Por Flavia Bohone
SÃO PAULO (Reuters) - A recente queda do dólar em relação ao real deve levar a projeções menores de inflação nos modelos usados pelo Banco Central, mas isso não será suficiente para fazer a autoridade monetária mudar o tom em seu relatório trimestral de inflação e sinalizar que um corte de juros está próximo.
A instabilidade política que vem influenciando os mercados financeiros nas últimas semanas ainda é tida como fator de risco que poderia voltar a elevar o dólar, o que acarretaria em novas pressões para a inflação.
Diante disso, analistas consultados pelas Reuters acreditam que a cautela deve prevalecer no relatório de inflação, que será divulgado até o fim do mês, ainda sem data definida.
"Reduziu por ora um elemento de risco, mas não acho que cabe ao BC tomar esse patamar agora como aviso de que o risco inflacionário foi embora", disse a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif.
O desempenho do câmbio tem sido fortemente atrelado aos desdobramentos políticos e o dólar vem caindo conforme aumentam as chances de a presidente Dilma Rousseff ser destituída do cargo em breve.
A percepção geral no mercado é de que uma mudança de governo abriria caminho para a melhora da economia. Apenas em março, o dólar (BRBY) acumulou queda de 10,06 por cento até dia 22.
"Se o governo continua, o que acontece com o dólar? Não dá para afirmar nada agora... A prudência recomenda que (o BC) não saia tomando decisão com base em acontecimentos de um mês", disse o professor de economia da Insper João Luiz Mascolo.
Além das incertezas que persistem no cenário, economistas destacaram a credibilidade arranhada do BC. Em janeiro, após semanas sinalizando que poderia aumentar os juros, Tombini fez um comunicado inesperado no primeiro dia de reunião de política monetária mudando o tom para sinalizar a manutenção dos juros. [nL2N1530HJ]
O dado mais recente de inflação, que mostrou o IPCA-15 acumulado em 12 meses abaixo de 10 por cento pela primeira vez desde outubro, traz algum alívio, mas ainda é pouco para produzir mudanças significativas nas projeções de alta de preços. [nL2N16V0IV]
EXPECTATIVAS DESANCORADAS
A mais recente pesquisa Focus do BC mostra o IPCA fechando este ano com alta de 7,43 por cento, acima do teto da meta, de 4,5 por cento com margem de tolerância de 2 pontos percentuais. Já para 2017, a expectativa aponta inflação de 6 por cento, no teto do limite de tolerância da meta, que segue em 4,5 por cento, mas com margem de 1,5 ponto percentual. [nEMNG3J0RY]
"O dólar caindo tem impacto razoável dentro dos modelos do BC e nos preços... Mas o BC não vai dar nenhum sinal neste momento de redução de taxa de juros porque ainda tem que ancorar as expectativas futuras (para o centro da meta)", disse o chefe da divisão econômica Confederação Nacional do Comércio e ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas.
O BC tem sinalizado a manutenção de juros, o que foi reforçado na quarta-feira pelo seu presidente, Alexandre Tombini, que descartou a possibilidade de reduzir os juros básicos mesmo diante da economia fraca, citando balanço de riscos para a inflação ainda "desafiador". [nL2N16U0QA]
"Antes de sinalizar corte de juros, o BC tem que começar a mostrar convergência muito clara da inflação para a meta e ainda não vai mostrar essa convergência clara (no relatório de inflação)", disse o economista-chefe do Banco Vototrantim, Roberto Padovani.
Mas o economista acredita que "com a superação da crise política e maior confiança na gestão da política monetária será possível cortar os juros este ano". Padovani vê o primeiro corte da Selic em outubro e os juros encerrando o ano em 13,25 por cento.