Encontros promovidos pelo FMI e Banco Mundial sempre acontecem duas vezes ao ano, nos meses de janeiro, inverno do Hemisfério Norte, e abril, primavera. Nestes são convidados vários atores da cena econômica e financeira mundial, debates são promovidos e divulgados relatórios sobre os cenários da economia global. Nos elaborados pelo FMI, o mais conhecido, “Panorama Econômico Global do FMI” (IMF World Economic Outlook), sempre causa furor por representar a opinião do economista-chefe da maior instituição multilateral em operação. Neste, divulgado nesta primavera de Washington, alguns pontos merecem ser comentados.
Economia Mundial. Para o FMI, a economia global está em recuperação, mas em ritmo “desigual e moderado”. Esta também é a opinião de Alexandre Tombini, presidente do BACEN, achando que “a normalização das condições monetárias está no fim nos EUA, mas o QE da Zona do Euro segue em curso, o que deve suavizar os impactos do fim do ciclo norte-americano”.
Segundo o economista Affonso Celso Pastore, inclusive, o mundo vive a fase de “bonança externa” e o fim do ciclo de commodities e da fase de crescimento exuberante do comércio internacional. Destaca que o recuo das exportações mundiais não se deve tanto aos preços, mas também à quantidade, o que dá um caráter mais estrutural aos problemas globais. Outro ponto em destaque para Pastore é o intenso fortalecimento do dólar. Para ele, os ciclos de valorização (ou de desvalorização) do dólar costumam ser mais longos, reforçando o enfraquecimento do real. Neste sentido, seria de se prever um ciclo de depreciação da moeda nacional, ainda mais nos próximos meses, e se aprofundando a partir do ciclo de ajuste do juro pelo Fed, previsto entre setembro e o início de 2016.
O fato é que a retomada global acontece de forma desequilibrada e pouca ajuda se deve ter dos EUA. Este país segue como o mais dinâmico da cena global, a Zona do Euro esboça alguma reação depois da adoção da política de estímulos (QE de 60 bilhões de euros mensais e 1,1 trilhão de euros até 2016), considerada “mais bem-sucedida do que o esperado” e a China desacelera, assim como outros emergentes, mais ou menos impactados em função do fim do ciclo das commodities e do crédito.
Neste contexto, para o FMI, na economia mundial as estimativas são de crescimento em torno de 3,5% e 3,8%, respectivamente, em 2015 e 2016, as economias avançadas crescendo 2,4% e as emergentes 4,3% e 4,7%, sendo destaque a perda de dinamismo do Brasil, Rússia e China. A Índia, por outro lado, será destaque neste ano, considerada “pólo de atração” dos Brics e não afetada pelas crises localizadas e por ter feito seu “dever de casa”, evoluindo nas reformas estruturais e na atração de novos investimentos. Já a Rússia segue “enrolada” no conflito da Ucrânia, sujeita a sanções dos países desenvolvidos, e na queda do preço do barril de petróleo. Decorrente disto deve recuar 3,8% neste ano, acompanhada pelo mergulho recessivo da Venezuela (FMI prevê -7,0% e Banco Mundial -5,3%), também muito dependente do petróleo e engolfada por uma crise interminável de abastecimento, fruto do esgotamento de um modelo calcado no “populismo bolivariano”
Estados Unidos. Os EUA se mantêm como destaque na cena global, mas por quanto tempo? No primeiro trimestre deste ano, o crescimento foi fraco, devido ao inverno rigoroso e o câmbio valorizado, mas muitos acham que a recuperação já está encaminhada. Estimativas de crescimento do FMI indicam algo em torno de 3,1% para este ano e o próximo. Nós da Lopes Filho trabalhamos com algo em torno de 2,5% a 2,7%.Boa parte deste ajuste se deve ao dólar valorizado, estimulando as importações e derrubando as exportações, além da inflação. Neste contexto, atenção deve ser dada ao aperto monetário inevitável (gradualista) do Fed, devendo ocorrer entre setembro próximo e o primeiro trimestre de 2016. A taxa de juros de curto prazo deve ser ajustada entre 0,25 e 0,5 p.p.. Talvez ao fim de 2016 esteja em torno de 1%, devendo ser ajustada até 3% a 3,5% anuais, taxa histórica dos T Bonds de 10 anos nos EUA.
Para isto, o Fed olhará com uma lupa para o mercado de trabalho (payroll veio mais fraco na última apuração e a taxa de desemprego se manteve em 5,5% da PEA) e a atividade econômica, que deixa um pouco de lado o comportamento da inflação, em queda pelo recuo da energia e valorização do dólar.
Zona do Euro. Sobre o “velho continente”, acredita-se que os estímulos monetários atuais devem gerar algum impulso para a região e tirá-la da “armadilha do baixo crescimento e da deflação”. Isto já pode estar ocorrendo, já que a deflação vem cedendo nos últimos meses. Em janeiro, pelo CPI anualizado, chegou a 0,6%, em fevereiro registrou 0,3% e em março 0,1%. Este, aliás, é o principal desafio do BCE, além de recuperar a Grécia, atolada no seu populismo fiscal do passado e tentando agora retornar seu acesso aos empréstimos da troika.
Sobre o comportamento do euro, observa-se que com os estímulos do BCE este vem se desvalorizando, convergindo aos poucos para a paridade um para um com o dólar. Isto deve resultar num maior ganho de competitividade pelo lado do preço, ou seja, pela taxa de câmbio depreciada, o que deve fortalecer as exportações, embora encarecendo as importações. Para o FMI, a Zona do Euro deve crescer em torno de 0,9% a 1,6% entre 2015 e 2016.
China. Para este ano, as estimativas do FMI são de crescimento em torno de 6,8%, desacelerando a 6,3% em 2016. Em 2014 o crescimento foi de 7,4% e no primeiro trimestre, segundo as autoridades, desacelerou a 7%.
Japão. Uma boa notícia é a recuperação do Japão, adotando a mesma estratégia de estímulos monetários dos EUA e Zona do Euro. Depois de recuar 0,1% em 2014, o arquipélago do Pacífico deve crescer 1% neste ano e no próximo.
América Latina e Caribe. Na visão do Banco Mundial, o crescimento médio da região está previsto em 0,8%, mais fraco devido à queda das commodities e redução dos investimentos. Para a instituição, a região atravessa um “novo padrão de crescimento mais baixo e são necessárias novas decisões de política monetária e fiscal para construir algum espaço de manobra para os investimentos e combate às adversidades”. Na visão do FMI, através de Christine Lagarde, a “fase das vacas gordas para as commodities já é passado”. A perda de dinamismo da China tem derrubado as economias da América Latina. Decorrentes disto, as autoridades da região precisam adotar importantes reformas estruturais. Para o FMI, em 2014 a região cresceu 1,3% e deve crescer 0,9% neste ano de 2015, devido ao fraco desempenho do Brasil, Venezuela e Argentina.
Brasil, contraponto da economia global. Na opinião do FMI, um problema destacado é a corrupção espalhada pelas várias esferas de governo e instituições brasileiras. Isto, de certa forma, justifica a baixa confiança dos empresários e investidores. Para a instituição multilateral, as medidas anunciadas pelo ministro Levy estão na direção correta, mas são só “parte da solução”. Será importante também o “fortalecimento das políticas macro e o restabelecimento da credibilidade”. No entanto, reconhecem a solidez do sistema bancário e as reservas cambiais em patamar confortável.
Para o Banco Mundial, a retração da economia brasileira neste ano deve chegar a 0,7%, só melhor do que o mergulho da Venezuela, previsto em 5,3%. Na visão do banco, o modelo sustentado pelo consumo se esgotou e o País deve buscar novas formas para obter investimentos. É um drama em três atos, fim do ciclo das commodities, ajustes e recuperação dos investimentos, não acompanhados pelo Brasil. Neste último, como países vetores do aumento dos investimentos, destaque para Colômbia, Peru e Chile.
A análise do FMI e do Banco Mundial, em muito, se coaduna com o que pensamos sobre a economia brasileira. Adotamos várias políticas de má qualidade no primeiro mandato da presidente Dilma, com os ajustes fiscais sob análise do TCU, nas chamadas “pedaladas fiscais”, consideradas “crime de responsabilidade”, e agora estamos tendo que limpar os erros do passado. O ministro Levy assumiu a Fazenda com o compromisso de dar um freio de arrumação na economia brasileira e colocá-la, o mais breve possível, na trilha da retomada do crescimento. Ambas as instituições estão solidárias ao esforço fiscal empreendido pelo ministro.