O que seria de nós sem Sharpe? Muitos profissionais do mercado de capitais responderiam a essa pergunta com um assertivo "nada". Essa resposta reflete a imensa importância da contribuição de Sharpe à maneira como investimos.
Como abordado em nosso último artigo, Markowitz foi laureado com o Prêmio Nobel por elucidar a importância de não colocar todos os ovos na mesma cesta. Sharpe, por sua vez, também recebeu o Nobel, mas por ir além na quantificação do risco.
Referimo-nos à concepção do renomado Modelo de Precificação de Ativos de Capital, ou "CAPM", sigla em inglês.
CAPM
Para Markowitz, o portfólio perfeito era aquele que combinava todos os ativos adquiridos ou negociados no mercado. Com base nisso, Sharpe ponderou: se o único portfólio de risco que existe é o portfólio de mercado, então podemos determinar o preço e o retorno de cada ativo no mercado de capitais. Daí surge o nome do seu modelo.
Mas por que isso é a base para o investimento passivo ou o chamado "investimento em Beta"? Sharpe mostrou que os investidores estão dispostos a assumir riscos em busca de retornos, contanto que esses riscos não sejam mitigados pela diversificação. No CAPM, o preço pago por uma ação específica não se baseia apenas na sua relação “risco x retorno”, mas na sua relação com um portfólio diversificado.
Sharpe foi além de Markowitz ao postular que não é mais essencial buscar um investimento ativo que explore várias combinações na tentativa de acertar na diversificação. Ele democratizou o processo de investimento, demonstrando que é viável obter retornos significativos mesmo sem profundo conhecimento técnico sobre o mercado, como por meio de um portfólio passivo ou ETFs (fundos de índices).
Logo, para um investidor com um portfólio diversificado, o único indicador de risco que importa é o “Beta” (risco sistemático ou risco de mercado). Sharpe percebeu que, quanto maior a sensibilidade do retorno de uma ação em relação ao mercado, maior deve ser o retorno esperado.
Na prática
Se é possível comprar um ETF, como o BOVA11 (BVMF:BOVA11), que replica o Ibovespa, por que adquirir uma ação específica? Existe mais de uma resposta para isso. Mas o ponto crucial é que deve haver uma razão fundamentada para optar por uma ação em particular. Na década de 60, o CAPM foi introduzido para explicar a origem dos retornos das ações.
De acordo com Sharpe, ao investir em renda fixa, busca-se um retorno próximo ao CDI. Já ao investir no Ibovespa por meio de um ETF, o retorno almejado é o CDI mais um prêmio de risco. Essa equação é a seguinte:
CDI + Prêmio de Risco (sendo este prêmio o retorno que justifica o risco - no caso, o retorno do Ibovespa acima do CDI).
Portanto, ao adquirir uma ação específica, também se espera um retorno superior ao CDI, mas a dinâmica muda, pois o investimento é ativo. Como vimos, na renda fixa, o retorno que você espera é próximo ao CDI. Agora, quando você decide investir em ações, você está assumindo um risco adicional em comparação a esse investimento que é muito seguro. Esse risco extra é representado pelo “Beta”, número que indica quão sensível uma ação é em relação às oscilações do mercado como um todo (como o Ibovespa).
Se o Beta é 1, significa que a ação se move exatamente com o mercado (lembra da coleção que estudamos no artigo anterior?); acima de 1, ela é mais volátil; e abaixo de 1, é menos volátil. O Prêmio de Risco, por sua vez, representa o retorno adicional que se espera receber por assumir esse risco adicional de investir em ações ao invés do CDI. Nesse contexto, a conta é:
CDI + Beta x Prêmio de Risco (o risco do mercado de ações, como o Ibovespa).
A ideia é ajustar o Prêmio de Risco com base na volatilidade (ou risco) da ação específica em relação ao mercado. Se o Beta é igual a 1, então a ação tem a mesma volatilidade que o mercado e o Prêmio de Risco não é ajustado, ou seja, a ação tem exatamente o mesmo Prêmio de Risco que o mercado. Se Beta é maior que 1, a ação é mais volátil que o mercado, caso em que multiplicar o Prêmio de Risco pelo Beta irá aumentar o Prêmio de Risco para essa ação, refletindo o risco adicional que ela carrega.
Assim, multiplicar o Beta pelo Prêmio de Risco nos dá o Prêmio de Risco ajustado para um ativo específico com base em sua volatilidade relativa ao mercado. Isso nos permite estimar qual retorno adicional podemos esperar desse ativo em relação ao retorno de um ativo sem risco, considerando o seu risco específico.
Cada ação tem seu risco inerente. Por exemplo, o risco de uma startup educacional tecnológica difere do risco de um banco consolidado. Na prática, o risco de uma ação como TRAD3 é distinto do risco de ITUB4 (BVMF:ITUB4). Se o CDI for 13%, o Beta for 5 e o Prêmio de Risco for 2, o retorno esperado da ação é 23%. Mas o real retorno pode ser ainda maior. Benjamin Graham, no livro "O Investidor Inteligente", explica que isso ocorre porque o valor intrínseco de uma empresa nem sempre é refletido em seu preço de mercado.
Em resumo, temos duas lições. Primeiro, deve-se sempre esperar um retorno ao assumir riscos, excluindo-se os riscos diversificáveis. Segundo, é imprudente assumir riscos sem perspectiva de retorno; por isso, a diversificação e a minimização de custos são essenciais. A primeira ideia é a base dos investimentos ativos, enquanto a segunda se refere aos investimentos passivos ou em Beta. Qual abordagem é a melhor? O ditado resume bem: “Se você não pode vencer o mercado, junte-se a ele”.