Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O ex-presidente Jair Bolsonaro convocou apoiadores para participar de um ato na Avenida Paulista em sua defesa, na tarde de domingo, que poderá servir como termômetro de sua atual força política, em meio ao cerco de múltiplas investigações que o envolvem e que podem, segundo os próprios aliados, levá-lo à prisão.
Bolsonaro foi alvo de uma busca e apreensão pela Polícia Federal no início do mês em uma investigação por suposta tentativa de golpe de Estado, além ser alvo de apurações como fraude em cartão de vacinas, ingresso irregular de joias sauditas no país e participação de milícias digitais para atacar adversários.
Após vários atos durante seu governo desafiando instituições e autoridades, Bolsonaro e aliados têm feito um chamamento para uma manifestação pacífica neste fim de semana, principalmente após os ataques às sedes dos Três Poderes por apoiadores do ex-presidente em 8 janeiro do ano passado.
"No domingo, às 15 horas, o nosso encontro na Paulista. Um encontro pacífico pelo nosso Estado Democrático de Direito, pela nossa liberdade, pela nossa família, pelo nosso futuro", disse o ex-presidente em vídeo publicado nesta sexta-feira na rede social X, antigo Twitter.
Na quinta-feira, o ex-presidente permaneceu em silêncio em depoimento à PF sobre as investigações da suposta tentativa de golpe. Seu advogado e ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social, Fabio Wajngarten, disse na porta da PF que o ato de domingo poderá reunir até 700 mil pessoas em defesa de Bolsonaro, incluindo políticos simpatizantes do ex-presidente.
"Temos mais de 100 deputados, temos 3 governadores, 10, 12 a ou 15 senadores. Esperamos na Paulista mais de 500, 600, 700 mil pessoas. A expectativa é a melhor possível", afirmou Wajngarten.
O governador paulista e ex-ministro do governo Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (Republicanos), já confirmou presença. Com Bolsonaro inelegível até 2030, ele é apontado como um potencial sucessor do bolsonarismo para a disputa presidencial de 2026.
Bolsonaro, inclusive, vai se hospedar no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, antes de ir junto com Tarcísio ao ato, disse à Reuters uma fonte ligada ao governador.
Contudo, uma fonte ligada à família de Bolsonaro disse não acreditar que o ato vai reunir tanta gente assim, mesmo com toda a mobilização feita nas redes sociais e também pelo pastor Silas Malafaia, idealizador do evento. Ainda assim, Bolsonaro quer se manter relevante como o principal representante da direita no país.
"Ele quer tentar mostrar força para o STF e se manter viável politicamente, mesmo que seja preso", afirmou essa fonte, comparando à situação por que Bolsonaro passa com a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes de ser preso em 2018.
O atual presidente ficou 580 dias preso por condenações da Lava Jato que posteriormente foram anuladas pelo Supremo e se reabilitou politicamente, vencendo a eleição presidencial em 2022 e voltando ao comando do país pela terceira vez.
GRANDE PREOCUPAÇÃO
A mesma fonte afirmou que há uma grande preocupação de aliados de Bolsonaro sobre o evento pelo risco de alguma declaração do ex-presidente contra o Supremo Tribunal Federal motivar medidas contra ele. A torcida, segundo a fonte, é que Bolsonaro não ataque o relator de seus processos no Supremo, Alexandre de Moraes, ou outras autoridades e instituições. "Mas ele é imprevisível", reconhece a fonte.
De fato, a PF poderá mesmo implicar, ainda mais, Bolsonaro e outros investigados por declarações que vierem a fazer no ato, segundo uma fonte da corporação envolvida diretamente nas investigações. No limite, não se descarta até mesmo uma prisão do ex-presidente, embora não haja qualquer previsão sobre isso.
Essa fonte disse, sem dar detalhes, que também haveria indícios que apontam para um "financiamento atípico" do evento, mas não poderia adiantar mais informações porque há apurações em curso.
"Se prenderem Bolsonaro antes dessa manifestação vira um caos no Brasil, se prenderem depois da manifestação, vira outro caos no Brasil", disse o deputado bolsonarista Marco Feliciano (PL-SP), em vídeo divulgado nesta sexta-feira. "Ele não está morto, é competitivo e não pode haver injustiça."
Questionado pela Reuters, Feliciano disse que o vídeo é uma "percepção pessoal", não se trata de orientação alguma e que vai ao ato para ouvir Bolsonaro. Disse que essa é a estratégia que se tem no momento frente às investigações conduzidas pelo STF.
"O velho ditado é verdadeiro, quem cala consente! E nosso presidente irá falar!", destacou ele, ao ressalvar que o público da manifestação é ordeiro e quem tentar ir com cartazes contra o STF "pode ser visto como infiltrado".
Segundo a fonte da PF, as investigações contra Bolsonaro estão avançadas e devem ser encerradas ainda neste semestre. Após o fim das apurações da PF, caberá ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciar o ex-presidente se considerar que há elementos de crimes, arquivar as investigações por falta de provas ou pedir diligências complementares.
Se denunciar, o Supremo poderia decidir se acata a acusação criminal e o torna réu, respondendo a um processo judicial, podendo, ao final da instrução, ser condenado à prisão ou inocentado das acusações.
Apesar de especulações, centrais sindicais e torcidas organizadas de times de futebol críticas a Bolsonaro não vão encabeçar um ato para fazer frente ao evento do ex-presidente no mesmo dia. Atos, se houver, poderão ser localizados e sem o apoio do comando dessas entidades.