O julgamento do ex-presidente dos EUA Donald Trump no caso de tentativa de fraude eleitoral no Estado da Geórgia foi adiado nesta 5ª feira (14.set.2023). A nova data ainda não foi marcada. O republicano iria ao tribunal em 23 outubro.
Scott McAfee, juiz do condado de Fulton que está a frente do caso, disse que a decisão se deu pela complexidade da situação. Além disso, o magistrado argumentou que o sistema judicial do Estado não consegue realizar simultaneamente o julgamento de todos os envolvidos.
“O Tribunal do Condado de Fulton simplesmente não tem nenhuma sala de tribunal suficientemente grande para acomodar todos os 19 réus, os seus múltiplos advogados e pessoal de apoio, os deputados do xerife, o pessoal do tribunal e a equipe do Ministério Público do Estado. A mudança para outro local maior levanta preocupações de segurança que não podem ser resolvidas rapidamente” afirmou o juiz. Eis a íntegra da declaração (205 KB, em inglês).
McAfee ainda afirmou que há a possibilidade de serem necessários 2 julgamentos para lidar com todos os réus e o recrutamento de outro juiz estadual para auxiliar no caso.
Kenneth Chesebro e Sidney Powell ainda devem ser julgados em outubro. Os reús solicitaram ao tribunal um julgamento rápido.
ENTENDA O CASO
Donald Trump foi formalmente acusado em 14 de agosto de 2023 por tentar alterar o resultado da eleição presidencial de 2020 na Geórgia. O pleito foi vencido pelo democrata e atual presidente dos EUA, Joe Biden.Em um documento de 98 páginas, a acusação detalha 41 supostas infrações, sendo 13 atribuídas a Trump, para desfazer sua derrota. Os crimes investigados incluem falsificação e extorsão. Além do republicano, outras 18 pessoas foram indiciadas no caso.
“A acusação alega que, em vez de cumprir o processo legal da Geórgia para impugnações eleitorais, os réus se envolveram em uma empresa criminosa de extorsão para anular o resultado da eleição presidencial da Geórgia”, disse o procurador distrital do condado de Fulton, Fani Willis, que apresentou o caso a jornalistas na época. Leia a íntegra do documento (2 MB).
Em 24 de agosto, o republicano se entregou às autoridades do condado de Fulton, na Geórgia, para ser fichado.
Ele foi liberado da custódia sob condição do pagamento de fiança de US$ 200 mil (cerca de R$ 989 mil, na cotação atual), além de cumprir outras condições de liberdade, como não intimidar testemunhas do caso.
As investigações começaram em fevereiro de 2021, depois de vazar uma ligação entre Trump e o secretário da Geórgia, Brad Raffensperger, que também é responsável pelo processo eleitoral no Estado.
Na conversa, o ex-presidente pede para Raffensperger arranjar 12.000 votos a mais para que ele ganhasse a eleição. “Trump e os outros réus se recusaram a aceitar que Trump perdeu e, consciente e intencionalmente, se juntaram a uma conspiração para mudar ilegalmente o resultado da eleição em favor de Trump”, diz a acusação.
Para vencer a eleição presidencial nos Estados Unidos, é preciso obter 270 delegados no Colégio Eleitoral. Em 2020, Biden teve 306 delegados e Trump, 232. Com 16 delegados, a Geórgia –que não havia dado maioria a um presidente democrata desde Bill Clinton, em 1992– foi para o lado de Biden por uma diferença inferior a 12.000 votos.
OUTROS CASOS CONTRA TRUMP
Este é o 4º indiciamento contra o ex-presidente. Em março, o republicano foi indiciado no caso de um suposto pagamento de US$ 130 mil à atriz pornô Stormy Daniels. O dinheiro teria sido dado a ela durante a campanha presidencial de 2016 para que Daniels não divulgasse um suposto caso extraconjugal com o ex-presidente. Trump se declarou inocente de todas as acusações.Em junho, Trump foi indicado de 37 acusações criminais relacionadas ao manuseio de documentos secretos depois de ter deixado a Casa Branca. Em 1º de agosto, o ex-presidente foi acusado de instigar a invasão ao Capitólio –o Congresso norte-americano.
No entanto, os processos podem não afetar a elegibilidade de Trump e ele segue como pré-candidato à Presidência dos EUA para as eleições de 2024. Isso porque nos Estados Unidos não existe uma norma similar à Lei da Ficha Limpa, como há no Brasil, e a legislação norte-americana determina que os candidatos devem atender só 3 requisitos para serem elegíveis:
- ter nascido nos EUA;
- ser residente dos EUA por, no mínimo, 14 anos; e
- ter pelo menos 35 anos de idade.
O último critério é considerado o mais possível de ser usado contra Trump. Ele é estabelecido pela seção 3 da 14ª Emenda.
Intitulado “desqualificação do exercício do cargo”, o trecho afirma que “nenhuma pessoa” poderá exercer um cargo público, como de senador, deputado, presidente e vice-presidente, se “tiver se envolvido em insurreição ou rebelião” contra o governo. A norma constitucional poderia, portanto, ser levantada caso Trump seja condenado no caso sobre a invasão ao Capitólio.
Os professores de direito norte-americanos, William Baude, da Universidade de Chicago, e Michael Stokes Paulsen, da Universidade de St. Thomas, defendem a questão.
Em um artigo disponibilizado no repositório SSRN (íntegra, 1 MB, em inglês) em 14 de agosto –que também será publicado em 2024 no jornal acadêmico The University of Pennsylvania Law Review– os especialistas concluem que Trump deve ser desqualificado.
“Donald Trump não pode ser presidente, não pode concorrer à presidência, não pode tornar-se presidente, não pode ocupar o cargo, a menos que dois terços do Congresso decidam conceder-lhe anistia pela sua conduta em 6 de janeiro”, disse Baude em entrevista ao New York Times, publicada em 10 de agosto.
Além da questão da disputa eleitoral, existe o seguinte questionamento: Donald Trump poderá exercer Presidência dos EUA se for condenado depois de ser eleito (caso ele seja eleito)?
Segundo o Politico, juristas avaliam que uma eventual condenação poderia ser anulada ou postergada a fim de assegurar que o republicano cumprisse os deveres do cargo.
Além disso, Trump poderia ainda tentar se autoperdoar assim que assumisse o cargo por meio do perdão presidencial. Mas isso só seria possível caso a condenação fosse referente aos casos federais que o ex-presidente enfrenta (manuseio de documentos secretos e invasão ao Capitólio).