Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - A chinesa State Power Investment Corp fez uma oferta vinculante pela fatia da estatal mineira Cemig (SA:CMIG4) na hidrelétrica de Santo Antônio, mas o valor ficou abaixo de uma proposta indicativa apresentada anteriormente, disseram à Reuters duas fontes com conhecimento do assunto.
A usina em Rondônia, que recebeu mais de 20 bilhões de reais em investimentos, foi colocada pela Cemig em um plano de desinvestimentos que visa obter recursos para reduzir dívidas. A elétrica mineira tem fatia de 15% na Santo Antônio, entre participações diretas e indiretas.
"Eles fizeram uma proposta não vinculante meses atrás, que a princípio era boa, dava para continuar (as conversas). Agora apresentaram uma nova proposta que a princípio não é aceitável, é bem abaixo", afirmou uma das fontes, que falou sob a condição de anonimato porque as negociações são sigilosas.
As conversas da mineira Cemig com a chinesa SPIC pela hidrelétrica no rio Madeira começaram ainda em 2017, mas desde então divergências sobre valores têm impedido um entendimento, assim como aconteceu com a recente oferta vinculante, que esfriou as tratativas.
A segunda fonte também disse que a última oferta foi inferior a uma apresentada anteriormente à Cemig.
"Acho muito pouco provável que aconteça (o negócio nessas condições)", acrescentou.
As fontes, no entanto, não descartaram que as conversas entre as empresas possam continuar, em meio ao apetite dos chineses por ativos no setor de energia no Brasil e à intenção da Cemig de vender ativos.
As fontes não tinham detalhes sobre a oferta da SPIC.
Controlada pelo governo de Minas Gerais, a Cemig teve uma recente mudança na cúpula, mas o novo governador do Estado, Romeu Zema (Partido Novo), disse que a empresa segue em busca de vender ativos. Ele também não descartou uma privatização da companhia com um todo, embora o processo exija aprovação do legislativo estadual.
Os outros sócios da Cemig em Santo Antônio são Furnas, da Eletrobras (SA:ELET3), com 43%, e a construtora Odebrecht, com 18,25%. Os veículos de investimento Caixa FIP Amazônia Energia e SAAG Investimentos, da Andrade Gutierrez, também contam com participações.
A Odebrecht já afirmou anteriormente que pretende vender sua participação no empreendimento, enquanto a Eletrobras tem afirmado que aguardará os movimentos dos sócios para eventualmente exercer o direito de "tag-along" e negociar sua participação pelo mesmo valor.
Procurada, a Cemig disse que não iria falar sobre o tema, assim como a SPIC. A Odebrecht informou que mantém intenção de venda, enquanto a Andrade Gutierrez não comentou.
A Santo Antônio Energia, que reúne os sócios da usina, disse que o tema deve ser tratado com os acionistas.
RISCO HIDROLÓGICO
Com cerca de 3,57 gigawatts em capacidade, a usina de Santo Antônio é uma das maiores hidrelétricas do país e iniciou a operação das primeiras máquinas em 2012.
O empreendimento está 100 por cento operacional desde 2017, mas vem sofrendo um impacto negativo no faturamento por conta de um déficit de geração enfrentado pelas usinas hídricas do Brasil em geral nos últimos anos.
Com o déficit, decorrente de questões como o baixo nível dos reservatórios, empresas que operam hidrelétricas têm precisado comprar energia no mercado para cumprir obrigações comerciais, um custo que elas alegam que não tinham como prever.
Esses custos com o chamado "risco hidrológico", que são alvo de longas discussões entre empresas de energia e o governo, são um dos pontos que têm ajudado a travar a venda da usina, afirmou uma terceira fonte que acompanha as negociações.
O governo promete um acordo para compensar as elétricas por parte das perdas com o déficit hídrico, mas isso depende da aprovação de um projeto de lei cuja tramitação travou na Câmara dos Deputados. Inicialmente, o Ministério de Minas e Energia previa que o texto seria aprovado logo no início de 2019.
"É uma questão comercial. Se tem um acordo, já melhora o preço do ativo... então você tem o comprador tentando jogar (o preço) para baixo e o vendedor não aceitando porque ele está vendo que talvez tenha algumas soluções por vir que melhorem o preço do ativo lá na frente", afirmou essa fonte.
Por outro lado, os chineses da SPIC se aproveitam do fato de serem atualmente os únicos com interesse e capacidade financeira para uma eventual aquisição da enorme hidrelétrica, acrescentou essa pessoa, que acompanha diversas operações de fusões e aquisições.
A chinesa SPIC realizou o primeiro investimento no Brasil em setembro de 2017, com a aquisição da hidrelétrica de São Simão, que pertencia à Cemig até ter o contrato de concessão expirado e ser licitada pelo governo.
Na época, a companhia já era vista como potencial compradora da usina de Santo Antônio, mas uma primeira oferta apresentada pelo ativo na ocasião não avançou.
Em outubro do ano passado, a Cemig disse que havia recebido uma "oferta indicativa" dos chineses pela fatia na usina, sem revelar detalhes.