Enquanto o investidor brasileiro se concentra nas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom), nas sinalizações de Brasília e nas oscilações da inflação doméstica, existe um outro foco de volatilidade que deve ser observado por ele. Trata-se da manutenção dos juros elevados nos Estados Unidos, algo que, mesmo à distância, tem um impacto direto e crescente sobre o câmbio, os investimentos e a estabilidade dos mercados emergentes.
A manutenção de juros altos na economia americana corrói o diferencial de juros entre o Brasil e os EUA, o que limita a habilidade do COPOM em reduzir os juros de forma significativa. Além disso, as altas taxas de juros americanas pressionam o custo de financiamento externo de empresas brasileiras e reduz a atratividade dos nossos ativos.
Desde o início de 2022, o Federal Reserve adotou a política monetária mais restritiva em mais de quatro décadas. A inflação nos EUA, impulsionada por estímulos fiscais e gargalos pós-pandemia, forçou o banco central americano a agir com agressividade. O resultado foi um ciclo de aperto monetário que levou a taxa básica para o intervalo de 4,25% a 4,50% desde dezembro.
Ao contrário do que o mercado previa no início de 2025, os cortes de juros foram adiados indefinidamente. A resiliência do mercado de trabalho americano e a persistência inflacionária nos serviços têm levado o Fed a defender a ideia de juros altos por mais tempo — o famoso higher for longer.
Esse novo normal dos EUA é especialmente desafiador para países emergentes. Com os juros reais americanos em níveis historicamente altos, o apetite por risco diminui. Os investidores institucionais globais reavaliam suas carteiras, saindo de ativos mais voláteis em busca da segurança dos treasuries.
O chamado carry trade, que consiste em tomar recursos em países de juro baixo (como EUA, Europa ou Japão) e investir em países de juro alto (como o Brasil), ainda se mantém atrativo no curto prazo, com a SELIC se mantendo em 14,75% até dezembro de 2025, de acordo com as expectativas do Boletim Focus. Porém, com o Fed estático e o Banco Central brasileiro pressionado por questões políticas, esse tipo de trade pode deixar de ser interessante no médio prazo.
Além disso, a deterioração da percepção fiscal, com sinais ambíguos do governo em relação ao IOF e a incerteza de como será compensada a isenção do Imposto de Renda, joga contra a moeda brasileira, que está acima de 5,50 desde outubro de 2024. O investidor internacional observa atentamente o comportamento das contas públicas. Qualquer sinal de descontrole afasta capital e pressiona o câmbio.
O impacto da volatilidade do dólar não é uniforme. Empresas com dívida em moeda estrangeira sem proteção (hedge) sentem rapidamente a pressão no custo financeiro. Ao mesmo tempo, setores exportadores — como papel e celulose, agronegócio e mineração — tendem a se beneficiar no curto prazo.
No entanto, mesmo para esses setores que tendem a se beneficiar no curto prazo, a volatilidade cambial também possui aspectos negativos. Ela gera incerteza, dificulta o planejamento de investimentos e pode reduzir a eficiência de operações de hedge, além de afetar a percepção de risco dos investidores institucionais. A própria B3 (BVMF:B3SA3) sofre: o fluxo de capital estrangeiro é altamente sensível à estabilidade cambial.
O investidor individual precisa observar essas tendências globais com atenção. Um portfólio que ignore o risco cambial pode estar excessivamente exposto a perdas silenciosas. Isso vale especialmente para quem concentra aplicações em ativos locais, com baixa exposição internacional ou proteção em dólar.
É hora de reforçar a diversificação, tanto setorial quanto geográfica, e considerar estratégias de proteção cambial, seja via BDRs, fundos multimercado com exposição ao dólar, ETFs internacionais ou mesmo alocação direta em ativos estrangeiros.
Além disso, o investidor deve ser criterioso com empresas endividadas em dólar. Muitas vezes, o custo da dívida pode disparar rapidamente, afetando a geração de caixa e os lucros. É essencial olhar para o balanço e identificar quem está bem posicionado para resistir a um cenário de dólar mais forte por um período prolongado.
O investidor brasileiro não pode se dar ao luxo de ignorar o que acontece no Federal Reserve. A política monetária americana, mesmo indiretamente, determina o fluxo de capitais globais e influencia profundamente o valor do real, os juros longos no Brasil e o desempenho de diversos setores da economia.