Por Patricia Avila e Malena Castaldi
MONTEVIDÉU (Reuters) - O escritor uruguaio Eduardo Galeano, autor do emblemático livro "As Veias Abertas da América Latina" que serviu de guia para a esquerda da região, morreu nesta segunda-feira em Montevidéu aos 74 anos após lutar contra uma longa doença.
Motivador do revisionismo histórico e de um desenvolvimento autônomo do subcontinente, o intelectual sofria há vários anos de câncer no pulmão, motivo pelo qual foi submetido a uma cirurgia em 2007.
Uma porta-voz da editora Siglo XXI, em Buenos Aires, confirmou à Reuters a morte do escritor e jornalista.
"O mundo perde um dos personagens mais importantes, o mundo perde um professor da descolonização e a libertação de nossos povos", disse durante entrevista coletiva o presidente da Bolívia, Evo Morales, com quem Galeano havia se encontrado no mês passado.
Pelo Twitter, os governos de Equador e Argentina também reagiram à notícia que deu a volta ao mundo.
A presidente Dilma Rousseff disse em comunicado que "é uma grande perda para todos que lutamos por uma América Latina mais inclusiva, justa e solidária com os nossos povos".
"Aos uruguaios, aos amigos e à nossa imensa família latino-americana, quero prestar minhas homenagens e lembrar que continuamos caminhando com os olhos no horizonte, na nossa utopia", acrescentou.
O autor, nascido em Montevidéu em 1940, deixou uma profunda marca em historiadores, escritores e militantes políticos do continente, onde seus livros estiveram proibidos durante anos pelas sangrentas ditaduras que governaram o Cone Sul nas décadas de 1970 e 1980.
Nestes anos, durante seu exílio em Buenos Aires, fundou a revista Crisis, lendária para a esquerda latino-americana e os teóricos da comunicação.
"Procuro uma linguagem informal que permita pensar, sentir e se divertir, não habitual nos discursos da esquerda", disse ao jornal El País em 2012.
O escritor foi forçado a deixar a Argentina quando a ditadura chegou ao poder naquele país em 1976 e morou na Espanha até voltar ao Uruguai em 1985 com o retorno da democracia.
Durante uma cúpula presidencial em 2009, o falecido presidente venezuelano Hugo Chávez presenteou ao seu colega norte-americano, Barack Obama, uma cópia de "As Veias Abertas da América Latina", livro escrito em 1971 no qual denuncia o saque ao qual a região foi submetida desde o descobrimento da América.
"Por uma lado se perde o Eduardo Galeano literato, mas sinto que perco o amigo com quem compartilhei experiências, um homem muito sensível", afirmou à televisão uruguaia o compositor Daniel Viglietti.
Galeano também escreveu a série "Memória do Fogo", com a qual tentou contar o desenvolvimento da América Latina por meio de lendas indígenas e detalhes esquecidos pela história oficial, "O Livro dos Abraços" e "De Pernas Pro Ar".
Torcedor de futebol, decidou a esse esporte "Futebol ao Sol e à Sombra", com o qual traçou um panorama sobre a paixão, o espetáculo e o negócio que gera disciplina por meio de pequenas históricas.
Os uruguaios poderão se despedir de um dos seus escritores mais reconhecidos na tarde de terça-feira no imponente Salão dos Passos Perdidos, lugar normalmente usado para funerais de Estado no Congresso Nacional, afirmou o Ministério da Cultura em sua página na Internet.
"Seu trabalho é uma mistura de detalhes meticulosos, convicção política, dom poético e boas histórias contadas", escreveu a escritora chilena Isabel Allende, amiga de Galeano, no prefácio de uma edição recente do livro.
(Reportagem adicional de Nicolás Misculin, Maximilian Heath e Daniel Ramos)