nesta quinta, fez críticas ao julgamento, chamando-o de "politiqueiro".
“Hoje começa o meu julgamento político. Ou melhor, não é político, é politiqueiro. Da mais baixa intenção por parte de alguns. Não estou aqui atacando o TSE, longe disso. Mas a fundamentação é coisa inacreditável: ‘reuniu-se com embaixadores’”, afirmou.
(Edição de Pedro Fonseca e Alexandre Caverni)