Realmente, vivemos tempos muito estranhos. As reformas estruturais, essenciais para a governabilidade do País, para uma economia mais organizada, com trajetória mais sustentável da dívida pública no longo prazo, ambiente mais “saudável” de negócios, continuam a ser objeto de muita polêmica e intensos embates no Congresso e na sociedade. Muitos acham que a proximidade das eleições tende a atrapalhar, já que pelo lado da Reforma da Previdência, por exemplo, medidas duras precisam ser adotadas. Medidas estas que, dificilmente, devem ser aprovadas na sua totalidade. É consenso no mercado que se 70% a 80% dos projetos originais forem aprovados, já será um ganho (depois da semana passada, não devem passar de 50%). Teremos então as reformas possíveis diante das circunstâncias.
Nesta semana que passou foi divulgada uma pesquisa do grupo Estado, mostrando um placar extremamente ruim para o governo: 271 votos contrários contra 97 favoráveis à PEC da Reforma da Previdência. Lembremos que são necessários 308 votos para uma PEC ser aprovada na Câmara. Há algumas semanas atrás a votação da Lei de Terceirização, apertada em 231 favoráveis a 188 contrários, já havia mostrando que a base de apoio do governo não era tão firme como parecia. No cronograma das votações comenta-se que o presidente da Câmara deve votar o projeto no início de maio, sendo aprovado em plenário da Câmara, para depois ir a votação no Senado. Ou seja, ao fim esta PEC seria aprovada lá para junho. Será possível? Diante dos imbróglios da semana passada, já seria um lucro. A Consultoria MCM, por exemplo, acredita que a reforma deve ser aprovada ao fim do terceiro trimestre.
Frustração de expectativas. O fato é que se esta reforma não passar nos seus principais pontos pode esquecer a retomada da economia, pois o quadro fiscal acabará piorando, as expectativas se deteriorando e não será fácil enxergar o futuro. A PEC do Teto acabará inviabilizada já que as despesas devem manter uma trajetória descontrolada de alta (na média acima de 6% reais), por boa parte delas (54%) oriunda do pagamento de benefícios. Sendo assim, delimitar as despesas à inflação em 12 meses anterior será algo complicado, ainda mais neste cenário de frustração de expectativas.
Sobre alguns pontos negociados. Tentar sair do impasse, Temer chegou a listar cinco pontos em negociação. Um dos mais sensíveis diz respeito à discussão sobre as regras de transição para quem terá que ingressar neste novo modelo, antes definidas em até 50 anos para homens e 45 para mulheres. Não existe consenso sobre isso, pois podem haver casos de homens se aposentando aos 51,5 anos, por ter cumprido o tempo de contribuição de 16 a 50 anos ou então, nos atingidos pela medida, com 49 anos, só se aposentando aos 65 anos. Estudos indicam também que a chamada “bomba demográfica”, o aumento da expectativa de vida no País, em 1998 em 68 anos e hoje em torno de 75,5 anos, é um dos principais fatores a impactar na Previdência (dentre tantos). Pela idade mínima, se as pessoas se aposentam com 65 anos, os homens podem ir até 82 anos e as mulheres até 85, numa média em torno de 18,4 anos de vida adicional depois de aposentados.
Somando aos outros pontos (transição para idade mínima, aposentadorias rurais, benefícios de prestação continuada, fim dos regimes especiais para policiais e professores) haveria uma perda de 17%, R$ 115,3 bilhões, pelas projeções de dez anos, entre 2018 e 2027, nos efeitos econômicos positivos desta reforma. Projeções iniciais indicavam uma economia no período de R$ 678 bilhões, devendo cair agora a R$ 563 bilhões. A situação das contas da Previdência, no entanto, segue delicada. Em fevereiro, nos 12 meses, para um déficit primário de R$ 147,4 bilhões (2,34% do PIB), o da Previdência chegou a R$ 157,9 bilhões (2,50% do PIB) e a tendência neste ano é de chegar a R$ 200 bilhões, depois de fechar em R$ 140 bilhões no ano passado.
Reformas duras, porém necessárias. Devemos ressaltar, no entanto, que estas reformas não são populares. Como aprová-las então nas vésperas de uma eleição complicada em 2018? Já pensando nisso, e de forma oportunista, Renan Calheiros se posicionou contrário à Reforma por estes dias, achando-a “nociva para o povo e o Nordeste”. Seu “cálculo político” foi se aproximar de Lula da Silva, no seu populismo, com crescente apoio nos grotões da região. Isso dá, portanto, a exata noção do que será o trâmite das reformas. Não será nada fácil aprová-las neste ano. Ainda temos na agenda a Trabalhista e a Tributária, talvez sendo “preparada” para o próximo presidente.
Reformas e ganhos de produtividade. Estudos indicam que são inegáveis os benefícios das reformas para o aumento da produtividade na economia. Um estudo do FMI, de novembro de 2016, dos autores Duval e Furceri, “Os efeitos das reformas nos mercados”, concluiu quatro interessantes fatos:
1) As reformas melhoram o ambiente de negócios, atraem investimentos e costumam aumentar a produtividade e aumentar o nível de emprego. A desregulamentação do processo produtivo aumenta 1,5% do PIB em cinco anos.
2) As reformas precisam de prazo para se tornar realidade. Seus resultados só são visíveis em três anos.
3) As reformas trabalhistas, por exemplo, ao contrário das outras, dependem do ciclo econômico. Podem impactar na retomada ou não, o que exige certa cautela.
4) As reformas e as políticas macro precisam ser complementares. Quando as políticas são expansivas aceleram os resultados das reformas, o que mostra a importâncias destas para desanuviar o ambiente e estimular a retomada da economia.
Deste estudo, e observando o momento atual da economia brasileira, não resta dúvida sobre a importância da agenda de reformas para a virada da economia do País por estes anos. Alguns custos podem ocorrer no curto prazo, mas no longo os ganhos tendem a ser duradouros e se impor. Sem dúvida. Lembremos que esta agenda se manteve engavetada por mais de 13 anos, em todo o ciclo lulo-petista. A Europa passou pela crise de esgotamento de um modelo, do Welfare State e está aos poucos tentando se moldar, tornar os seus mercados mais eficientes. O Brasil, não pode, como sempre, se manter na contramão e rabeira do mundo.