Vamos dar um tempo sobre as escaramuças políticas no Brasil, embora estas continuem intensas e tumultuando a governabilidade de Michel Temer, e falemos nesta semana sobre o cenário global.
Tudo piorou por estes dias. Nos EUA um covarde ataque terrorista a uma boite gay em Orlando acendeu o sentimento nacionalista e anti-imigrante entre parte da população, o que fortaleceu a campanha à presidência do republicano Donald Trump. Ajudou também a acirrar os ânimos no Reino Unido, pela proximidade do referendo sobre a permanência na União Europeia, a acontecer (talvez) em 23/6. Por estes dias uma virada aconteceu entre os que defendem a saída (Leave), no chamado Brexit, e os que defendem a permanência (Remain). Isto, inclusive, pode ser visto pelo gráfico abaixo, mostrando o Leave já empatado com o Remain.
PESQUISA PELA PERMANÊNCIA OU NÃO DO REINO UNIDO NA EU
Sobre os que defendem a permanência, David Cameron, primeiro ministro britânico, é um dos expoentes, assim como vários articulistas importantes e veículos de imprensa, como a revista The Economist e o jornal Financial Time. Na defesa pela saída, partidos nacionalistas e populistas, e segmentos da sociedade mais conservadores, intolerantes e preocupados com a onda de imigrantes da Síria e da África. Na visão deles, “como evitar que entre um destes não esteja um louco ligado ao ISIS (Exercito Islâmico)?”
O fato é que se o Reino Unido sair da União Europeia, estragos na economia, do País a da Europa, acabarão inevitáveis. Isto já pode ser sentido pelos movimentos recentes da lIbra esterlina, no menor patamar em muitas semanas, como se observa no gráfico ao fim. Entre 1/4 e 16/6, entre a maior cotação dia 17/5 e a menor, no dia 16/6, a depreciação chegou a 4,2%. Soma-se a isto, ocorrem movimentos de venda de ativos, principalmente de títulos públicos dos países da Europa, num processo de “fuga para a qualidade”, para ativos lastreados em dólar, como os T Bonds e mesmo a moeda norte-americana (valorizando-a). A seguir, respondamos a algumas indagações sobre este tema.
União Europeia (UE). É um estágio inicial para o processo de unificação. Neste predominam acordos comerciais e financeiros com os países da Europa e a livre mobilidade de fatores de produção, sob a forma de serviços, capital, trabalho, bens, etc. O ponto crucial para o Brexit estaria na mobilidade do fator trabalho, dado o receio com os movimentos migratórios. Podem vir destes o risco de infiltração de células terroristas, justificando o movimento de rejeição.
Pontos favoráveis e desfavoráveis. Pela saída da UE, a direita mais xenófoba e nacionalista considera importante por aumentar a “segurança” do País contra o terrorismo. Outros também enxergam vantagens por reduzir a obrigatoriedade de ter que contribuir com 8 bilhões de libras todos os anos para a burocracia de Bruxelas (sede da união). Outra pauta, neste caso, seria a de manter a “soberania e o orgulho nacional”, sob a forma de uma moeda própria, a Libra Esterlina.
Na direção contrária, o Reino Unido perderia em atratividade de negócios, inclusive, com a possibilidade da saída de instituições financeiras da City de Londres, pela elevação dos custos de reestruturação. Estas acabariam se deslocando para as praças financeiras de Frankfurt ou Paris. Haveria também um brutal aumento do desemprego, podendo chegar a 1 milhão de empregos perdidos, dependendo da queda do PIB, em torno de 3,5% a 4,0% em dois anos. A moeda perderia entre 12% e 15% do valor, contribuindo para o aumento da inflação e daí da necessidade de uma política monetária mais apertada pelo Bank of England. Este choque sobre a libra, inclusive, poderia causar uma repentina contração dos empréstimos em moeda externa, algo preocupante por ser metade dos financiamentos no atacado do sistema bancário nesta modalidade.
Segundo a revista The Economist, entre prós e contras:
No comércio exterior, o Reino Unido, se saindo, teria que negociar com os países da Europa aceitando as regras do bloco. Importante destacar que 45% das exportações britânicas vão para a Europa. Sem estas regras, se tornaria mais complicado também negociar com outros países, como China, Índia e EUA. No Orçamento da UE, os ingleses parariam de pagar altos montantes para os burocratas de Bruxelas (sede da UE) todas as semanas, com estes recursos aproveitados internamente. Por outro lado, estando fora teriam que continuar a pagar para se relacionar com os países da UE. Na regulação, também existiriam problemas, com os ingleses lutando por um melhor ambiente de negócios, mais livre de controles. O problema é que se eles saírem seriam obrigados a passar também por uma serie de regulações da UE. Na imigração, poderia não significar redução de fluxos. Muitos países de fora do bloco possuem até mais imigração do que os de dentro. Muitos ingleses, no entanto, “gostariam de mudar este dispendioso e fora de controle sistema que oferece portas abertas para imigrantes de fora do bloco”. Por fim, os ingleses perderiam muita esfera de influência nos debates internacionais, caso saiam do bloco.
Comentários finais. Nesta semana, o assassinato de uma deputada trabalhista, Jo Cox, defensora da manutenção do Reino Unido no bloco, por um extremista de direita, acabou acirrando os ânimos, podendo provocar o adiamento do referendo, não mais no dia 23/6. O fato é que este tema é cercado de incertezas. Ninguém sabe no que deve resultar a saída do Reino Unido da UE. Comenta-se que pode provocar outros movimentos nacionalistas, como a saída dos bascos da Espanha, no próprio Reino Unido, com a Escócia e a Irlanda, dentre tantos. Fortalecerá também novos movimentos nacionalistas e populistas pelo mundo, sendo o mais preocupante o do candidato republicano Donald Trump nos EUA. Para o articulista Martin Wolf, “o Reino Unido se sair acabará menor, mais frágil, tanto política, como economicamente”.
TRAJETÓRIA DA LIBRA DESDE ABRIL