Por Ricardo Brito e Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados seguia na noite desta terça-feira na reunião que discute o parecer do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), contrário ao prosseguimento da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, com os discursos agora monopolizados por parlamentares contrários ao presidente.
Isso porque, para agilizar a tramitação da acusação da Procuradoria-Geral da República contra Temer por participação em organização criminosa e obstrução da Justiça baseada na delação da J&F, deputados aliados de Temer seguiram à risca a estratégia para acelerar a fase de discussão do parecer e boa parte deles evitou se inscrever ou preferiu não discursar.
Diante dessa articulação, a lista de oradores favoráveis ao presidente já se esgotou e apenas parlamentares de oposição estão ainda inscritos para falar.
A discussão sobre o parecer de Bonifácio começou na manhã desta terça e já dura cerca de 10 horas. A expectativa é de que o parecer de Bonifácio seja votado entre a tarde e a noite de quarta-feira.
Mais cedo, no início dos debates, o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos aliados de primeira hora de Temer, afirmou haver uma "ditadura de procuradores" que se associaram a "bandidos delatores" para implicar o presidente.
Para o deputado, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, autor da denúncia contra Temer, e os integrantes do Ministério Público Federal esqueceram-se de analisar o perfil dos "delatores da moda".
Segundo Perondi, o empresário Lúcio Funaro, cuja delação premiada também foi usada na denúncia contra Temer, equivale a traficantes que corrompem a juventude, tendo o mesmo perfil de Fernandinho Beira-Mar e Pablo Escobar.
"O Funaro, em nome da sua salvação, inventou de tudo", criticou o peemedebista, para quem Temer é um homem íntegro e um jurista renomado.
Além de desqualificar a denúncia, deputados alinhados ao Palácio do Planalto também fizeram questão de destacar a melhoria nos indicadores econômicos na gestão de Temer e a ideia de que é melhor manter o presidente para dar continuidade a sua agenda até 2018.
Por outro lado, todos os deputados contrários a Temer inscritos têm feito questão de discursar.
CONSTRANGIMENTO
Primeiro a se manifestar na CCJ, o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) afirmou que é um grande constrangimento para o governo ter um presidente da República acusado de ser o chefe da quadrilha.
"Temer usa o cargo para praticar crimes", criticou. "É a oportunidade desta casa se reencontrar com o povo brasileiro", completou.
O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) afirmou que está ocorrendo uma "compra" de votos pelo governo para barrar o julgamento da denúncia contra Temer pelo Supremo Tribunal Federal.
"Isso se chama banditismo político, não naturalizemos isso na atividade política", protestou.
A reunião que debate a denúncia contra Temer, na qual também se discute acusações contra os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) de participação em organização criminosa, foi interrompida por duas vezes nesta terça.
A primeira pausa, de 45 minutos, se deu no início da tarde. A segunda, já no início da noite, aconteceu por conta do começo da Ordem do Dia no plenário da Câmara, que votou e aprovou a urgência de um projeto de lei que dá ao Banco Central poder de firmar acordos de leniência com bancos. A urgência foi aprovada por 232 votos a 80 e, após a aprovação, a sessão da CCJ foi retomada.
Caso a CCJ aprove o parecer de Bonifácio, como é esperado, os defensores de que a Câmara autorize o Supremo a julgar a denúncia contra Temer precisarão de 342 votos no plenário da Casa para autorizar a corte a analisar o caso.
Os aliados de Temer, por sua vez, precisam que a soma dos parlamentares que votarão contra a denúncia, dos ausentes e das abstenções não chegue a 172.
A primeira denúncia contra Temer, por corrupção passiva e também feita por Janot com base na delação da J&F, foi rejeitada pela Câmara no início de agosto.
Temer foi gravado pelo empresário Joesley Batista em uma conversa na qual, segundo a Procuradoria-Geral da República, deu aval à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Essa segunda denúncia contra o presidente também o aponta como chefe de organização criminosa formada por integrantes do PMDB.
(Reportagem adicional de Eduardo Simões, em São Paulo)