Por Brad Haynes e Alonso Soto
MACEIÓ (Reuters) - Dilma Rousseff não é a primeira ocupante da Presidência da República forçada a descobrir na pele a lealdade de Renan Calheiros na iminência de seu possível impeachment.
Quase 25 anos atrás, Renan, atual presidente do Senado e aquele que decidirá a data e o formato da votação e do julgamento do impedimento de Dilma na Casa, teve nas mãos o destino de um conterrâneo do seu Estado natal de Alagoas: o então presidente Fernando Collor.
Em 1989, Renan era um dos principais conselheiros da vitoriosa campanha presidencial de Collor. Meros três anos depois, suas revelações explosivas a jornalistas e investigadores do Congresso ajudaram a derrubar Collor, então acusado de envolvimento em um escândalo de corrupção.
No momento em que o processo do impeachment contra Dilma ruma para o Senado, depois de ser aprovado na Câmara dos Deputados com 367 votos favoráveis, mais do que o mínimo necessário, no domingo, a petista e seus apoiadores têm motivos para olhar com temor crescente para Renan, um de seus aliados mais importantes e mais inconsistentes ao longo do último ano.
Renan tem resistido à ideia de apressar o processo de impeachment de Dilma ao lado de uma ala do PMDB, dando apoio à proposta de novas eleições gerais como solução para a crise.
Essas propostas, no entanto, são distantes e teóricas, ao passo que a decisão que agora está na frente de Renan é urgente. Ele enfrenta intensa pressão dentro de seu próprio partido e da oposição para rapidamente marcar a data para o Senado decidir se aceita ou não o pedido de impeachment da presidente.
O precedente do impeachment de Collor sugere que uma comissão será formada para apresentar uma recomendação sobre se Dilma deve ser julgada que deverá ser votada pelo plenário, possivelmente no início de maio.
Os senadores favoráveis ao impeachment precisam apenas de maioria simples no plenário do Senado para autorizar o julgamento.
Mas se Renan adiar essa votação, pode dar a Dilma um tempo vital para reagrupar, negociar e tentar obter votos de senadores a seu favor.
Pessoas próximas de Renan dizem que seu estilo astuto de realpolitik faz com que ele hesite em revelar seu próprio julgamento diante de um quadro político tão conturbado.
"O Renan pode decidir a história do país. Isso é exatamente o que ele não quer: ficar marcado como o cara que deu a machadada. Porque se isso der certo, é casuísmo, e se der errado, aí o cara está morto."
Os assessores do peemedebista não responderam a pedidos de comentário, mas nesta segunda-feira, em entrevista a jornalistas, Renan minimizou seu papel, afirmando que não vai acelerar nem atrasar o processo de impeachment, mas seguirá a lei e a Constituição.
SOBREVIVENTE
Renan, de 60 anos, é de uma estirpe de políticos da velha guarda que entrou na política durante o regime militar e ascendeu após a redemocratização à base de concessões e um instinto de sobrevivência afiado.
Nascido no interior de Alagoas, o terceiro Estado mais pobre e o mais violento do país, Renan teve uma carreira marcada por mudanças em sua fidelidade.
Eleito para o Congresso pela primeira vez em 1982, ele logo firmou a reputação de mediador político e se aliou a todos os presidentes brasileiros desde Collor a partir de 1990, mesmo quando a ideologia dentro do Palácio do Planalto guinou para a esquerda nos governos de Dilma e de seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele também é conhecido por escapar por pouco de escândalos de corrupção que teriam acabado com políticos menos experimentados.
Um desses incidentes ocorreu em 2007, quando uma revista relatou que o lobista de uma empreiteira pagou auxílio-alimentação para uma filha que Renan teve fora do casamento com uma jovem jornalista.
Acusações adicionais, incluindo de evasão fiscal e negócios escusos, levaram à instalação de um inquérito no Conselho de Ética do Senado e a pedidos de deposição de Renan da função de presidente da Casa.
Renan renunciou ao comando do Senado, conseguindo desarmar os ataques o suficiente para angariar votos e evitar a cassação de seu mandato.
Em 2013 Renan voltou a presidir o Senado, e quando Dilma começou a perder apoio na Câmara e os pedidos de impeachment começaram a ser orquestrados, ele correu para socorrê-la, ajudando-a a obter a aprovação de um pacote fiscal crucial e adiando uma auditoria sobre violações das leis orçamentárias, as chamadas 'pedaladas fiscais', em função das quais ela agora pode ser julgada no Senado.
Mas colegas seus no PMDB, que liderou a iniciativa pelo impeachment na Câmara, acham improvável que Renan impeça a derrocada de Dilma.
Um líder partidário bastante próximo ao vice-presidente e correligionário Michel Temer, o substituto de Dilma caso ela seja impedida, admitiu haver divisões dentro do PMDB, mas disse que diante de grandes mudanças políticas o partido se une.
Para provar o argumento, a fonte ligou para Renan durante a entrevista. "Vamos em frente juntos, meu amigo", disse a ele na conversa descontraída.
Nesta segunda-feira, quando Renan assumiu o papel principal na saga do impeachment, o senador se reuniu com Dilma, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, e encontrará ainda Ricardo Lewandowski, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), responsável por presidir um eventual julgamento de Dilma no Senado.
Mas o ímpeto está claramente com o campo pró-impeachment, e isso pode fazer toda a diferença.
"Acho que o Renan está neste momento jogando para ver quem ganha. Mas ao chegar lá, ele vai ser o primeiro a enforcar ela, porque a pressão vai ser muito grande, não sustenta", disse o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, presidente do partido Solidariedade e crítico feroz de Dilma, enquanto ocorria a votação da aceitação do processo de impedimento na Câmara na tarde de domingo.