A queda nos juros básicos da economia está demorando a chegar aos tomadores finais de empréstimos e financiamentos. Embora o Banco Central (BC) tenha reduzido a taxa Selic duas vezes desde outubro, os juros cobrados pelos bancos não caem na mesma velocidade. A explicação está no spread bancário, que acumulou alta em outubro e em novembro, mesmo com a Selic em queda.
O spread bancário é a diferença entre as taxas que as instituições financeiras pagam para captar recursos e as que cobram do cliente final. O indicador, divulgado todos os meses pelo BC, caiu 0,4 ponto percentual em novembro. No entanto, com o crescimento de 1 ponto percentual registrado em outubro, o spread acumula alta de 0,6 ponto percentual no último trimestre de 2016. A conta abrange apenas as operações de crédito livre, feitas com recursos próprios dos bancos, excluindo o crédito direcionado, concedido com subsídios do governo.
A diferença pode ser observada quando se compara a evolução das taxas usadas na captação e os juros cobrados na concessão de crédito. A taxa média de captação estava em 12,1% ao ano em novembro, segundo os dados mais recentes do BC. Essa é a taxa que os bancos pagam para pegar dinheiro emprestado dos correntistas por meio de aplicações como poupança, CDB e fundos de investimento.
Mesmo com a taxa Selic sendo reduzida em 0,5 ponto percentual – de 14,25% para 13,75% ao ano – desde outubro, a taxa média de captação acumula queda de apenas 0,1 ponto percentual em outubro e em novembro, de 12,2% para 12,1% ao ano.
Os juros médios pagos pelos tomadores de empréstimos e financiamento, no entanto, não tiveram a mesma trajetória e subiram, mesmo com a queda da Selic. A taxa média de aplicação, como o BC chama os juros dos clientes finais, acumula alta de 0,5 ponto percentual em outubro e em novembro, passando de 53,4% para 53,9% ao ano no período. O spread – diferença entre as duas taxas – subiu de 41,2% para 41,8% ao ano (0,6 ponto percentual) na mesma comparação.
Contas públicas
Diretor do Banco Central nos anos 80 e no início dos anos 2000, Carlos Eduardo de Freitas diz não estar surpreso com a resistência de o spread bancário cair. Para ele, a queda do indicador depende fundamentalmente da capacidade de recuperação da economia e da redução do desequilíbrio nas contas públicas.
“O spread bancário está muito mais relacionado às condições da economia do que aos movimentos da taxa Selic. Enquanto as contas públicas estiverem desequilibradas, o spread não vai cair. Ao longo da minha carreira, só vi o spread bancário cair na década de 2000, justamente quando o país fazia superávits primários [economia para pagar os juros da dívida pública] elevados”, diz.
Abuso
O professor de Finanças Fabio Gallo, da Fundação Getulio Vargas (FGV) em São Paulo, considera um padrão histórico do setor financeiro manter spreads bancários altos e lucrar em tempos de crise. Segundo ele, o comportamento ocorre em todo o planeta, mas é agravado pela concentração no setor financeiro brasileiro, com poucos bancos concorrendo entre si.
“Os bancos alegam que a inadimplência, a tributação e o compulsório [parcela que são obrigados a deixar depositada no Banco Central] são altos no Brasil. Isso é verdade, mas não explica inteiramente o spread bancário. A inadimplência está começando a cair. O fato é que os bancos nunca conseguiram justificar plenamente spreads tão altos no Brasil. Em todo o mundo, os bancos ganham em tempos de crise. No Brasil, também”, afirma.