Em 2025, o mundo sentiu o peso do novo tarifaço de Trump. Com tarifas de importação elevadas — uma base de 10% para a maior parte dos países e percentuais ainda mais altos direcionados a grandes exportadores — a ordem econômica global mudou rapidamente. E, em meio a esse ambiente de incertezas, o setor de pagamentos brasileiro voltou ao centro do debate.
O avanço do protecionismo nos Estados Unidos mudou as rotas de comércio e investimentos globais. Para o Brasil, embora o impacto direto das novas tarifas possa ser menor do que para economias como China e União Europeia, a onda de efeitos indiretos chegou rápido: instabilidade cambial, dólar valorizado e inflação em alta. Fintechs, bancos emissores e adquirentes, especialmente aqueles que dependem de funding internacional ou operam no limite das margens, sentiram o impacto e se depararam com juros elevados e volatilidade cambial.
O dinheiro mais caro freou tanto as tradicionais operações parceladas no Brasil quanto o modelo “buy now, pay later”, que vinha crescendo entre e-commerces e marketplaces. Nessa nova configuração, administrar pagamentos se tornou um desafio ainda maior para as empresas. Da grande corporação ao pequeno negócio, há uma pressão constante por soluções financeiras mais ágeis e resilientes. Diante deste contexto, está posto um novo desafio: como inovar e prosperar em um ambiente mais incerto e competitivo.
Uma mudança de comportamento – na ponta e na retaguarda
O avanço do Pix é um retrato desse novo cenário: o que se observa nos relatórios do Banco Central e em análises de mercado é que o Pix já vinha em trajetória de forte expansão devido à sua praticidade, custo zero para pessoas físicas e ampla aceitação. Alguns economistas e analistas de mercado sugerem que, em períodos de juros altos e dólar valorizado, consumidores e empresas tendem a buscar meios de pagamento mais baratos e instantâneos a fim de evitar custos adicionais de crédito e tarifas bancárias.
Com isso, consumidores e empresas migraram quase que naturalmente para soluções mais rápidas, seguras e acessíveis. Não é à toa que essa forma de pagamento já deixou para trás os cartões em número de transações: só em março de 2025, as transações via Pix superaram R$ 2 trilhões, movimentando cifras recordes mês após mês — um movimento que mostra como somos rápidos para adotar o novo quando ele realmente entrega valor.
Por outro lado, sentimos na pele e no caixa das empresas as consequências da alta do dólar. Empresas que dependem de tecnologia importada, APIs globais ou serviços hospedados fora do país viram seus custos operacionais subirem até 25% por conta da valorização do dólar. Olhando para outra ponta, o encarecimento das importações obrigou muitos negócios a repensarem suas estratégias. Empresas de tecnologia e e-commerces, que antes dependiam fortemente de fornecedores internacionais, passaram a olhar para dentro, priorizando parceiros nacionais e investindo em centros de distribuição locais. Ou seja, o efeito foi imediato: produtos importados, como eletrônicos e vestuário, que ficaram mais caros, acelerou uma mudança no comportamento de compra dos brasileiros, que agora buscam, cada vez mais, abastecer suas necessidades com o que é produzido aqui.
Essa reconfiguração das cadeias de suprimento refletiu diretamente no e-commerce. Para seguir competitivas, as empresas investiram fortemente em soluções digitais para garantir agilidade e eficiência desde o pagamento até a entrega final — e os consumidores responderam, aderindo a métodos instantâneos como o Pix e priorizando marcas com operações nacionais sólidas.
Essas transformações mostram, mais uma vez, a força do ecossistema brasileiro de pagamentos: dinâmico, resiliente e ágil. Quando surgem desafios, o mercado responde com inovação.
Porém, o impacto dessa reconfiguração não foi homogêneo: diferentes players do setor de pagamentos e comércio eletrônico sentiram os efeitos de formas distintas. Para os bancos emissores, o momento, por exemplo, é de maior cautela. Com o apetite por crédito em queda e o risco de inadimplência em alta, houve necessidade de ampliar as provisões e ser mais criterioso na concessão de crédito. A situação se deve, sobretudo, pela fuga de capital para mercados considerados "mais seguros", como os Estados Unidos, o que encareceu o custo de captação.
No caso de fintechs e adquirentes, o cenário também impôs desafios. A valorização do dólar impactou diretamente as operações, principalmente daquelas que cresceram baseadas em capital internacional. O valor da moeda americana elevou os custos de tecnologia e estoque, pressionando as margens já reduzidas.
Por sua vez, comerciantes e e-commerces enfrentaram uma pressão dupla: de um lado, o repasse dos custos de importação ao consumidor final; de outro, o aumento das despesas operacionais. Segmentos como eletrônicos, moda e brinquedos sentiram uma retração nas vendas, impulsionando a busca por soluções alternativas, como o investimento em centros de distribuição locais e o ajuste do mix de produtos, com foco maior em fornecedores nacionais.
Por fim, para o consumidor final, o resultado foi menos crédito disponível, produtos importados mais caros e maior adoção de meios de pagamento instantâneos e “low cost”.
Caminhos para o futuro
O tarifaço de Trump não representa apenas uma mudança pontual: ele forçou o setor brasileiro de pagamentos a se reinventar. E, se por um lado há aumento de custos e volatilidade, por outro existe espaço para movimentos inovadores e resilientes, tais como:
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Máxima eficiência operacional: Automatização de processos, redução de custos internos e revisão de parcerias tecnológicas podem liberar margem em tempos de pressão nos lucros.
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Constante diversificação de receitas: Empresas de pagamentos não podem mais depender exclusivamente de tarifas por transação ou funding externo barato. Oferecer serviços integrados, como crédito, gestão financeira, cashback e analytics) é fator de sobrevivência.
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Foco em experiência e segurança: O consumidor busca eficiência, controle e baixo custo. Portanto, soluções que combinem usabilidade, instantaneidade (como o Pix) e segurança têm mais chances de ganhar espaço.
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Adaptação ao novo mix de pagamentos: Se o boleto já era um clássico nacional, agora o Pix é a regra. Empresas ágeis e flexíveis, aquelas que rapidamente integram novos meios, ajustam planos e exploram cada brecha do ambiente regulatório estarão à frente.
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Visão global, execução local: Com cadeias de suprimento em transformação e tarifas elevadas, a produção e o fulfillment locais ganham atratividade. Investir em logística, tecnologia nacional e parcerias regionais é estratégico.
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Inovação sem medo: Mesmo em cenários adversos, quem arrisca, experimenta e pivota tem espaço. O futuro do setor de pagamentos no Brasil é daqueles que não se acomodam.
Portanto, se o tarifaço de Trump desencadeou desafios inéditos para o setor de pagamentos brasileiro, do crédito restrito à mudança de comportamento dos consumidores, passando pela disrupção das cadeias de suprimento, por outro, favoreceu uma arena fértil para a transformação. Para as empresas que aprendem agir com coragem, criatividade e muita agilidade, na próxima curva podem se sobressair, já que passam a entender que inovação, eficiência e experiência do cliente serão os pilares do novo ciclo.