Por Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - A demissão do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general da reserva Gonçalves Dias, inflamou a oposição e fez crescer o risco do governo ter de enfrentar sua primeira CPMI no Congresso, uma comissão para investigar o 8 de janeiro convocada pela oposição, num momento em que o Planalto quer apostar todas as fichas na aprovação da agenda econômica prioritária.
Um dos líderes da oposição, senador Ciro Nogueira (PI) - ex-ministro da Casa Civil no governo Jair Bolsonaro -, afirmou à Reuters que a instalação da CPMI do 8 de janeiro se tornou "inevitável" depois da saída do general, e o ex-ministro precisa ser o primeiro a ser convocado.
Nogueira não está sozinho na percepção. Ao menos um aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), alinhado ao governo, avalia que a tendência agora é que a CPMI vá adiante.
O Planalto também refazia os cálculos. Depois de ter conseguido adiar a sessão do Congresso em que a comissão mista de inquérito seria instalada, o governo acreditava ter ganho algumas semanas de fôlego e tempo para começar a liberação de emendas parlamentares do Orçamento deste ano, assim como as nomeações de cargos de segundo escalão, um processo lento que tem atraído a reclamação de parlamentares.
A esperança era que o fluxo de verba fizesse alguns parlamentares reverem a decisão de apoiar a CPMI, que se tornou a principal plataforma da oposição para fustigar o Planalto e emplacar a versão de que o governo Lula foi conivente com os ataques de bolsonaristas que rejeitavam o resultado eleitoral.
"Até ontem a percepção era de que seria difícil (segurar a instalação), mas que havia um tempo para ganhar fôlego e conseguir tirar alguns nomes. Mas com esse fato novo vamos ter que ver como fica", disse à Reuters uma fonte palaciana.
Já a fonte ligada à Lira destacou que nem mesmo o eventual pagamento de emendas e distribuição de recursos por meio de emendas parlamentares poderia segurar a CPMI. "O governo não fez o dever de casa", frisou.
O Planalto vê três pontos negativos na possibilidade de uma CPMI sobre o assunto agora. A primeira delas é o fato de que a oposição tentará desfazer a imagem do governo como pró-democracia, que se consolidou depois dos ataques, em oposição ao golpismos dos apoiadores de Jair Bolsonaro.
Além disso, o governo prevê tentativas de constranger os ministros da Defesa, José Múcio Monteiro, e da Justiça, Flávio Dino, peças-chave do atual governo.
O terceiro é o mesmo risco apontado por Lula em janeiro: a dispersão de energia e tempo em um momento em que o governo tem que trabalhar a aprovação do arcabouço fiscal e uma futura reforma tributária e que ainda não teve testes para valer que dimensionem o tamanho de sua base de apoio.
A primeira proposta de CPI sobre o 8 de janeiro foi feita por parlamentares da base do governo, nos dias seguintes aos ataques, e chegou a ter assinaturas suficientes no Senado. A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a proposta foi enterrada. Lula avaliou que a CPI iria concentrar esforços que o governo precisaria para enfrentar temas complexos como a mudança do arcabouço fiscal.
Pouco depois, a oposição assumiu a proposta de uma CPMI, tentando construir uma versão de que o atual governo havia facilitado os ataques para ganhar politicamente.
Já na noite desta quarta, diante do novo cenário, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), deu um novo tom à posição do governo.
Segundo ele, aliados de Lula querem uma apuração "ampla, geral e irrestrita" da CPI mista.
"Ninguém mais do que o governo quer investigar o 8 de janeiro, doa a quem doer", disse. "Se o Congresso quiser instalar a CPI, estamos prontos para ajudar, inclusive para investigar", reforçou.