Por José Roberto Gomes
SÃO PAULO (Reuters) - O preço do etanol nas usinas brasileiras tende a ceder a partir desta semana, diante de um avanço na moagem de cana no centro-sul do país, mas as cotações da gasolina ainda em patamares firmes devem atenuar qualquer recuo do biocombustível, segundo especialistas.
Os valores do renovável geralmente caem na virada de março para abril, conforme usinas dão início a uma nova safra de cana e impulsionam a fabricação do produto, inclusive para gerarem caixa com maior velocidade. Na atual temporada 2019/20, contudo, esse movimento ficou longe de ocorrer.
No acumulado de abril, o preço do hidratado nas usinas de São Paulo, Estado de referência nacional, acumula alta de 21,5 por cento, enquanto o anidro apresenta incremento de 14,4 por cento, conforme monitoramento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP.
Os preços médios do etanol hidratado, concorrente da gasolina, estão próximos de 2 reais por litro nas usinas paulistas, nos maiores níveis já registrados em termos nominais (sem considerar a inflação), segundo dados do Cepea.
No ano passado, as cotações do álcool começaram a cair em meados de março e estavam, nesta mesma época, abaixo de 1,50 real por litro, no caso do hidratado, e na faixa do 1,60 real, em relação ao anidro.
"É totalmente atípico o que está acontecendo, com uma conjunção de atraso de safra e uma chuva que veio justamente na hora em que estava começando (a colheita)... Mas acho que agora não sobe mais... A tendência agora nas usinas é cair, e na bomba também", avaliou o diretor da comercializadora Bioagência, Tarcilo Rodrigues.
O analista Matheus Costa, da INTL FCStone, comentou que o movimento de redução nos preços do etanol já teve início e tende a se acentuar.
Segundo ele, a moagem de cana deve aumentar nesta e nas próximas semanas, até porque mais unidades entrariam em operação. "A safra tende a engatar. As indicações são de que os preços já começaram a ceder", afirmou.
A primeira metade de abril foi consideravelmente chuvosa no centro-sul do Brasil, limitando as operações das usinas.
Analistas ouvidos pela S&P Global Platts calculam uma perda de 4,2 dias de moagem por causa das precipitações, resultando em produção de 823 milhões de litros de etanol no período, versus quase 1 bilhão um ano antes.
Mas recentemente a situação melhorou para que as colhedoras possam acessar os canaviais. O Agriculture Weather Dashboard (AWD), do Refinitiv Eikon, aponta que nos últimos sete dias as precipitações ficaram aquém do normal em praticamente todo o centro-sul.
Nas próximas duas semanas, contudo, a tendência é de chuvas dentro ou acima da média em boa parte das áreas produtoras, ainda segundo o AWD.
Os dados oficiais da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica) sobre a moagem de cana e produção de açúcar e etanol no centro-sul na primeira metade do mês ainda não foram divulgados.
SUSTENTO DA GASOLINA
A perspectiva de recuo nos preços do etanol a partir de agora não significa, porém, que a queda será grande, mesmo com as usinas alocando boa parcela de cana para o biocombustível.
Isso porque a gasolina, concorrente direto do renovável, segue firme nas refinarias da Petrobras (SA:PETR4), com viés de alta, em meio a preços do petróleo em máximas de cerca de seis meses.
"A gasolina está na contramão, tem o reajuste que ainda não foi repassado totalmente à bomba e a defasagem com o mercado internacional", destacou Rodrigues, da comercializadora Bioagência, estimando preços do etanol 5 por cento mais altos nesta safra, em média, ante a passada.
Nesta terça-feira, a petroleira estatal anunciou um reajuste de cerca de 2 por cento no valor da gasolina nas refinarias, após alta de 5,6 por cento no começo do mês. O valor médio praticado pela companhia é o maior desde o fim de outubro.
Com o concorrente em níveis mais altos, a expectativa é de que o preço do etanol recue menos no ciclo 2019/20, afirmou Costa, da INTL FCStone.
"As indicações são de que se tem realmente uma sustentação (na gasolina). Então, talvez, o piso (do etanol) na safra não seja tão baixo quanto em anos anteriores. Há espaço para que o etanol caia menos", explicou.