No artigo de hoje, vou trazer alguns números relevantes sobre a reforma da Previdência na Câmara. A pauta é o principal desafio do governo nesse primeiro ano e a maior preocupação dos investidores. Por isso, nunca é demais tratar sobre o tema. Com o pano de fundo nos dados, buscarei responder se o governo realmente precisa do chamado Centrão neste desafio.
A metodologia utilizada para a montagem dos gráficos presentes nesse artigo respeitou os levantamentos de dois veículos de comunicação: os jornais O Estado de S. Paulo e Valor Econômico. Ambos os veículos procuraram diretamente os 513 deputados com o intuito de descobrir suas respectivas posições com relação à PEC 6/2019, que trata da reforma previdenciária. Reforçando aqui que quem deu as respostas foram os próprios deputados; os jornais somente as organizaram.
No caso do Estadão, os deputados foram divididos em quatro grupos: a favor, a favor com ressalvas, contra e não encontrados/sem resposta. Na pesquisa do Valor, os critérios eram um pouco diferentes: deputados poderiam se declarar a favor, parcialmente a favor, contra ou indefinidos.
Para chegar aos resultados que apresentarei abaixo, cruzei os dados dos 513 parlamentares nas duas pesquisas, buscando obter o que considero o resultado mais próximo da realidade do placar da Previdência na atualidade. O governo precisa de 308 votos para aprovação da proposta no plenário da Câmara. Vale ressaltar que as informações coletadas são de 18 de abril, portanto algumas poucas mudanças já podem ter ocorrido.
Na tabela abaixo, a lógica de agrupamento das respostas. Nesse caso, a ordem dos fatores não altera o produto. Em outras palavras, não coloquei todas as possibilidades de combinação para não tornar a tabela repetitiva. Então, está implícito que se o suposto deputado votou "A favor" no Jornal 1 ou no Jornal 2 e "Indefinido" no Jornal 1 ou Jornal 2, o resultado é o mesmo.
Ao raciocínio, só cabem exceções interpretativas quando o partido fechou questão para a reforma da Previdência. Como exemplo o caso do PDT, que se posicionou contra a Nova Previdência: alguns deputados se posicionaram contrários à reforma em um levantamento e favoráveis em outro. Assim, eles seriam classificados como indefinidos, mas excepcionalmente entende-se que o voto do deputado(a) será "contra" – por conta da orientação do partido.
Outra exceção pontual é o caso de deputados que não se pronunciaram em nenhum dos dois veículos de comunicação mas já tem, comprovadamente, um posicionamento perante a PEC. Por exemplo, até o momento em que esse texto começou a ser inscrito Rodrigo Maia (DEM-RJ) não respondeu nenhum dos levantamentos. Não existe, contudo, nenhuma dúvida que o deputado é favorável à reforma.
Sem mais delongas, vamos aos resultados. Em primeiro lugar, o placar geral mostra que existe uma considerável quantidade de deputados dispostos a votar pela aprovação, enquanto que o número de indecisos e contrários fica bastante próximo.
A notícia não tão boa é que, dessa parcela, grande parte dos parlamentares enxergam a necessidade de alterações no projeto original de Paulo Guedes e sua equipe. Isso explica a grande apreensão dos mercados com relação ao tamanho da desidratação fiscal.
O que nos leva para outra questão: quem, afinal, precisa ser convencido? Quais partidos estão dando mais ou menos apoio à reforma? Será que fazem sentido as críticas ao governo sobre a falta de articulação política?
Vejamos no gráfico acima: de fato, excluída a tradicional oposição advinda dos partidos de esquerda e o óbvio apoio de deputados do PSL e NOVO (que fechou questão a favor da reforma), temos um conjunto de partidos com alto percentual de indefinidos e/ou com pouco apoio incondicional.
Não surpreendentemente, no conjunto estão partidos como MDB, Solidariedade, PP, PSD, PTB, PR, PRB, DEM e AVANTE. A maioria dessa siglas compõe o famoso Centrão, que tradicionalmente negocia seu apoio aos projetos de lei mediante contrapartidas que fortaleçam seu poder político.
Portanto, se por um lado faltam "somente" 68 votos para que o quórum mínimo de aprovação se atinja, por outro fica claro que o governo precisa prestar atenção a esse grupo se quiser aprovar um projeto minimamente potente do ponto de vista fiscal.
O presidente Bolsonaro e seu núcleo duro já perceberam que a estratégia é essa – inclusive, já tratei disso em colunas passadas. O problema agora me parece organizacional: estamos chegando ao fim da tramitação da PEC na CCJ e a base aliada coleciona derrotas na comissão que é a menos difícil. É na comissão especial, cuja discussão será sobre o conteúdo do projeto, que é onde a disputa é para valer.
Já é consenso entre analistas e cientistas políticos que negociar na política não é crime nem pecado – desde que a conversa seja limpa e republicana. O PSL é um partido com muitos deputados de primeira viagem e que não tinham relevância antes das eleições de 2018. A falta de experiência política da base governista vem custando caro ao Planalto. Atualmente, o que me tira o sono não é o fato de Bolsonaro não querer negociar. É a possibilidade do governo querer negociar, mas não ser capaz.