Por Catarina Demony
LISBOA (Reuters) - Filipa Almeida tinha 17 anos quando foi abusada sexualmente por um padre. Ela ficou em silêncio por anos, mas finalmente encontrou forças para falar e espera que uma visita do papa Francisco a Portugal, sua terra natal, nesta semana, lembre o mundo de milhares de crimes semelhantes.
"Eu vivi com esse segredo por 22 anos", disse a mulher de 43 anos à Reuters sobre sua provação, que ela afirmou ter ocorrido durante um curso de treinamento religioso. "Não é fácil viver com essas experiências."
Ela é uma das pelo menos 4.815 pessoas que foram abusadas sexualmente pelo clero - a maioria padres - em Portugal ao longo de 70 anos, segundo uma investigação divulgada em fevereiro. A comissão responsável disse que isso era apenas a "ponta do iceberg" e que mais de 100 padres suspeitos de abuso sexual de crianças continuavam ativos em cargos na igreja.
Falando antes da chegada do papa, marcada para a manhã de quarta-feira, o patriarca de Lisboa Manuel Clemente disse que o compromisso da igreja portuguesa em resolver o problema é "total".
Mas Filipa Almeida afirmou que a visita estava apenas destacando a falta de progresso.
A igreja recebeu a lista de suspeitos em março, prometeu investigar e suspendeu alguns padres, mas alguns outros já voltaram às suas funções. Filipa disse que o padre que abusou dela não foi suspenso durante uma investigação.
A Conferência Episcopal Portuguesa afirmou que não pode suspender padres a menos que os fatos contra eles sejam claramente estabelecidos, mas que haverá "tolerância zero" para abusadores e seus facilitadores.
Nenhuma reparação está prevista, mas os bispos prometeram apoio "espiritual, psicológico e psiquiátrico".
Filipa Almeida e outras duas vítimas criaram a associação Coração Silenciado, que dá voz e apoio a vítimas de abuso. "A única coisa que nos ajuda é fazer com que outras vítimas sintam que não estão sozinhas", disse ela.
Francisco, que visita Portugal para participar de um encontro global de jovens católicos conhecido como Jornada Mundial da Juventude, deve se encontrar em particular com vítimas de abuso.
A associação de Filipa não foi convidada, mas ela ainda vê o evento como uma oportunidade para "enfrentar o problema" e alertar sobre os sinais de alerta de abuso e incentivar as vítimas a denunciar.
"Haverá jovens de todo o mundo e a realidade (do abuso) está presente em todos os continentes", disse ela. "É uma grande oportunidade para a igreja fazer algo."