Por Marta Nogueira
RIO DE JANEIRO (Reuters) - Empenhada em aderir de forma mais ampla e consistente a um fenômeno global, a Petrobras (SA:PETR4) deverá apresentar ao seu Conselho de Administração, até meados do ano, um trabalho que visa acelerar o seu processo de transformação digital, que já proporciona economias de milhões de dólares à empresa.
O fenômeno, que promete revolucionar diversos setores da economia global, busca a geração de valor para os negócios a partir da absorção de uma cultura digital e da transformação de processos e negócios corporativos, com a associação de diversas novas tecnologias.
O tema, incluído em alianças tecnológicas da Petrobras firmadas recentemente com petroleiras gigantes, como a francesa Total e a norueguesa Statoil, foi integrado à nova versão do plano de negócios da empresa, publicada em dezembro, como uma iniciativa estratégica.
Desde então, a empresa criou um grupo multidisciplinar formado por dez funcionários que atualmente trabalha no levantamento do portfólio da empresa de transformação digital e também em uma pesquisa de mercado sobre o que vem sendo feito neste campo no mundo todo.
Dentre os projetos já adotados pela empresa está uma premiada iniciativa que permitiu que a petroleira deixasse de gastar quase 100 milhões de dólares na perfuração de poços, apenas entre meados de 2014 e o fim de 2017, a partir de um algoritmo de interpretação de dados em tempo real enviados por sensores instalados em sondas em operação.
A economia foi contabilizada mesmo em um período de queda no número de perfurações, em meio a redução dos preços internacionais de petróleo. Hoje todas as perfurações são feitas dessa forma.
Mas a empresa pode fazer muito mais, como, por exemplo, adaptar projetos bem-sucedidos para diferentes áreas, apontou Augusto Borella, um dos integrantes do grupo multidisciplinar e gerente de Competências Técnicas de Poço e Sondagem da área de Poços Marítimos da Petrobras.
"A questão não é se a gente vai transformar, a gente já está fazendo isso, o que a gente quer é acelerar esse processo... e identificar outras atividades que a transformação digital pode trazer o que a gente não está capturando", disse Borella à Reuters.
Apesar de ponderar que a empresa está começando esse processo de transformação digital um ou dois anos depois das grandes operadoras, Borella destacou que a petroleira se sente mais à frente que as concorrentes em algumas dimensões técnicas.
As pesquisas do grupo de trabalho já apontaram que aproximadamente 10 por cento dos cerca de mil projetos do centro de pesquisas da Petrobras (Cenpes), na cidade do Rio de Janeiro, já incorporam tecnologias de transformação digital.
Os investimentos já realizados ou futuros para a transformação digital não foram divulgados, assim quanto a Petrobras espera economizar com a aceleração desse processo.
OUTRAS INICIATIVAS
Em outro exemplo, olhando para o futuro, a empresa estuda utilizar a interpretação de imagens para garantir a segurança em áreas operacionais. A ideia, segundo Borella, é permitir que câmeras e algoritmos identifiquem e informem sobre cenas inseguras, como um possível funcionário sem o devido equipamento de proteção individual.
"A gente tem um cronograma para cumprir e o primeiro marco é apresentar ao Conselho de Administração o diagnóstico interno e o 'benchmark' externo e a carteira dos projetos em andamento que se caracterize como transformação digital", afirmou, Borella.
Após a apresentação, o grupo deverá buscar uma visão da empresa para o processo e traçar um planejamento mais extenso.
Outras petroleiras brasileiras também vêm investindo na transformação digital, como a Queiroz Galvão Exploração e Produção, que tem iniciativas relacionadas a armazenamento de grande quantidade de dados e a sistemas de monitoramento em tempo real.
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) informou à Reuters em nota que vê de forma positiva as iniciativas no país, viabilizando a exploração e produção em condições cada vez mais complexas.
Dentre os exemplo no Brasil, segundo a ANP, estão a modelagem geológica de reservatórios, através da geração e transmissão de dados em tempo real, a automação de dados e o imageamento 3D por satélite, bem como os poços equipados com nano sensores e a utilização de robótica wireless em poços e em sistemas submarinos.
TRANSFORMAÇÃO CULTURAL
Entretanto, apesar das importantes iniciativas em curso, a Petrobras e o setor de petróleo mundial estão atrasados na adesão ao fenômeno da transformação digital.
"Sabidamente, a indústria do petróleo é uma das mais atrasadas, a exceção da área de processamento sísmico, que sempre usou grande capacidade computacional", disse Borella, da Petrobras.
Para ele, o motivo para esse atraso seria a própria cultura da indústria de exploração e produção (E&P), que além de conter projetos de muito longo prazo, primam sempre pela segurança, sem dar muita chance à criação de ambientes de experimentação.
"A transformação digital não é só aplicação de tecnologia, ela é uma cultura diferente, uma cultura que estimula o experimento", afirmou.
Mas a busca por mudança de cultura corporativa, que inclusive é uma outra iniciativa estratégica já considerada há mais tempo no plano de negócios da Petrobras, envolve ainda outros aspectos necessários para a transformação digital, como a necessidade de busca por capacitação constante da força de trabalho.
Muito se fala sobre como o avanço da tecnologia pode tomar postos de trabalho, mas Borella destacou que o desafio das empresas é estimular que os funcionários busquem sempre por novas funções, evoluindo junto com a empresa.
"Sem dúvida nenhuma, nos planos de transformação digital, vai precisar ser levado em conta qual a capacitação que a gente vai precisar fornecer para equipe de trabalho para que ela seja capaz de executar um novo trabalho que vai surgir... as pessoas vão precisar aprender coisas novas ao longo de toda a vida profissional", afirmou.
Borella garantiu que o processo de mudança cultural já está em curso na Petrobras, estimulado inclusive pela alta gestão. Como exemplo, Borella citou uma ferramenta de visualização de dados e análise adotada pelo diretor de Refino e Gás Natural da empresa, Jorge Celestino, para reuniões de equipe.
A partir da adoção da plataforma, "as pessoas pararam de colocar energia para preparar apresentações de 'PowerPoint' para serem apresentadas na reunião" e passaram a tomar ações e identificar oportunidades a partir dos dados gerados pela própria ferramenta, explicou Borella.
(Por Marta Nogueira)