“A tese do Bitcoin é que veremos um crescimento contínuo do dinheiro não soberano. Pessoas em todo o mundo verão o valor de um ativo digital altamente seguro e resistente à censura, como o Bitcoin.” - Jeremy Allaire, Circle
Estamos vivendo o período com um dos maiores outliers da história. A covid-19 provocou um processo de ajuda financeira nunca vista na história e, em 2021, foi possível observar os resultados dessa política de expansão monetária. De acordo com artigo publicado no S&P Global Market Intelligence, desde o início da pandemia, foram adicionados cerca de US$ 4 trilhões na economia. Como resultado desse processo, há um crescimento significativo do mercado de capitais e de investimentos alternativos, além da desvalorização dos ativos fiduciários (moedas estatais).
Com as recentes movimentações econômicas, é possível observar o aumento da taxa de inflação ao redor do mundo, especialmente em países em desenvolvimento. Um exemplo desse processo pode ser constatado no Brasil, através do Índice Geral de Preços (IGP), que apresentou crescimento de 21%.
Apesar de serem os mais afetados, os países em desenvolvimento não são os únicos a sentirem os impactos da inflação. Nas últimas semanas, saíram as primeiras informações referentes ao crescimento da inflação nos Estados Unidos, que apresentou a maior taxa dos últimos trinta anos, assim como na Alemanha, que também apontou a maior taxa de inflação neste mesmo período. Com isso, torna-se mais provável o cenário de interferência por parte dos bancos centrais nas taxas de juros para buscar controlar este processo.
O Bitcoin pode ajudar com isso?
Ao observar a possibilidade crescente da inflação é natural o seguinte questionamento: “Como iremos nos proteger deste cenário?”. O caminho mais comum adotado pelo mercado é o investimento em reservas de valor como o ouro, que em outras crises foi utilizado como hedge (proteção de carteira). Um dos primeiros gestores a questionar essa dinâmica foi Paul Tudor, que em maio de 2020, alocou parte do seu fundo em Bitcoin, afirmando que o ativo poderia estar descontado e teria potencial de se tornar um hedge contra inflação mais eficiente que o ouro em momentos de incerteza.
“A matemática existe há milhares de anos e dois mais dois equivalem a quatro, e assim será pelos próximos 2 mil anos. Então, gosto da ideia de investir em algo que seja confiável, consistente, honesto e 100% certo.” - Paul Tudor
Desde então, diversos institucionais seguiram o mesmo caminho, sendo este um grande driver que movimentou o preço do ativo. De fato, o cenário atual de inflação pode ser um sinal fundamentalista incrível para o Bitcoin, tanto que, novamente, estamos observando o crescimento da correlação entre o ativo e o ouro no curto prazo, reforçando a narrativa de ativo diversificador que pode representar uma proteção em momentos de incerteza do mercado.
Entretanto, acredito que seja importante compreender que estamos observando as primeiras mudanças significativas da política monetária que se iniciou na pandemia; países como o Brasil, Rússia e México já apresentaram uma alta em suas taxas de juros. Além do mais, o Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos (FED) já sinalizou que irá reduzir a política de incentivos monetários em breve, o que pode desaquecer o mercado de criptoativos.
A meu ver, o aspecto mais importante a ser compreendido neste cenário é que 2021 foi o ano que marcou a entrada do Bitcoin no mercado de investidores institucionais, tanto pela criação de infraestrutura para o ativo, com o ETF, como pela correlação crescente com o mercado tradicional em momento de estresse. Compreender como será a reação do ativo em meio ao cenário de ajuste de política monetária será essencial para saber como aproveitar suas características em um bom portfólio.
* Orlando Telles é sócio-fundador e diretor de research da Mercurius Crypto, casa de pesquisa em criptoativos.