Por Luciana Bruno
RIO DE JANEIRO (Reuters) - O Ministério das Comunicações encerra nesta sexta-feira a consulta pública para discutir mudanças no modelo de telecomunicações brasileiro, que opõe interesses de operadoras de telecomunicações e organizações da sociedade civil.
Enquanto as empresas de telefonia pedem um regime regulatório menos rígido, organizações de defesa do consumidor e da democratização das comunicações querem maior controle estatal sobre a oferta e qualidade dos serviços, especialmente sobre a banda larga.
O objetivo da consulta é receber sugestões de empresas e de organizações para as mudanças no modelo, sendo a principal delas a alteração ou extinção das concessões de telefonia fixa.
Após a conclusão da consulta pública, um grupo de trabalho criado pelo ministério das Comunicações apresentará até o fim de janeiro propostas que abordarão diferentes cenários para a regulação do setor.
As operadoras querem que a telefonia fixa saia do regime de concessão, que prevê investimentos em universalização por parte das empresas. A ideia é transformá-lo em autorização, como ocorre com a telefonia celular, cujas metas de cobertura são menos rígidas.
Uma mudança desse tipo permitiria que as principais concessionárias, Oi e Telefônica Brasil (SA:VIVT4), reduzissem investimentos em telefonia fixa, que tem sido menos utilizada pela população diante da telefonia móvel e serviços baseados na Internet. A alteração também tornaria a Oi um ativo mais atraente para uma eventual fusão com a TIM Participações, dizem analistas do setor.
VISÕES OPOSTAS
Mas a revisão do modelo nesse sentido enfrenta resistência de entidades de defesa da inclusão digital e dos direitos do consumidor, que pedem que a mudança inclua a banda larga no regime público de forma que sua oferta seja universalizada e atinja regiões de menor interesse comercial. Atualmente, a banda larga é regulada por regime privado.
Para a organização de defesa da democratização das comunicações Intervozes, o desafio é construir uma legislação que dê respostas à importância crescente da Internet.
"Mais ainda: uma lei baseada na compreensão de que os serviços de telecomunicações --entre os quais se incluem os que suportam o acesso à rede-– são públicos, mesmo que prestados por empresas privadas, e que estas têm obrigações a cumprir perante o Estado", disse a organização.
A entidade, formada por ativistas e profissionais de áreas como comunicação social e direito, defendeu em sua contribuição enviada ao ministério a garantia de políticas de universalização da banda larga combinadas à regulação de preços e tarifas.
A entidade sugeriu ainda que as concessões sejam realizadas a partir de nova licitação da infraestrutura de rede reversível das concessionárias de telefonia fixa. "A transição para as concessões de banda larga no atacado poderia ocorrer com a antecipação do fim dos contratos de telefonia fixa atualmente em vigor", disse a entidade.
Propostas semelhantes são defendidas pela organização de defesa do consumidor Proteste, que junto com o Intervozes faz parte da Campanha Banda Larga é um Direito Seu, que em 2013 apresentou ao ministério e à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) proposta para a universalização da banda larga no país.
O pleito é criticado por Eduardo Levy, presidente do Sinditelebrasil, sindicato que representa as operadoras. Para ele, qualquer inclusão da banda larga nas concessões inibiria investimentos das empresas.
"Se incluir banda larga na concessão, os investimentos vão encolher", declarou Levy à Reuters, completando que entidade defende o fim de qualquer tipo de concessão. O sindicato enviará nesta sexta-feira suas propostas para o Minicom.
A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) também enviou sugestões, nas quais defende, assim como as operadoras, o fim do regime público de prestação de serviços de telecomunicações.
A entidade também rejeitou no documento qualquer possibilidade de regulação dos aplicativos baseados em Internet, conhecidos no jargão do mercado como OTTs, como Whatsapp, do Facebook, ou Netflix.
Questionado, Levy declarou que as operadoras não abordarão o assunto em suas sugestões a serem enviadas ao ministério. As empresas têm pressionado o governo por mais regulação desses aplicativos, que acabam concorrendo com suas receitas ao oferecerem serviços semelhantes.
Mas tanto operadoras como entidades da sociedade civil concordam em um ponto: deve haver mudanças regulatórias para fazer com que os recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) seja efetivamente aplicado nos investimentos do setor. Atualmente, esses recursos são utilizados pelo governo federal para fechar as contas públicas.
Segundo dados do ministério das Comunicações, de 2001 a 2014, o Fust arrecadou 18 bilhões de reais. O Fust é composto por 1 por cento da receita operacional bruta das operadoras, além de 50 por cento dos recursos do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), referentes a concessões de serviços públicos, exploração de serviços privados e direito de uso de radiofrequência. O Fistel, que é administrado pela Anatel, alcançou 67 bilhões de reais entre 1997 e 2014.
Para a Intervozes, a solução seria retirar o caráter contingenciável do Fust, de forma a impedir que seus recursos sejam utilizados para outros fins. Para a Abinee, os recursos do fundo devem ser destinados a investimentos em infraestrutura e subsidiar operações em locais de baixa atividade econômica.