O Brasil atravessa um período bastante atípico e desfavorável em suas contas externas se confrontado com o passado recente.
O expressivo déficit em transações correntes, que tende a US$ 80,0 Bi ao final do ano, não está alcançando financiamento lastreado nos fluxos de capitais para o país, como usual, e isto coloca a hipótese do governo de ter que utilizar parte das reservas cambiais para a complementariedade.
Balança comercial com risco de fechar negativa; fluxos financeiros para renda fixa e variável aquém das necessidades do país e investimentos estrangeiros diretos menos expressivos do que o projetado, visto que o país perdeu parte da atratividade externa, em face ao baixo crescimento, inflação e questionamentos sobre a política econômica e fiscal.
Este quadro até suscitou alguma insinuação de movimento especulativo contra a nossa moeda, o real, a partir do mercado futuro de dólares.
A partir de junho deste ano, o governo retirou as barreiras normativas e tributárias de maior impacto na contenção do ingresso de capitais externos supostamente de caráter especulativo. Em realidade o fez tardiamente, visto que já havia sinais consistentes de decréscimo de fluxo cambial para o país e o melhor momento havia passado, já que se acentuavam os rumores de que o FED poderia iniciar o desmonte do seu programa de incentivo monetário, focando a reativação da economia americana e isto criava perspectivas de queda da liquidez no mercado internacional.
A partir de então, passou a ocorrer melhora dos fluxos de capitais para renda variável e renda fixa. Bancos de grande porte, gestores destes recursos, declararam à mídia que os ingressos desde junho até meados deste mês podem ter atingido US$ 50,0 Bi. Contudo, o que se observa é que este montante foi insuficiente visto que o fluxo cambial financeiro no ano até o último dia 13 está negativo em US$ 12,0 Bi.
Todavia, após testar algumas estratégias de contenção do movimento especulativo com baixo sucesso, o BC, através do estabelecimento de estratégia de oferta de liquidez programada diária a partir de 22 de agosto passado logrou neutralizar de forma eficaz a especulação, levando a ser expurgada a parcela do preço que era parte do movimento, deixando o preço da moeda americana em parâmetros compatíveis com os fundamentos predominantes na atualidade naquele momento, ou seja, entre R$ 2,25 a R$ 2,30.
Para a especulação, o BC conseguiu estabelecer estratégia eficaz, contudo, para atrair capitais em grande monta dispõe de poucos instrumentos, já que as barreiras ao ingresso de recursos já estão liberadas.
Entendemos que é oportuno o MF/BC retirar a última das barreiras, aquela imposta aos empréstimos externos, limitados a 1 ano para isenção de IOF de 6%, passando outra vez para 90 dias. O quadro presente recomenda mais esta liberação focando melhora de fluxo.
O ponto que restou foi a Selic em processo de elevação para conter as pressões inflacionárias, que na margem atrai investidores especuladores para a realização de arbitragens e rápidas investidas em renda variável.
Como o FED americano postergou a decisão de iniciar o desmonte do programa de incentivo monetário houve uma melhora quanto à perspectiva de fluxos de recursos externos especulativos para o país, levando a moeda americana a situar-se num patamar de flutuação de preço mais baixo, R$ 2,20 a R$ 2,25
Esta nova perspectiva vem ganhando força na medida em que representantes de FED´s regionais americanos têm sinalizado, que os Estados Unidos ainda não estão em condições de prescindir do programa de incentivo monetário, o que coloca a possibilidade de maiorlongevidade da vigência do mesmo.
É crescente a avaliação de que o início do desmonte do programa agora possa comprometer os avanços conquistados na atividade econômica americana, e mais, comprometer os objetivos ainda a serem consolidados que passam pela recuperação do emprego e do investimento.
O desmonte provoca a queda do preço dos T-Bills e a elevação das taxas de juros (yelds) que acaba contaminando a economia americana, independente do FED manter a taxa básica inalterada por mais tempo.
Este novo contexto de visão sobre as perspectivas de término do programa americano de incentivo monetário gerenciado pelo FED vem criando otimismo para os países emergentes, e, naturalmente, no Brasil que está carente de expressivo volume de recursos para fechar o déficit em transações correntes este ano.
Por ora, é a perspectiva absolutamente válida, de que o fluxo de recursos para o país possa ser intensificado que impacta no preço da moeda americana no nosso mercado de câmbio, por isso, foi importantíssimo o Presidente do BC, Alexandre Tombini, reafirmar a política monetária, o que sugere nova alta da Selic e salientar que não está prevista mudança na estratégia de oferta de liquidez mínima no mercado de câmbio.
Resta, entretanto, que se confirme a perspectiva presente, que ao carrear para o país capital especulativo poderá consolidar volume de ingressos para proporcionar a complementariedade das necessidades atuais do país para fazer face ao déficit em transações correntes.
Os números divulgados ontem pelo BC relativos ao setor externo até agosto não são evidentemente confortáveis.
O país registrou nos últimos 12 meses um déficit em transações correntes da ordem de US$ 80,6 Bi, algo como 3,6% do PIB, no ano o déficit atinge US$ 58,0 Bi e no mês de agosto registrou incremento de US$ 5,5 Bi. A projeção do BC para o fechamento do ano é de US$ 75,0 Bi, porém, nos parece mais tendente a US$ 80,0 Bi.
Os IED´s atingiram nos últimos 12 meses US$ 61,1 Bi, algo como 2,76% do PIB, no ano o total de US$ 39,0 Bi e no mês de agosto US$ 3,775 Bi. O BC procedeu à revisão da sua projeção para o ano de US$ 65,0 Bi para US$ 60,0 Bi, mas a rigor poderá ficar abaixo disto.
A balança comercial que tinha projeção de saldo positivo de US$ 7,0 Bi foi revisto para US$ 2,0 Bi, mas como até a 3ª semana de setembro ainda acumula no ano saldo negativo em torno de US$ 2,2 Bi, esta revisão poderá não se confirmar e a tendência ser mais próxima de saldo “zero” este ano.
O conjunto de dados sinaliza que a NFE (necessidade de financiamento externo) para fechar o total suficiente para financiar o déficit em transações correntes é relevante, precisando mesmo que a perspectiva de melhora intensa do fluxo cambial financeiro para o país melhore intensamente.
A rigor, friamente considerados, os números das nossas contas externas sugerem o preço da moeda americana em alta, contudo, a perspectiva de que possamos ter fluxo intenso de capitais especulativos externos atenua e mantém a taxa deprimida em torno do piso de R$ 2,20.
O país está frente a um grande desafio, caso contrário poderá ter que utilizar suas reservas cambiais e, naturalmente, repercussões no preço da moeda americana.
Por enquanto, estamos otimistas e confiantes na perspectiva presente de melhora do fluxo.