Entidades de operadores do direito criticaram a sugestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para que os votos dos ministros do STF fiquem em sigilo. Para o petista, a “sociedade não tem que saber” como votam os integrantes do Supremo. Bastaria informar o placar final. Ele deu a declaração em sua live desta 3ª feira (5.set.2023).
“Se eu pudesse dar um conselho, é o seguinte: a sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte. Acho que o cara tem que votar e ninguém precisa saber. Votou a maioria, 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Não precisa ninguém saber que foi o Uchôa que votou, foi o Camilo que votou. Aí cada um que perde fica com raiva, cada um que ganha fica feliz”, afirmou. Participaram da live o jornalista Marcos Uchôa, da EBC, e o ministro da Educação, Camilo Santana.
Lula diz que o sigilo evitaria que um ministro fosse admoestado em público.
“Para não criar animosidade, eu acho que era preciso começar a pensar se não é o jeito de a gente mudar o que está acontecendo no Brasil. Porque do jeito que vai, daqui a pouco um ministro da Suprema Corte não pode mais sair na rua, não pode mais passear com a sua família, sabe, porque tem um cara que não gostou de uma decisão dele”, declarou o presidente.
“PROFUNDA PERPLEXIDADE”
O Instituto Não Aceito Corrupção afirma que a declaração de Lula causa “profunda perplexidade”. Diz também que o dever da transparência constitui “verdadeiro imperativo moral imposto aos governantes em todas as democracias modernas”. Eis a íntegra do documento (PDF – 202 kB).
“Causa profunda perplexidade a afirmação feita pelo presidente da República na data de hoje no sentido de propor sigilo dos votos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, sem que haja respaldo para tanto na ordem jurídica, já que a publicidade é a regra nesta matéria, tanto que existe institucionalmente desde 2002 um canal de TV constituído justamente para permitir à sociedade o acompanhamento dos votos dos ministros”, diz trecho do comunicado.
A Ajufe (Associação de Juízes Federais) também criticou a declaração do petista. Segundo Nelson Alves, presidente da entidade, a transparências em decisões judiciais “fortalece” a atuação dos ministros da Corte. Declarou também ser inadmissível um ministro ser atacado por exercer seu trabalho.
“O Brasil, enquanto Estado Democrático de Direito, tem como alicerce de sua segurança jurídica o respeito às decisões judiciais. Isso é o mais importante. Todo magistrado e magistrada, aqui inclusos os ministros da Suprema Corte, tem o direito e o dever de julgar com base nas provas juntadas aos autos do processo, na legislação aplicável e no seu livre entendimento motivado. O que não se pode aceitar, realmente, é que sejam atacados ou ameaçados por suas decisões. Em relação ao Supremo, assim como aos demais órgãos judiciais, a Carta Magna já prevê que as decisões sejam públicas e transparentes. Isso apenas fortalece a atuação dos ministros”, afirma o presidente da Ajufe.
“DEBATE IMPORTANTE”
Por outro lado, o grupo Prerrogativas, formado por advogados simpáticos à administração petista e críticos da operação Lava Jato, apoia a iniciativa de um “debate”.
De acordo com Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo, Lula levantou um “debate importante”. Ele afirma que “julgamentos midiáticos” não trouxeram bons resultados e que os ministros “precisam voltar a falar nos autos”. É comum um julgamento no Supremo Tribunal Federal ser transmitido ao vivo por canais de veículos de mídia no YouTube e por canais pagos de notícias.
Carvalho defende que a sugestão de Lula não é sua opinião sobre o tema. A intenção do presidente seria incentivar o debate a respeito: “É evidente que ele tem um compromisso claro e indiscutível com a transparência e com o princípio da publicidade”.
O Poder360 também entrou em contato com a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) e com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para perguntar se gostariam de se manifestar sobre a fala de Lula. Ambas responderam que não vão se posicionar. O espaço segue aberto.
VOTO SECRETO
Não é a 1ª que Lula fala em sigilo para ministros do STF.
Em 25 de julho de 2023, ao comentar o episódio no aeroporto de Roma (Itália) envolvendo Alexandre de Moraes e 3 brasileiros, o petista disse que os ministros iriam passar a proferir seus votos em sigilo para evitar xingamentos em público.
“Quando acontece o que aconteceu com Moraes, não é um ser humano que pode ter respeito por ele, é um canalha. Ele precisava pelo menos ser educado. Se vale a moda desse cidadão, que vai xingar ministro que votou uma coisa que ele não gosta, os ministros não terão mais sossego no Brasil. O voto vai ter que ser secreto para que ninguém saiba como o ministro votou”, disse Lula.