Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, afirmou nesta quarta-feira que o nível de 2,25% para a Selic não é algo "escrito na pedra" e reiterou que o BC está longe de um limite a partir do qual a redução dos juros perderia eficácia, razão pela qual pode continuar a fazer política monetária como usualmente.
"Não vi esse 2,25% como algo que foi escrito na pedra, algo fixo, que temos que ter em mente e não podemos cruzar", disse ele em inglês, ao participar de evento virtual promovido pela American Chamber of Commerce.
Hoje, a Selic está em 3% ao ano e o BC já sinalizou em suas últimas comunicações um corte de até 0,75 ponto na reunião que acontece no dia 17, o que levaria os juros básicos à nova mínima histórica de 2,25%.
Kanczuk ressaltou que, na sua visão, este patamar é muito mais ligado à política monetária ótima focada no hiato do produto (ociosidade da economia) e no risco para a taxa neutra de juros, do que a um 'effective lower bound' --nível de juros abaixo do qual a política monetária perde eficácia para estimular a economia.
O diretor ponderou que o BC ainda tem o mesmo panorama para a política monetária e, para sua próxima decisão sobre os juros, atualizará seus números.
Ainda em relação à discussão do 'effective lower bound' no Brasil, ele disse que este não é o melhor nome para descrever o que aconteceria no país, uma vez que o termo sugere que, ultrapassado um determinado limite, algo muito diferente seria acionado, como mudança de direção da política monetária.
Para Kanczuk, abaixo desse limite --que é dinâmico e varia conforme as premissas levadas em conta para seu cálculo-- a Selic mais baixa ainda implicaria inflação mais alta, parte via canal do câmbio.
"A questão aqui que o Banco Central está preocupado tem mais a ver não com inflação, mas com estabilidade financeira e como depreciações muito grandes podem machucar o crescimento e especialmente as empresas que não têm um hedge perfeito", afirmou ele.
Para o próximo encontro do Comitê de Política Monetária (Copom), Kanczuk afirmou que o BC avaliará se há problema de estabilidade financeira, num momento em que mercados estão mais calmos e que o nível do dólar sobre o real tornou-se uma questão menor.
Diante do quadro, ele afirmou que o BC tem que se preocupar mais com o balanço entre o hiato do produto, com o esfriamento intenso da economia, e o risco para taxa neutra, em meio à aceleração dos gastos para enfrentamento à pandemia de Covid-19.
"Da última reunião para agora ... é justo dizer que o crescimento parece ser menor, depressão maior do que antes. Por outro lado, a expansão fiscal também parece maior do que a que tínhamos antes, a gente tem visto como os mercados têm mudado suas perspectivas de dívida sobre PIB, que têm crescido muito, isso força a taxa neutra para cima", disse.
ATUAÇÃO COM TÍTULOS PÚBLICOS
Após emenda constitucional ter sido aprovada no Congresso dando aval para o BC atuar na compra de títulos públicos e privados em meio à crise, Kanczuk avaliou que, em relação aos títulos públicos, a atuação será mais pautada pela busca do bom funcionamento do mercado, a exemplo do que o BC já faz em suas intervenções no câmbio.
"Se há mau funcionamento do mercado, preços estão malucos, talvez por conta da liquidez, e o mercado não tem capacidade de digerir essa grande porção de novos títulos que o Tesouro tem que colocar, aí o BC pode agir, mas muito cuidadosamente para não distorcer outras partes da curva de juros", disse ele.
Nesse sentido, ele destacou que a "operação twist" --em que o banco central compra títulos de longo prazo para reduzir a inclinação da curva de juros futuros-- tende a ser associada com política monetária, mas que não é isso que o BC tem em mente.
"De uma forma, é twist porque quando os mercados não estão funcionando e você vai e compra títulos de longo prazo, você diminui a duration dos títulos. Então é twist, mas o objetivo é bem diferente", frisou.
RESERVAS
Quanto ao montante de reservas internacionais detidas pelo país, o diretor de Política Econômica avaliou que o volume está "ok", e que o BC não tem o objetivo de aumentá-lo ou diminuí-lo.
Ele argumentou que as vendas de dólar à vista, que diminuem o tamanho das reservas, são feitas para melhorar a funcionalidade do mercado cambial. E acrescentou que, quando o BC lança mão dessa ferramenta, o faz em pequenas quantidades, que não são grandes o suficiente para acender um alerta em relação ao nível das reservas sobre o PIB.