Por Gabriel Ponte
BRASÍLIA (Reuters) - A indústria de carnes do Brasil precisa se organizar e realizar compras antecipadas de milho para não enfrentar escassez do cereal em 2020, diante de crescente demanda global pelo grão brasileiro, disse nesta quarta-feira o presidente de uma importante associação de produtores do país.
O Brasil deverá colher uma grande safra de milho em 2020, mas o país poderá ter oferta menor em alguns momentos, antes da colheita, uma vez que as exportações têm sido recordes e há uma forte demanda da indústria de carnes, diante de maiores importações pela China.
A primeira safra de milho do Brasil está atrasada ante a temporada anterior e deverá entrar no mercado, nos principais Estados produtores, mais tarde, com grande parte sendo colhida em março de 2020. Da mesma forma, a segunda e maior safra do cereal do país, ainda chamada de "safrinha" por muitos, também deve chegar mais tarde em relação a 2019, somente a partir de meados do ano que vem.
"Poderá sim (faltar), se a indústria brasileira, principalmente a produção de aves, suínos, se não se organizar, comprar esse milho antecipado, entrar nos mercados futuros", disse o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Bartolomeu Braz Pereira, ao ser questionado por jornalistas durante evento em Brasília.
O milho é o principal componente da ração animal destinada a criações de suínos e aves, principalmente, uma vez que a maior parte dos bovinos do Brasil é criada a pasto.
Para ele, a indústria de carnes do país precisa ajudar no financiamento ao agricultor, que assim poderia investir mais no setor.
"Esse milho poderá ter outro destino, estamos vendo a demanda mundial, a situação crescente, o Brasil sendo protagonista disso aí. Acho então que temos que preparar nossa agroindústria, produção de carnes aqui, aves e suínos, para entrarmos nesse mercado antecipado, para ele não perder esse produto para outros países", acrescentou.
Conforme especialistas, o mercado de milho no Brasil será apertado no início de 2020, o que tem deixado cotações atuais no mercado brasileiro nos maiores patamares desde agosto de 2016 (valores nominais), segundo reportagem da Reuters publicada na véspera.
As expectativas são de que o Brasil exporte volumes recordes se mais de 40 milhões de toneladas de milho em 2019, mas isso acontecerá não somente por causa da quebra de safra dos Estados Unidos, mas porque o cereal do Brasil tem "teor de proteína até melhor que os outros" e é mais competitivo, comentou o presidente da Aprosoja, cujos associados também são produtores de milho, em geral na segunda safra.
"O nosso milho foi mais acessível. Então tem entrado em mercados, Vietnã (por exemplo), e tem trazido concorrência maior. Vemos, neste momento, que tivemos uma grande safrinha no ano passado, a segunda safra, mesmo assim a demanda mundial foi maior..." acrescentou ele, lembrando que o país tem tido também uma demanda adicional da crescente indústria de etanol.
"Temos várias plantas (de etanol de milho) já iniciando, Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul, regiões centrais com dificuldades na logística. O consumo de milho para etanol tem aumentado...", acrescentou Pereira.
O dólar firme frente ao real, que torna o produto brasileiro mais competitivo, também é outro fator que sustenta preços, completou o dirigente da Aprosoja.