Arena do Pavini - A consultoria independente de investimentos Empiricus, que publica conteúdos financeiros, obteve na Justiça Federal uma liminar que impede a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de tentar regulamentar a empresa ou enquadrar seus funcionários na função de analistas de valores mobiliários, informou a empresa em nota. A decisão, segundo a Empiricus, é inédita e ocorre após a empresa ir à Justiça por conta de uma autuação da CVM que solicitava acesso irrestrito ao conteúdo fechado para assinantes da empresa.
“Entendemos que qualquer regulação sobre uma empresa como a nossa, que é uma publicadora de conteúdo, é inadequada porque cerceia a liberdade de expressão”, afirma Caio Mesquita, presidente da Acta Holding, dona da Empiricus. “Por isso fomos à Justiça. Ele acrescenta que “estamos felizes em poder continuar oferecendo aos nossos assinantes um conteúdo independente de investimentos, sem qualquer tipo de cerceamento”.
Na decisão liminar, segundo a nota da Empiricus, o juiz José Carlos Motta “corrobora com a tese de Mesquita”. “As normas infralegais editadas pela Comissão de Valores Mobiliários destinadas a impor restrições aos editores e publicadores de conteúdo voltado ao mercado financeiro se revelam inconstitucionais, por configurarem censura prévia à liberdade de expressão”, informa a nota da Empiricus.
A Empiricus trava uma queda de braço com os reguladores há alguns anos por conta da estratégia de marketing agressiva adotada pela empresa. A Empiricus foi criada em 2009 pelo analista de mercado e gestor Marcos Elias e os atuais sócios sócios, com a proposta de ser a primeira casa de análise de ações independente Brasil, sem ligação com bancos ou corretoras. Em 2012, teve problemas com a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) pela forma agressiva com que se referiu à Marfrig (SA:MRFG3) e a um de seus executivos, resultando em uma das primeiras punições da entidade.
Após a punição, Elias deixou a empresa e, em 2013, ela se associou à americana Agora Inc., um grupo editorial voltado para publicações financeiras que também esteve envolvido em disputas com o regulador dos mercados dos EUA, a Securities and Exchance Commisssion (SEC), por indicações de investimento em suas publicações. A Agora também recorreu à liberdade de imprensa prevista na Constituição dos Estados Unidos para rebater as acusações da SEC.
O fim do Brasil, o começo
O grande saldo da Empiricus se deu durante a campanha eleitoral de 2014 com a campanha “O fim do Brasil”, que alertava para os impactos negativos que a eleição de Dilma Rousseff, do PT, teria sobre a economia do país. O vídeo foi alvo de ações judiciais do PT, o que acabou aumentando a popularidade da consultoria, que passou a adquirir outros veículos de imprensa, como a Jolivi, de saúde, o site O Antagonista e, mais recentemente, a Inversa, focada em publicações financeiras. Passou também a contratar jornalistas para cuidar de parte de suas publicações, que incluem boletins de mercado financeiro e de fundos de investimentos. O último empreendimento foi o portal de notícias Seu Dinheiro, em parceria com a Agência Estado. Mas outros relatórios com indicações de oportunidades de investimentos continuam a ser publicados.
Instrução regulou empresas de consultoria independentes
Em maio deste ano, a CVM editou a Instrução CVM 598, que regulamentou a atividade de analista de valores mobiliários. Uma das principais alterações trazidas pela nova norma foi a exigência de que as empresas de analistas de valores mobiliários se credenciem na CVM, passando a ser fiscalizadas diretamente por ela e de maneira mais eficaz. A mudança atingiu diretamente as empresas de análise independentes, como a Empiricus, que cresceram nos últimos anos vendendo relatórios e recomendações de ações e títulos do mercado de capitais para investidores. Com a medida, a CVM quis evitar abusos nos anúncios e comunicações usadas por essas empresas e que podem induzir o investidor a erro, como promessas de ganho garantido e ausência de riscos, diz a autarquia. Para isso, as empresas de consultoria teriam de cadastrar seus analistas e se cadastrar também, passando a se responsabilizar pelo material distribuído e pelo marketing desse material.
A diferença é que a supervisão dos analistas na Instrução 483 era focada na pessoa natural, no analista, explica Vera Simões, gerente de registros e autorizações da CVM. “Assim, a atividade já era regulada, mas era focada no analista que emitia o relatório”, diz. Uma das preocupações da norma é com a comunicação dessas empresas com o mercado e com os investidores, explica Antonio Berwanger, superintendente de Desenvolvimento de Mercado da CVM. “Nossa preocupação é de que a empresa não assegure rendimentos, ou que dê garantias ou fale que não há riscos”, diz. “São formas de se comportar para quando a empresa estiver fazendo esse tipo de comunicação que não existiam na regra anterior e que a CVM achou adequado para o novo contexto, já que observamos alguns participantes mais arrojados”, destaca.
Descredenciamento
Como resposta, a Empiricus pediu dois pareceres de renomados juristas de mercado de capitais, Modesto Carvalhosa e Ary Oswaldo Mattos Filho, e anunciou hoje que seus sócios iam pedir o cancelamento de seus Certificados Nacionais de Profissional de Investimento (CNPI), concedidos pela Apimec.
Segundo Felipe Miranda, sócio da Empiricus que assina o comunicado, ele e o sócio Rodolfo Amstalden pediram o descredenciamento da Apimec pois, segundo eles, a empresa hoje é uma “publicadora de conteúdo”. “Ganhamos dinheiro com assinaturas de nossos relatórios e venda de espaço publicitário, igualzinho aos jornais e revistas. Tudo e só isso”.
CVM diz que vai acionar a Procuradoria Federal
Em nota, a CVM informou que “está ciente da decisão em questão e, por intermédio de sua Procuradoria Federal Especializada (PFE/CVM), tomará as medidas cabíveis”. Neste momento, diz a nota, “a Autarquia não fará comentários adicionais”.
Ao que tudo indica, a disputa entre CVM e Empiricus vai continuar. O que no fim pode ser até bom para o marketing da consultoria, ou melhor, da publicadora de conteúdo.
Por Arena do Pavini