Por Iuri Dantas
SÃO PAULO (Reuters) - O Banco Central rachou as apostas em sua tentativa de sinalizar como se dará o fim do mais longo ciclo de afrouxamento monetário do país: ao mesmo tempo em que a mediana do mercado espera manutenção da taxa básica até o fim do ano, a precificação dos contratos futuros de juros embute cada vez mais um novo corte da Selic em março.
Alguns fatores explicam a divisão no mercado, segundo economistas ouvidos pela Reuters nas últimas semanas. A começar pelo longo tempo entre as duas últimas reuniões -um total de 63 dias, contra uma média de 45 dias - uma inflação surpreendentemente abaixo do esperado, e abandono da reforma da Previdência pelo governo.
Todos os economistas, porém, ressaltam que a principal influência no comportamento do mercado vem da comunicação do Banco Central, em especial o que a instituição disse logo após o corte dos juros para a mínima história de 6,75 por cento, o que informou na ata da reunião e até no silêncio em alguns momentos.
"É uma discussão de 'fine tuning'", definiu a economista do banco Santander (SA:SANB11) Tatiana Pinheiro. "Faz todo sentido a comunicação do BC ter ficado mais dúbia na ata. Estão sendo supertransparentes mesmo na dubiedade."
Após a divulgação da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), as apostas mudaram no mercado e em grandes bancos.
O Santander, que esperava o fim dos cortes passou a prever nova redução dos juros, enquanto o banco Itau estimava a Selic a 6,5 por cento, após um corte em março, mas agora aposta em manutenção.
A curva a termo de juros precificava 25 por cento de chance de um corte adicional da Selic no fim da semana da reunião do Copom. Sete dias depois, sob impacto da ata do comitê, o mercado elevou as apostas para 44 por cento. Na sexta-feira seguinte, a proporção atingiu 50 por cento, depois de bater em 60 por cento na véspera.
Segundo economistas de um grande banco nacional e de uma instituição financeira estrangeira, ouvidos pela Reuters, o BC colocou o peso de sua próxima decisão em um cenário até aquele momento incerto sobre a trajetória da inflação neste ano, por isso a divisão no mercado.
A cada índice de preços abaixo do esperado, as apostas se renovam por um novo corte nos juros. Economistas-chefe de bancos admitem que a probabilidade de corte vem crescendo, mas ao mesmo tempo mantêm seu call de interrupção da Selic a 6,75 pela comunicação do BC de que é adequado encerrar o ciclo.
"A comunicação é ótima, porque o BC queria manter a porta aberta mesmo", disse um economista que pediu para manter o sigilo. "O mercado vai tentando e forçando, com os juros, se o Banco Central silencia é uma forma de sancionar as expectativas."
O próprio BC já indicava no início do ano a necessidade de reavaliar a mensagem do fim do ano passado, diante de eventuais surpresas com a inflação. Ao cortar a Selic em fevereiro, o Copom disse considerar "neste momento, como mais adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária".
Ao mesmo tempo, porém, o BC deixou a porta aberta para mais um corte da Selic, ao dizer na ata da última reunião do Copom que sua visão "pode se alterar e levar uma flexibilização monetária adicional, caso haja mudanças na evolução do cenário básico e do balanço de riscos". Foi a senha para ajustes graduais e contínuos no mercado de juros.
O BC ainda trabalha com estimativa de inflação de 4,2 por cento neste ano, registrada em seu Relatório Trimestral de Inflação de dezembro, com uma média de 0,40 por cento no primeiro trimestre.
De lá para cá, a mediana do mercado caiu para 3,73 por cento, com base na inflação de janeiro (0,29 por cento) e na prévia de fevereiro (0,38 por cento).
"O BC entregou um ciclo de corte enorme... e desde dezembro vem navegando mares ainda desconhecidos, com a taxa de juros em sua mínima histórica", afirmou a Medley Global Advisors em comunicado a clientes. "Enquanto um outro corte de 25 pontos básicos em março ainda é possível, ainda é muito menos óbvio que o corte de fevereiro."
(Por Iuri Dantas)