O grupo de juristas que discute as possíveis alterações na lei de impeachment entregou na sexta-feira, 16, ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o texto do anteprojeto com as sugestões de mudanças nas regras que permitem o afastamento de autoridades que tenham cometido crimes de responsabilidade. Entre as mudanças estabelecidas no documento está a possibilidade de o presidente da República ser alvo de processo de impeachment por "divulgar, direta ou indiretamente, por qualquer meio, fatos sabidamente inverídicos, com o fim de deslegitimar as instituições democráticas".
Diversos trechos do documento aludem a atos controversos do governo de Jair Bolsonaro e apontam o afastamento como uma espécie de vacina para essas práticas. O texto prevê, por exemplo, o impeachment do presidente que "revelar fato ou documento sigiloso de que tenha ciência em razão do cargo" e possam comprometer a soberania nacional.
Bolsonaro é alvo de investigação por publicar em sua conta oficial do Twitter um parecer da Polícia Federal (PF) sobre supostos atentados hackers ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições de 2018. A divulgação de informações restritas já é considerada crime, mas não há tipificação explicita como crime de responsabilidade
A comissão de alteração da lei de impeachment foi instituída no Senado a pedido de Pacheco, que disse ser necessário rever os marcos legais utilizados para afastar os ex-presidentes Fernando Collor (Pros) e Dilma Rousseff (PT). O grupo foi coordenado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que presidiu a sessão do Senado responsável pelo afastamento da petista em 2016. Na ocasião, Lewandowski avalizou uma proposta dos senadores para que Dilma fosse destituída do cargo, mas mantivesse os direitos políticos.
Caso as modificações na lei de impeachment sejam aprovadas pelo senadores, os próximos presidentes poderão ser afastados por "atentar, por meio de violência ou grave ameaça, contra os Poderes constituídos". As sugestões previstas no texto tratam de diversas conflitos institucionais ocorridos no País durante a gestão do presidente Jair Bolsonaro. Na seção em que os juristas abordam os crimes contra o exercício dos direitos e garantias fundamentais, consta como motivo de afastamento do presidente "deixar de adotar as medidas necessárias para proteger a vida e a saúde da população em situações de calamidade pública".
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia acusou Bolsonaro de retardar a compra de imunizantes contra a covid-19, no que pode vir a ser enquadrado como crime de responsabilidade na nova lei do impeachment. Outro trecho polêmico, que alude aos atos do atual governo, autoriza o afastamento do presidente que "estimular a prática de tortura ou de tratamento desumano ou degradante". Durante os primeiros meses da crise de covid-19, em 2020, Bolsonaro disse que quem é de "direita toma cloroquina (medicamento cientificamente ineficaz no tratamento da doença) e quem é de esquerda tubaína". Na época, o chefe do Executivo foi acusado de fazer apologia à tortura, pois o termo tubaína também pode ser associado a uma técnica de asfixia.
A nova lei ainda prevê afastar do cargo o presidente que "embaraçar o livre exercício dos direitos políticos, o processo eleitoral ou a posse dos eleitos", ou que "incitar civis ou militares à prática de violência de qualquer natureza".
Outra novidade é o enquadramento de comandantes das Forças Armadas em crimes de responsabilidade, como "expressar-se por qualquer meio de comunicação a respeito de assuntos político-partidários ou tomar parte em manifestações dessa natureza". O alto comando militar também pode ser alvo de processo de impeachment por "incitar a participação ou participar de greve ou motim de militares"; e "retardar ou deixar de cumprir ordem do Presidente da República ou do Ministro da Defesa, salvo quando manifestamente ilegal".
Ministros do STF
Assim como a lei de impeachment em vigor, o anteprojeto prevê as regras para o afastamento de membros da Suprema Corte. O novo regramento passa a enquadrar como crime de responsabilidade "exercer atividade político-partidária ou manifestar opiniões dessa natureza", num movimento mais restritivo a possibilidade de os ministros se manifestarem politicamente. O antigo texto limitava apenas a participação dos magistrados em atividades políticas ou de partidos.
O texto também faz uma modificação relevante sobre a manifestação dos juízes em processos pendentes de julgamento, o que já é ilegal atualmente. A nova regra, porém, enfatiza que a proibição não pode ser emitida em meios de comunicação.