*Com Luiz Fernando Rodrigues Brito
O cenário de juros elevados no Brasil favorece os investimentos em renda fixa, destacando alternativas como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA). Esses títulos, além de oferecerem isenção de Imposto de Renda para pessoas físicas, costumam apresentar rentabilidades superiores às dos investimentos tradicionais. No entanto, exigem uma análise criteriosa dos riscos envolvidos, especialmente quanto à qualidade do lastro e à estrutura da operação.
Tanto os CRI quanto os CRA são emitidos por companhias securitizadoras, responsáveis por transformar créditos futuros em ativos negociáveis no mercado financeiro. Na prática, esses certificados representam a antecipação de fluxos de pagamentos futuros. Quando os recebíveis são oriundos do setor imobiliário, temos um CRI; se forem do agronegócio, um CRA.
Por exemplo, uma empresa do agronegócio que tem a receber R$ 100 milhões ao longo de 10 anos pode recorrer a uma securitizadora para antecipar esse valor. A securitizadora emite um CRA, que é vendido no mercado, permitindo à empresa receber o montante à vista. Os investidores, por sua vez, passam a ter direito aos fluxos futuros de pagamento. O conjunto de dívidas que sustenta essa operação é chamado de lastro, e sua qualidade é determinante para o risco do investimento.
Da mesma forma, no setor imobiliário, uma incorporadora que tem a receber valores futuros pela venda de unidades pode recorrer a uma securitizadora para antecipar esses recursos. Nesse caso, é emitido um CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), que é negociado no mercado. Assim como no CRA, os investidores passam a ter direito aos fluxos de pagamento vinculados à operação. A qualidade do lastro é igualmente essencial para determinar o nível de risco e atratividade do investimento.
Em 2024, o Conselho Monetário Nacional (CMN) atualizou as regras sobre os lastros elegíveis para CRIs e CRAs, permitindo maior flexibilidade na estruturação dessas operações. Agora, contratos comerciais como locações e vendas, além de títulos de dívida emitidos por terceiros, como as CCIs (Cédulas de Crédito Imobiliário), podem compor o lastro das operações. Essas mudanças visam ampliar o acesso ao mercado de capitais por empresas dos setores imobiliário e agropecuário, mantendo a segurança jurídica e a transparência para os investidores.
Ao aplicar em CRI ou CRA, o investidor está, na prática, financiando atividades específicas dos setores imobiliário ou agropecuário, recebendo em troca uma remuneração previamente acordada. Essa remuneração pode ser prefixada ou pós-fixada. Nos títulos pós-fixados, a rentabilidade está atrelada a um índice de referência, como o IPCA ou o CDI, acrescido de um spread. Já nos prefixados, a taxa é definida no momento da aplicação, o que pode ser arriscado em cenários de alta inflacionária.
Diferentemente de produtos como poupança e CDBs, os CRIs e CRAs não contam com a proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Isso reforça a importância de uma análise detalhada da estrutura da operação, incluindo a solidez dos devedores, a diversificação do lastro e a existência de mecanismos de mitigação de risco, como subordinação de tranches ou garantias reais. Para garantir que tudo ocorra conforme o que foi combinado nos contratos, o Agente Fiduciário representa os investidores, acompanhando se as regras estão sendo seguidas, monitorando os ativos da operação e, se houver inadimplência, pode acionar as garantias oferecidas, como imóveis ou outros bens.
Outro ponto técnico relevante é a avaliação da rentabilidade efetiva. Quando o título é adquirido no mercado secundário, o preço de compra pode alterar significativamente o retorno final. Nesses casos, utiliza-se a Taxa Interna de Retorno (TIR), que considera todos os fluxos de caixa futuros e o valor desembolsado na aquisição, permitindo uma comparação mais precisa entre diferentes alternativas de investimento.
A isenção de IR para pessoas físicas é um diferencial competitivo importante, especialmente em um país com elevada carga tributária. No entanto, essa vantagem não se aplica a investidores institucionais ou em operações estruturadas de forma privada, onde a tributação pode seguir regras específicas.
Aqui vamos a um exemplo prático com dados fictícios. Imagine um investidor que aplica R$ 100 mil em um CRA com rentabilidade de IPCA + 6% ao ano, isento de IR. Supondo uma inflação de 4%, o retorno bruto seria de 10% ao ano, ou R$ 10 mil. Já um fundo de renda fixa tradicional, com retorno de 11% ao ano, sofre incidência de IR de 15% (alíquota para prazos acima de 720 dias), resultando em um retorno líquido de 9,35% ao ano, ou R$ 9.350. Nesse cenário, o CRA oferece um retorno líquido superior, mesmo com uma rentabilidade bruta menor, evidenciando o impacto da isenção fiscal.
Portanto, investir em CRI e CRA pode ser uma excelente estratégia de diversificação e otimização da carteira de renda fixa, desde que o investidor tenha perfil compatível com o risco e horizonte de longo prazo. A análise técnica da operação, incluindo a estrutura do lastro, o emissor, o agente fiduciário e os mecanismos de proteção, é essencial para mitigar riscos e maximizar o retorno.
*Estudante de Ciências Econômicas do Ibmec e Estagiário de Operações Estruturadas na Pentágono S.A. DTVM.