Independente do que você faça profissionalmente, tenho certeza que já viu ou ouviu falar que o dólar caiu bastante recentemente. Para se ter uma ideia, saímos do patamar de dólar em R$ 5,60 em janeiro deste ano, para R$ 4,70, no momento em que escrevo essa coluna (8 de abril).
Ou seja, nossa moeda valorizou 17% no ano, nos colocando no pódio de melhor moeda emergente do ano. Mas, o que está levando a essa queda do dólar? Ou melhor, a valorização do real? Como sempre, em economia, nunca há apenas uma explicação. Por isso, abordo aqui os principais pontos:
1. A alta do preço de commodities
Commodities se referem aos materiais básicos, produzidos ao redor do mundo, e negociados internacionalmente com base na oferta e demanda. Ou seja, quanto maior / menor a oferta, menor / maior o preço; quanto maior / menor a demanda, maior / menor o preço. Bens agrícolas e minerais, como milho, trigo, petróleo e alumínio, são exemplos de commodities.
O que acontece é que o preço desses materiais básicos já vinha em alta desde meados da pandemia de Covid-19, impulsionados por estímulos monetários e fiscais de governos para conter os efeitos das medidas de isolamento social na economia. Em outras palavras, o crédito barato e os auxílios recebidos por famílias ao redor do mundo puxaram a demanda por bens básicos, como alimentos e bens de consumo, além do que todos passaram a consumir mais bens do que serviços.
Porém, com tudo fechado, a oferta de muitos produtos não acompanhou, levando o preço de tudo a começar a subir.
Conforme avançamos na vacinação, a normalização das economias do mundo passou a puxar ainda mais a demanda por insumos para produção. Mas, a oferta desses insumos ainda estava baixa, e não acompanhou o aumento da demanda. Resultado? O preço subiu mais um pouco.
Foi aí que a eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia colocou mais lenha na fogueira inflacionária, ao envolver dois grandes produtores de commodities agrícolas, minerais e fertilizantes. Com a guerra impossibilitando transporte e plantio, e as sanções econômicas impedindo grande parte da exportação russa, a oferta desses insumos caiu. Resultado? O preço subiu mais.
2. O real e sua ligação com commodities
Agora, você pode estar se perguntando: o que o preço dessas commodities tem a ver com o valor do real? Muito! Pois o Brasil produz e exporta ao mundo uma grande variedade de commodities. Por serem negociadas internacionalmente, em dólar, quanto maior o preço delas, maior a entrada de dólares no Brasil.
E, assim como tudo em economia, quanto maior a oferta, menor o preço. Ou seja, de maneira simplificada, quanto maior a entrada de dólares, e assim a oferta, menor o preço da moeda americana em reais – o famoso "o dólar caiu”.
Nesse cenário, também passamos a atrair capital estrangeiro para nossa bolsa. Afinal, grande parte das empresas produtoras e exportadoras de tais commodities tem seu capital aberto, listado na B3 (SA:B3SA3). Assim, investidores antecipam um melhor resultado adiante, aumentando a posição no Brasil – e como vimos, quanto mais dólar entrando, menos ele “custa”.
3. A alta de juros a “agradecer”
Além de toda a dinâmica de commodities em alta, a elevação da nossa taxa básica de juros também vem tendo papel substancial na recente valorização do real.
Isso ocorre por conta de um fenômeno que chamamos de “diferencial de juros”. Ele se refere à diferença entre os juros pagos aqui, e os juros pagos no restante do mundo, especialmente nos Estados Unidos – “donos” do dólar, e dos ativos considerados de menor risco.
Quanto maior as taxas de juros encontradas em ativos por aqui, maior a atratividade de nossos ativos financeiros (como títulos públicos, privados e ações). Assim, com a nossa taxa básica de juros no patamar de 11,75% ao ano, enquanto o restante do mundo começa a caminhar na elevação de juros, acabamos nos tornando uma boa alternativa para investidores em busca de retornos.
4. “Saldão Brasil” e do movimento de rotação nos mercados
Finalmente, vale destacar dois últimos movimentos que também têm contribuído para o fluxo estrangeiro para cá, e assim, à queda do dólar.
Primeiro: os ativos baratos. Diante da elevada incerteza política e fiscal que vimos ao longo do ano passado (governo aumentando gastos, investidores com medo de serem pagos com moeda sem valor no futuro), além de inflação alta, os ativos brasileiros acabaram perdendo muito valor de mercado. As ações da bolsa caíram, nossa moeda despencou. Virou, praticamente, “saldão Brasil”!
O Ibovespa, para se ter uma ideia, se encontra no maior patamar de desconto dos últimos 15 anos em relação à Bolsa americana. Assim, para parte dos investidores estrangeiros, os preços baixos passam a compensar o risco de se investir por aqui, mesmo com os mesmos desafios domésticos observados no ano passado.
Segundo: os juros subindo nos EUA. Com o movimento de alta de juros iniciado pelo Banco Central americano (o FED), investidores procuram empresas que sofram menos com o encarecimento do crédito e dos juros de longo prazo. Além disso, com as economias retomando, empresas ligadas ao ciclo econômico voltam a se tornar atrativas. Resultado? Setores como commodities e bancos se beneficiam. E quem tem essas empresas “a rodo” listadas na bolsa? O Brasil.
E agora, encher o bolso de dólar?
Diante de tudo isso, o que fazer? Encher o bolso de dólar? Se você tiver planos concretos de viajar para o exterior, ou comprar alguma coisa em dólar, sim – esse pode ser um bom momento para comprar dólares. Mas vale lembrar que o ideal é fazer essa compra aos poucos, diversificando os riscos da volatilidade da taxa de câmbio.
Por outro lado, caso você não tenha esses planos, o melhor é aproveitar para diversificar sua carteira de investimentos em dólar, não no dólar. Ativos dolarizados, como BDRs (ações americanas negociadas no Brasil) e fundos internacionais, servirão como importantes porto seguros e equilíbrio para seus investimentos.
Aproveito a deixa para finalizar por aqui, antes que me perguntem: para onde vai o dólar?