Por Eduardo Simões
SÃO PAULO (Reuters) - A eventual ascensão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à Presidência da República pode dar algum refresco no atual cenário de turbulência política sem, no entanto, garantir a estabilidade política e a governabilidade necessárias para a aprovação de medidas legislativas e para a retomada de credibilidade junto à opinião pública.
O presidente da Câmara dos Deputados tem sido cada vez mais apontado como sucessor do presidente Michel Temer, atolado em denúncias.
Temer pode ser afastado do cargo caso os deputados autorizem o Supremo Tribunal Federal (STF) a avaliar uma denúncia contra ele e caso a corte decida tornar o presidente réu. Nesse caso, Maia assumiria a Presidência interinamente, mas sua eventual eleição em caso de perda de mandato de Temer também tem ganhado corpo.
"Talvez se saia dessa instabilidade de 'o presidente vai preso, o presidente não vai preso' e você entre numa outra onda um pouco menos tensa. Mas dizer que ele vai ser o garantidor das reformas, do processo econômico, isso já é exagero", disse à Reuters o cientista político Carlos Melo, professor do Insper.
Analistas ouvidos pela Reuters lembraram que Maia e seu partido, o DEM, têm um diferencial em relação a Temer e ao PMDB na seara das recentes denúncias, já que não estariam tão implicados em acusações como o presidente e seu partido.
"O DEM tem uma vantagem, como ficou muito tempo fora do governo, parece estar menos comprometido. Parece. Mas não tem o estofo político, lideranças políticas", disse Melo.
"Do ponto de vista criminal, talvez estabilize. Agora, do ponto de vista da liderança política não. Do ponto de vista da liderança política, a gente está longe disso."
Maia foi citado em delações premiadas de executivos da Odebrecht e responde a inquéritos no STF acusado de pedir e receber 350 mil reais da empreiteira a pretexto de auxílio em campanha eleitoral em 2008, ano em que não disputou eleição, e de receber 100 mil reais do setor de propinas da construtora sob o codinome "Botafogo".
"Maia com certeza sabe onde o calo aperta", disse Danilo Gennari, sócio da Distrito Relações Governamentais em Brasília, sobre as acusações contra o presidente da Câmara.
Os analistas, entretanto, apontam que as implicações contra Maia ainda são menos graves do que as que pesam contra Temer e que as acusações dos delatores ainda precisam ganhar materialidade. Maia nega quaisquer irregularidades e disse que os inquéritos no STF serão arquivados.
"Ele não é a primeira opção de ninguém, talvez nunca tenha sido, mas dada a conjuntura, a escolha que existe hoje é o Temer ou o Maia. Nessas condições o Rodrigo Maia consegue muito mais apoio que o Temer. Então é uma questão de tempo", disse Gennari, para quem Maia deve ser eleito presidente indiretamente até o fim do mandato atual após possível afastamento e perda de mandato de Temer por condenação no Supremo.
"Ninguém vai querer que o Brasil tenha um quarto presidente em dois anos, três anos", avaliou.
REFORMAS
Para o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo, o fato de ter havido uma convergência em torno do nome de Maia como alternativa a Temer complica a vida do presidente.
"A grande mudança no debate político no curto prazo foi o fim daquela fase de especulação sobre quem poderia ser um plano alternativo ao Temer", disse.
"É um elemento importante na análise da luta pelo mandato presidencial, dado que essas trocas de chefe de governo fora do período eleitoral no presidencialismo precisam contemplar esses dois pontos: apoio para a saída do chefe do Executivo, mas mais do que isso, o apoio ao nome alternativo", explicou.
A chegada de Maia ao Palácio do Planalto não deve, no entanto, assegurar a aprovação de reformas consideradas prioritárias por Temer e defendidas pelo mercado financeiro, especialmente da Previdência, ao contrário do que procurou sinalizar o presidente da Câmara em publicações em sua conta no Twitter nesta sexta-feira.
Maia usou a rede social para afirmar que, em vez de "potencializar" a crise, é preciso ter "muita tranquilidade e prudência" no momento, e defendeu que se deve avançar na agenda de reformas no país.
"Um ponto importante é evitar uma análise de que a simples troca presidencial implicaria na superação dos dilemas de governabilidade. Do ponto de vista da agenda das reformas, seja a continuidade do Temer, seja Rodrigo Maia, a tendência é de redução do espaço para aprovação dessas medidas", disse Cortez, apontando que possivelmente a única certeza nessa transição seria a manutenção por Maia da equipe econômica de Temer.
"Provavelmente o governo deve continuar com baixa popularidade e com déficit de legitimidade à luz do eleitorado e da sociedade como um todo, o que naturalmente sinaliza que não necessariamente a simples troca é a solução para os problemas de governabilidade que afetam a agenda econômica", acrescentou.