Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - Uma deterioração adicional das expectativas de mercado para a inflação à frente pode levar a um prolongamento do ciclo de aperto dos juros básicos implementado pelo Banco Central, mostrou a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).
No documento, divulgado nesta terça-feira, o BC também reforçou a defesa da adoção de medidas fiscais pelo governo, argumentando que ações nesse sentido podem induzir o crescimento econômico.
As expectativas de mercado para os preços à frente seguem desancoradas, com a previsão para o IPCA de 2025 na pesquisa Focus passando de 3,95% na reunião do Copom de setembro para 4,03% na semana passada, antes da decisão de política monetária. A previsão novamente piorou nesta semana, para 4,10%, bem acima da meta central estabelecida, de 3% neste e nos próximos anos.
"A desancoragem das expectativas de inflação é um fator de desconforto comum a todos os membros do Comitê", disse o BC na ata. "Uma deterioração adicional das expectativas pode levar a um prolongamento do ciclo de aperto de política monetária."
Na última quarta-feira, o Copom decidiu acelerar o ritmo de aperto nos juros ao elevar a taxa Selic em 0,50 ponto percentual, a 11,25% ao ano, em decisão unânime de sua diretoria que não indicou os próximos passos da política monetária.
Na ata, o BC manteve o argumento usado em setembro de que, por conta de incertezas, o Comitê preferiu uma comunicação que reforça a importância do acompanhamento dos cenários ao longo do tempo, sem dar indicação futura, "insistindo no seu firme compromisso de convergência da inflação à meta".
De acordo com o documento, foi considerado adequado acelerar o ritmo de aumento na Selic neste mês por conta da necessidade de uma política monetária mais contracionista, em meio a um cenário com resiliência da atividade, mercado de trabalho apertado e piora nas projeções e expectativas para a inflação.
"Um aumento de 0,50 ponto percentual se mostra apropriado diante das condições econômicas correntes e das incertezas prospectivas, refletindo o compromisso de convergência da inflação à meta, essencial para a construção contínua de credibilidade", afirmou.
A autarquia disse que não se pode concluir que há uma inflexão no mercado de trabalho ou no ritmo de crescimento do país a partir de recentes sinais "incipientes" de moderação, como indicadores de comércio e de rendimentos. Para o BC, não se observa alteração relevante no cenário de crescimento prospectivo em relação à reunião anterior.
DISCIPLINA FISCAL
Em meio à espera por um anúncio de medidas de controle de despesas públicas prometidas pelo governo para sustentar o arcabouço fiscal e melhorar a trajetória da dívida pública, o BC defendeu a "necessidade da sustentabilidade das regras fiscais".
"O esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária", disse o BC.
Ao enfatizar o desafio de estabilizar a dívida pública do país, a autarquia avaliou que a redução de crescimento dos gastos públicos, principalmente de forma mais estrutural, pode "ser indutor de crescimento econômico no médio prazo por meio de seu impacto nas condições financeiras, no prêmio de risco e na melhor alocação de recursos".
Em relação à evolução dos preços, a ata afirmou que o cenário de curto prazo para a inflação se mostra mais desafiador, com a estiagem deste ano elevando preços de alimentos, além de uma inflação de serviços incompatível com a meta e uma indicação de reajustes maiores em bens industriais diante do movimento recente do câmbio.
"Tem-se observado uma interrupção no processo desinflacionário, refletindo a redução de força dos diversos fatores que vinham contribuindo para a desinflação", afirmou o BC, citando também a depreciação cambial como componente que torna mais desafiadora a convergência da inflação à meta.
Sobre o cenário externo, o BC eliminou a referência feita na ata de setembro a um ambiente que se mostrava "mais benigno", afirmando que ele se mantém desafiador, com incertezas econômicas e geopolíticas relevantes.
Sem fazer menção específica à eleição de Donald Trump para presidir os Estados Unidos a partir de 2025, a ata se referiu indiretamente a promessas do político republicano ao afirmar que a chance de mudanças na política econômica norte-americana "traz adicional incerteza ao cenário, particularmente com possíveis estímulos fiscais, restrições na oferta de trabalho e introdução de tarifas à importação".
O documento ainda apontou ter debatido a desaceleração da economia chinesa, avaliando que respostas fiscais e monetárias recentemente anunciadas pelo país podem trazer suporte ao crescimento de curto prazo, mas permanecem desafios de médio prazo.