Crise de identidade
Na manhã de segunda-feira, o mercado trabalhava com o cenário de que Hillary venceria — e isso seria bom. Uma eventual vitória republicana era percebida como improvável e, principalmente, um enorme risco para os Estados Unidos e para as economias globais.
Aí deu Trump. Todos se prepararam para choro e ranger de dentes.
Contrariando as expectativas do consenso, não só o apocalipse não aconteceu como o S&P encontrou espaço para renovar máxima histórica.
É o tipo de choque que deveria levar muita gente a uma profunda crise de identidade.
E, ao que parece, levou mesmo.
Ideias frágeis
O mercado passou, num passe de mágica, a lançar mão da eleição republicana como justificativa para toda e qualquer tese para justificar a continuidade do bull market:
“Os investimentos em infraestrutura nos EUA vão impulsionar a demanda por commodities!”
“As incertezas geradas pela eleição de Trump vão fazer o Banco Central Europeu estender os estímulos monetários!”
“O crescimento mundial vai aumentar por conta dos Estados Unidos!”
A facilidade com que o consenso virou demonstra bem a fragilidade de suas ideias. As de antes e as de depois.
Do que REALMENTE ter medo
Os mercados estavam com medo e, ao verem que as implicações que esperavam para o evento que temiam não se concretizaram, ficaram assim:
Esse comportamento abre espaço para um tipo de medo ante o qual, com o perdão da redundância, é preciso ter medo.
É o medo de ficar de fora. O medo de ser o pato que não embarcou naquela onda que, passado 1 ano, parecerá o movimento mais óbvio do mundo.
É diante de situações assim que acaba-se por tomar risco demais.
Imagine-se gestor de um fundo neste momento. Se você estava com exposição underweight (abaixo da média) em um determinado setor que teve performance acima do mercado, você ficou para trás.
Qual é a tentação? Ficar overweight (acima da média) e torcer para que o movimento continue. Assim você recuperaria o atraso e, talvez, até conseguisse entregar algum retorno a mais do qual se gabaria depois.
O problema é que, quanto mais o indivíduo erra, mais propenso a tomar cada vez mais risco ele fica. Desnecessário dizer que isso acaba mal, não é mesmo?
Tudo mudou? Nada mudou.
No começo da semana eu insisti que, diante da incerteza que representava a eleição nos Estados Unidos, você deveria resistir ao “zerar ou dobrar”.
Naquele momento, evidentemente, a vontade geral da nação era zerar. Insisti para que você simplesmente continuasse aderente ao seu plano, respeitando sua alocação estratégica.
E agora, tudo mudou? Nada mudou.
Siga cético. E não deixe com que o ruído — seja ele positivo ou negativo — desvie sua atenção das teses de investimento nas quais você acredita.
E sente na mão.
Cultura corporativa
Itaú (SA:ITUB4) anunciou ontem que Roberto Setúbal deixará a presidência executiva em breve, em função do limite de idade previsto no estatuto da instituição.
Bob sobe para o conselho, e a vida segue no maior banco do país sem maiores solavancos.
É sempre bom ver uma grande empresa, com cultura corporativa forte e quadros qualificados, na qual não se mudam regras do jogo com a bola rolando para acomodar necessidades momentâneas.
Captou a mensagem?