A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e seus parceiros da Opep+ planejam realizar uma reunião virtual na quinta-feira (9), a fim de discutir a realização de cortes de produção, em face da derrocada dos preços e do excesso de oferta cada vez maior. Há cerca de um mês, tudo levava a crer que o grupo Opep+ tinha entrado em colapso, mas a queda repentina da demanda mundial de petróleo por causa dos fechamentos provocados pelo coronavírus, em conjunto com a oportuna pressão do presidente dos EUA, Donald Trump, parece ter incentivado a Arábia Saudita e a Rússia a tentar ressuscitar sua parceria.
O mercado inicialmente se mostrou otimista com a perspectiva de um corte de 10 a 15 milhões de barris por dia (bpd) na produção de petróleo que o presidente americano mencionou em seus tuítes na última sexta-feira (3). No entanto, o processo não é tão nítido como o tuíte de Trump o descreveu.
Embora a reunião da Opep+ ainda esteja para acontecer, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos já indicaram que qualquer corte de produção por parte da aliança Opep+ também exigirá a participação de outros produtores mundiais. Outros 12 países foram convidados para essa reunião da Opep+ como observadores, mas não se sabe ainda quais participarão, se é que algum participará. Os EUA já recusaram o convite.
Alguns analistas têm insistido que a Opep+ está adotando uma postura inteligente ao pressionar produtores fora da aliança a participar dos cortes. Se isso é inteligente ou não, pouco importa para os investidores. É fundamental entender que se trata de uma manobra sem precedentes. A Opep costumava agir por si só, com raras solicitações de engajamento de países externos. Em 2014, a Arábia Saudita excedeu sua produção quando não conseguiu equilibrar o mercado, mas não fez uma tentativa séria de pressionar quaisquer produtores, exceto seus parceiros de cartel. Em seguida, o grupo ampliou a participação na forma da Opep+. Agora, tudo indica que essa aliança quer que todos os outros produtores façam parte dos acordos, o que não se coaduna com o comportamento passado do grupo.
Como tem ocorrido em praticamente todas as reuniões da Opep+, a Arábia Saudita e a Rússia são os membros principais. Fugindo da sua posição tradicional em relação à Opep, os EUA aparentemente exercerão um papel importante. Saiba o que observar quanto às posições de cada um desses países:
Arábia Saudita
A Arábia Saudita provou uma queda de 30% nos preços do petróleo em um único dia no mês de março, em reação à contrariedade da Rússia com os cortes, comprometendo-se a elevar a produção e reduzir os preços para alguns dos seus clientes. Isso aconteceu há um mês.
Agora, a monarquia saudita está preocupada com sua receita governamental, principalmente em vista dos seus ambiciosos planos de despesas e do seu tradicional papel de provedor do povo. Outra preocupação da monarquia é com o impacto dos preços baixos do petróleo no longo prazo sobre as ações da sua petrolífera estatal Saudi Aramco (SE:2222), as quais estão sendo publicamente negociadas. Vinte por cento dos cidadãos sauditas adquiriram papéis da Aramco durante sua oferta inicial de ações, sendo que alguns chegaram até a se endividar, com base na promessa apresentada pelo governo. A redução do preço das ações da Aramco pode azedar o sentimento político.
Apesar de a monarquia saudita precisar de valores mais altos para o petróleo, a Aramco está produzindo atualmente um recorde de 12 milhões de bpd. Acredita-se que sua oferta some 12,3 milhões de bpd, incluindo 0,3 milhão do estoque. Com uma demanda tão baixa, a grande questão é se a Aramco conseguirá encontrar compradores para o seu petróleo a partir de abril. Se não conseguir, os preços devem cair ainda mais, e a Arábia Saudita transparecerá fraqueza. Além disso, essa alta taxa de produção faz com que os sauditas fiquem sem sua capacidade ociosa estratégica pela primeira vez em décadas. O reino anunciou planos para aumentar a capacidade para 13 milhões de bpd, mas isso levará algum tempo. Por enquanto, o reino continua vulnerável sem essa capacidade ociosa. Tudo isso indica que a Arábia Saudita deseja selar um acordo de corte de produção.
Por outro lado, alguns especulam que a política saudita esteja em parte sendo conduzida de forma a mostrar força contra a Rússia. Nesse caso, o país árabe pode continuar com sua postura rígida, a despeito dos seus melhores interesses.
Rússia
A Rússia quer preços mais altos para o petróleo, assim como qualquer outro produtor. Recentemente, o país declarou que o barril cotado a US$ 40 seria suficiente para o seu orçamento, mas os preços agora estão significativamente mais baixos do que isso. Isso indicaria que os atuais preços não são tão bons assim para o orçamento russo, mas será que os produtores concordarão em realizar um corte maior, a fim de fazer o barril superar a marca de US$ 40?
A Rússia não quer dever favores a ninguém. Antes da sua rixa com a Arábia Saudita no início de março, o presidente Vladimir Putin deixou claro que não via problema no fato de seu ministro de energia, Alexander Novak, rechaçar quaisquer propostas de cortes futuros. A Rússia não fará parte de nenhum pacto de produção que não consiga controlar.
Não sabemos ao certo quão ansiosa a Rússia está por elevar os preços, mas mesmo que o país consinta com um acordo de corte de produção, ainda haverá ceticismo entre os outros parceiros no que tange ao cumprimento dos seus compromissos em vista das experiências passadas.
Estados Unidos
Os Estados Unidos não possuem qualquer mecanismo de regulação da produção de petróleo no país. Na segunda-feira (6), o secretário de energia Dan Brouillette declarou que “nos EUA, nós temos um livre mercado, e a indústria se ajustará por conta própria”.
Alguns estados, como o Texas e Oklahoma, possuem órgãos reguladores que podem estabelecer restrições à produção petrolífera dentro de suas fronteiras, mas o processo é complicado e envolve questões estaduais, e não federais. Existem outras formas pelas quais o governo federal pode tentar restringir a oferta de petróleo no país, como o uso de questões ambientais, mas qualquer tentativa de utilizar as normas de proteção ambiental para regular o comércio seria questionada na justiça.
Por fim, os EUA parecem estar oferecendo apenas uma coisa: uma previsão de declínio orgânico da produção, baseada no mercado. A Agência de Informações Energéticas dos EUA (EIA, na sigla em inglês) emitiu uma nova previsão na terça-feira (7) na qual espera que os EUA produzam em média 11,8 milhões de bpd em 2020. Trata-se de um declínio de 500.000 bpd em relação à produção de 2019. A EIA prevê que a produção americana cairá paulatinamente desde a máxima de março de 12,72 milhões de bpd nos próximos meses, atingindo 10,96 milhões de bpd em outubro, antes de apresentar uma recuperação.
Provavelmente a Opep terá suas próprias previsões para a produção americana, mas os observadores do mercado não devem espera que os EUA ofereçam qualquer “corte de produção” ao cartel além da previsão da EIA de que haverá uma queda motivada pelo mercado.
Se não houver acordo, é bastante provável que seja por causa da frustração dos membros da Opep+ por não conseguirem fazer com que os outros produtores (como os EUA) tomem uma ação.