Por Stephen Kalin e Suleiman Al-Khalidi e Mohamed Abdellah
RIAD/AMMAN/CAIRO (Reuters) - Comentaristas e políticos árabes receberam o plano econômico de 50 bilhões de dólares do presidente norte-americano Donald Trump para o Oriente Médio com uma mistura de escárnio e irritação, embora alguns no Golfo tenham dito que ele merece uma chance.
Em Israel, Tzchi Hanegbi, ministro próximo ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, descreveu a rejeição dos palestinos ao plano de "paz para a prosperidade" como trágica.
Preparado para ser apresentado pelo cunhado de Trump, Jared Kushner, em uma conferência no Bahrein entre 25 e 26 de junho, o plano vislumbra um fundo global de investimento para impulsionar as economias dos palestinos e de países árabes vizinhos e é parte de esforços mais amplos para ressuscitar o processo de paz entre Israel e Palestina.
"Não precisamos da reunião do Bahrein para construir nosso país. Precisamos de paz, e a sequência (proposta pelo plano) de renascimento econômico seguido por paz é irreal e ilusória", disse o ministro de Finanças palestino, Shukri Bishara, neste domingo.
A falta de uma solução política, que segundo Washington será revelada posteriormente, motivou rejeições não apenas de palestinos, mas também de países árabes com os quais Israel busca relações normais.
Do Sudão ao Kuweit, comentaristas e cidadãos comuns denunciaram as propostas de Kushner em termos similares, qualificando-as como “uma colossal perda de tempo", que "nem vale ser discutida", além de "natimortas".
Partidos liberais e de esquerda do Egito criticaram a reunião no Bahrein, que viram como uma tentativa de "consagrar e legitimizar" a ocupação de terras árabes e disseram em um comunicado conjunto que qualquer participação árabe seria “além dos limites da normalização” das relações com Israel.
Embora um esboço mais preciso do plano político tenha sido mantido em segredo, oficiais que foram informados sobre ele disseram que Kushner descartou a solução de dois Estados-- uma velha ideia que circula ao redor do mundo que envolveria um estado independente palestino ao lado de Israel na Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Faixa de Gaza.
OUTRA TRAGÉDIA
A Autoridade Palestina boicotará a reunião no Bahrein, dizendo que apenas uma solução política resolverá o problema. O grupo que as “promessas abstratas” de Kushner eram uma tentativa de subornar palestinos a aceitarem a ocupação israelense.
A Casa Branca não convidou o governo israelense para o Bahrein.
Na Rádio de Israel, Hanegbi disse que Washington tentou criar “um pouco mais de confiança e positividade” ao apresentar uma visão econômica, mas acabou por tocar em alguns nervos dos palestinos.
“Eles ainda estão convencidos que toda a questão de uma paz econômica é uma conspiração, com o único objetivo de enchê-los de fundos para projetos e outras benesses apenas para que eles se esqueçam de aspirações nacionalistas. Isso é, evidentemente, apenas paranoia, mas é outra tragédia para os palestinos”, disse o ministro israelense.
Estados do Golfo aliados aos Estados Unidos, incluindo Arábia Saudita e Emirados Árabes, participarão da reunião no Bahrein ao lado de autoridades de Egito, Jordânia e Marrocos. Líbano e Iraque não comparecerão.
“Aqueles que acham que acenar com bilhões de dólares pode levar o Líbano, que padece sob o peso de uma sufocante crise econômica, a sucumbir ou barganhar seus princípios estão errados”, disse o chefe do parlamento, Nabih Berri.
O grupo Hezbollah do Líbano, apoiado pelo Irã, com significativa influência no governo, havia chamado o plano anteriormente de um “crime histórico” que precisa ser interrompido.
Milhares de pessoas marcharam pela capital do Marrocos, Rabat, neste domingo, para expressar solidariedade com os palestinos e sua oposição ao plano de Kushner.
“Viemos falar em uma única voz, como marroquinos, e expressar nossa rejeição a todas as conspirações contra a causa palestina”, disse à Reuters o vice-secretário geral do partido da coalizão governista do reino, o islâmico PJD.
Analistas árabes acreditam que o plano econômico de Kushner é uma tentativa de comprar a oposição à ocupação por Israel de terras palestinas, uma vez que proporia bilhões de dólares para que países vizinhos que recebem milhões de refugiados palestinos os integrem.
Depois da criação de Israel, em 1948, Jordânia, Síria e Líbano absorveram a maioria dos refugiados palestinos, com algumas estimativas de que eles totalizam hoje cerca de cinco milhões de pessoas.
PELO MENOS OUVIR
A Arábia Saudita, guardiã dos lugares mais sagrados do Islã, tem sido acusada por alguns críticos de abandonar os palestinos em meio à sua rivalidade com o Irã, que tem se colocado como guardião dos direitos palestinos.
Estudiosos muçulmanos da região, que no passado ajudaram a colocar a opinião pública a favor dos palestinos, ficaram em silêncio horas depois de o plano dos EUA ter sido lançado, em um sinal de repressão aos dissidentes em vários países árabes.
A Arábia Saudita deteve vários clérigos proeminentes em um aparente movimento para silenciar potenciais oponentes dos governantes do reino. A principal autoridade muçulmana sunita do Egito, al-Azhar, ainda não divulgou uma declaração.
Riad assegurou aos aliados árabes que não apoiaria nada que não atendesse às principais demandas palestinas.
Ali Shihabi, que dirige a Fundação Arábe, que apóia as políticas sauditas, disse que a Autoridade Palestina estava errada em rejeitar o plano de imediato.
"Deveriam aceitá-lo e trabalhar para entregar os benefícios a seu povo. Para então avançar agressivamente com trabalhos não-violentos... para buscar direitos políticos", escreveu ele no Twitter.
O empresário Khalaf Ahmad al-Habtoor, dos Emirados Árabes, também criticou a recusa dos palestinos em ir ao Bahrein.
"Não há mal algum em ouvir o que será colocado na mesa", escreveu ele no mês passado.
No entanto, mesmo no Golfo, o apoio ao plano de Kushner é limitado.
"O acordo do século é uma ... (proposta que envolveria) concessão unilateral pelo lado árabe. Enquanto isso, os ocupantes ganham tudo: terra, paz e dinheiro do Golfo", disse o parlamentar kuweitiano Osama Al-Shaheen.