SÃO PAULO (Reuters) - Os dados de atividade no Brasil até melhoraram na margem, mas ainda é cedo para afirmar que o pior já passou, e esse cenário pede afrouxamento monetário mais intenso, disse nesta terça-feira David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch para o Brasil.
O Bofa cortou nesta semana sua estimativa para a Selic ao fim deste ano para 4,75%, o que seria com folga uma nova mínima histórica para o juro básico no Brasil. A Selic está atualmente num já piso recorde de 6,50%.
Beker disse que a taxa neutra de juros --aquela que nem estimula nem restringe a economia-- está em queda no Brasil, diante do amplo hiato do produto negativo. Com tamanha ociosidade na economia, num quadro de desemprego que ainda deve permanecer elevado, o estrategista do BofA vê o IPCA de 2020 em 3,80%, 20 pontos-base abaixo do centro da meta perseguida pelo Banco Central.
Segundo Beker, esse prognóstico de inflação já considera a queda de 175 pontos-base da Selic antecipada pelo banco privado.
"O mandato do BC é colocar a inflação na meta. E as medidas de inflação, seja no índice cheio, seja nos núcleos, estão bem abaixo da meta. Isso pede política monetária mais estimulativa. A economia está precisando", afirmou o executivo.
A projeção do BofA de Selic em 4,75% ao fim do ano é a mais agressiva dentre alguns dos principais bancos. O Itaú Unibanco estima juro a 5% em dezembro, enquanto JPMorgan e Citi veem a taxa em 5,50%, a mesma mostrada pela pesquisa Focus do BC.
Pelos contratos de DI, o mercado considerava Selic média em dezembro de 5,17%.
"O nível de 4,75% para a Selic não é sustentável, então acreditamos que o caminho do juro depois de alcançar essa taxa seja de alta, mas apenas depois de 2020", afirmou Beker.
RISCO FED
O cenário do BofA de profundo corte de juros no Brasil neste ano está atrelado a reduções de taxa também nos EUA. A equipe do banco nos Estados Unidos calcula três cortes de 25 pontos-base até o fim do ano, começando pela reunião do fim deste mês.
Desde o fim da semana passada, contudo, analistas passaram a levantar dúvidas sobre a disposição do Federal Reserve em reduzir expressivamente os juros por lá.
"Se você me disser que o cenário do Fed não é de afrouxamento monetário, então claro que muda nosso 'call' aqui", disse Beker.
"A questão é que a economia dos EUA está desacelerando, e o Fed não tem problema de pressão inflacionária. O Fed vai se antecipar ao problema", acrescentou.
CÂMBIO
O BofA melhorou a previsão para a cotação do dólar ante o real ao fim do ano, de 3,80 reais para 3,70 reais. Essa taxa indica apreciação do real até dezembro, já que a taxa de câmbio operava nesta terça-feira em torno de 3,77 reais.
O alívio na projeção se deve, além do andamento mais ágil dos trâmites da reforma da Previdência, ao ambiente externo mais inclinado a juros menores, não só nos EUA, mas também na zona do euro e em outros países.
"No começo do ano, o cenário era de quatro altas de juros pelo Fed. Agora estamos discutindo quantos cortes virão. Essa virada pavimenta cenário de dólar fraco e moedas emergentes mais fortes", afirmou Beker.
Isso compensa, portanto, o efeito negativo ao câmbio decorrente da esperada queda adicional no diferencial de juros entre Brasil e EUA até o fim do ano. Quanto menor esse spread, menos estímulo o investidor externo tem para trazer recursos para aplicações na renda fixa brasileira.
"Em contrapartida, há expectativa de fluxo de concessões, IPOs, privatizações...", o que respalda a expectativa de ganhos moderados para o real, disse o estrategista do BofA.
(Por José de Castro; Edição de Isabel Versiani)