Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - O governo enfrenta uma grande dificuldade no Congresso diante de uma base instável, e deve se mobilizar para atender às demandas de aliados de forma a angariar apoio suficiente para aprovar ao menos os projetos que não exigem maioria qualificada, caso dos que integram o pacote envolvendo as mudanças das metas fiscais para 2017 e 2018.
Segundo dois parlamentares, o Executivo irá trabalhar para resolver insatisfações e pendências de aliados levando em conta a fidelidade principalmente na votação que rejeitou a denúncia contra o presidente Michel Temer no início de agosto, o que deve levar a uma reorganização da Esplanada. A mobilização do governo incluirá também uma ação de punições aos que não entregaram seus votos.
"O momento é extremamente delicado para o governo na medida em que parlamentares fiéis sentem-se desprestigiados e partidos governistas preteridos em detrimento de partidos semi-governistas”, disse um dos parlamentares referindo-se ao PSDB, que além de ter sua bancada dividida na votação da denúncia, divulgou programa na quinta-feira criticando o que chamou de “presidencialismo de cooptação”.
O programa irritou o Planalto, tucanos que ainda defendem a permanência no governo e integrantes de outros partidos da base que reclamam por mais espaço.
“A base não está estabilizada, mas o governo já se preparou e vai atender, no campo republicano, as demandas que estão postas”, disse outro parlamentar, também pedindo para não ser identificado.
Segundo ele, aqueles que ainda não “perderam posições” no governo pela infidelidade devem perdê-las, e “pendências” serão resolvidas.
“Quem não estiver junto não será prestigiado, ou perderá o prestígio que tem”, disse, classificando o programa do PSDB como um “tiro no pé” por intensificar divisões inclusive dentro do próprio partido.
PARECE QUE PIOROU
Se a base já estava irritada com a votação da denúncia, em que alguns partidos da base --o PSDB entre eles-- votaram rachados, agora, o programa dos tucanos criticando o governo serviu como a gota d’água, principalmente para legendas que integram o centrão --PP, PR, PSD, ente outros.
Eles reclamam por maior participação no governo, questionando o fato de um partido como o PSDB, que classificam como rebelde, contar com quatro ministérios na Esplanada.
“O programa do PSDB veio para acirrar esse sentimento”, reconhece um dos parlamentares, para quem o presidente Temer deve chamar a parte governista do partido para discutir o real tamanho do PSDB no governo.
E de fato, se quiser ver seus projetos de interesse aprovados no Congresso, o governo terá de se esforçar na articulação.
Dentre as propostas está seu pacote de medidas para incrementar a arrecadação --caso do refinanciamento de débitos tributários (Refis), a reoneração da folha de pagamento de empresas e a elevação da contribuição previdenciária de funcionários públicos, entre outros, além do projeto que altera as metas de resultado fiscal para 2017 e 2018.
Essas medidas não precisam de um quórum especial. Já uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), como a que trata da reforma da Previdência, exige o voto favorável de ao menos 308 deputados.
Mesmo assim, essas votações com quórum mais facilitado devem demandar um esforço de articulação do governo e poderão servir como um termômetro do comportamento da base.
“Vai ser um aquecimento da base, enquanto os problemas vão sendo atendidos, as queixas vão sendo resolvidas, e você vai ter uma base construída para aprovar projetos infraconstitucionais (que não exigem quórum de PEC)”, disse o parlamentar.
Mesmo antes da divulgação do programa do PSDB, integrantes da base já demonstravam insatisfação. Ameaçavam não votar o Refis e a reforma da Previdência.
Na Comissão Mista de Orçamento (CMO), por onde o projeto das metas deve passar, também instalou-se um mal-estar após a equipe econômica vetar pontos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018, culminando com a formação de um grupo de parlamentares que cobraram explicações do Executivo.
Mas antes de mergulhar de cabeça nesse plano de articulação, um outro tema polêmico precisa ser resolvido no Congresso, e tem prazo definido: a reforma política, que não terá validade para as próximas eleições se não for aprovada pelas duas Casas do Legislativo até o início de outubro.
Interessa aos congressistas definir uma forma de financiamento para as próximas eleições, e ainda não se chegou a um acordo sobre mudanças no sistema de eleição para deputados federais, estaduais, do Distrito Federal e vereadores.
E se não fosse o bastante, o governo terá de lidar ainda com a provável segunda denúncia contra Temer, que se espera seja oferecida pelo atual procurador-Geral da República, Rodrigo janot, antes de deixar o cargo, em meados de setembro.