Por Balazs Koranyi e Francesco Canepa
SINTRA, Portugal (Reuters) - Algumas autoridades do Banco Central Europeu (BCE) estão pedindo uma revisão das políticas agressivas de estímulo monetário que a instituição empregou por quase uma década para combater a inflação baixa, considerando que elas podem ter causado mais danos do que benefícios, disseram fontes à Reuters.
Seis autoridades disseram que desejam debater e possivelmente mudar uma cláusula na declaração de estratégia do BCE que pede uma ação "especialmente vigorosa ou persistente" quando os juros estão em níveis baixos. Todos falaram sob condição de anonimato porque a discussão é privada e preliminar.
Espera-se que esse debate ocorra em uma revisão da estratégia do BCE que está prestes a iniciar e será concluída no próximo ano.
"Compramos trilhões e trilhões de euros em ativos e ainda não conseguimos que a inflação volte à meta", disse uma das fontes. "Anos após o fim desse estímulo, ainda estamos sentados em mais de 3 trilhões de euros de excesso de liquidez."
Os apelos representam um dos desafios mais diretos até agora à lógica que sustentou as políticas de afrouxamento quantitativo (QE, na sigla em inglês) implantadas por muitos bancos centrais após a crise financeira global para estimular as economias e evitar o risco de deflação.
O BCE comprou cerca de 5 trilhões de euros em dívidas -- principalmente títulos públicos -- durante quase uma década antes da pandemia da Covid-19 e também concedeu empréstimos sem juros aos bancos.
Embora a questão pareça distante agora que a inflação está acima da meta e as taxas de juros estão altas, comentários recentes do Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), um grupo global que reúne os bancos centrais, reacenderam o debate sobre a eficácia do QE.
"O BIS gerou uma grande tempestade neste fim de semana e acho que eles estão certos quando dizem que precisamos reavaliar a forma como usamos algumas de nossas ferramentas", disse uma das fontes do BCE.
Um porta-voz do BCE não quis comentar.
O BIS argumentou que o uso prolongado da política monetária ultrafrouxa gera retornos decrescentes e cria efeitos colaterais indesejáveis, incluindo a tomada excessiva de riscos por parte de empresas, famílias e governos.
"Essas limitações não foram totalmente apreciadas na época em que as medidas foram introduzidas pela primeira vez", disse em sua principal publicação.
Em vez disso, argumentaram as fontes, os bancos centrais poderiam simplesmente conviver com uma inflação modesta abaixo do esperado, pois o custo é relativamente pequeno em comparação com o esforço de estímulo.
O BCE encerrou seus programas de QE em 2022 e vem reduzindo seus títulos desde 2023.
Porém, 3 trilhões de euros de excesso de liquidez permanecem no sistema, mesmo após uma série de aumentos acentuados nos juros, e ainda pode levar meia década para cair para os níveis desejados.
Todos as seis autoridades do BCE que falaram com a Reuters concordaram que as compras de ativos eram a ferramenta certa no caso de um choque como a pandemia, para a qual o banco central da zona do euro lançou um esquema separado de compra de títulos.
Mas outros disseram que o QE não deveria ser usado com tanta intensidade e por tanto tempo para responder a questões de longo prazo, principalmente deficiências estruturais que precisam ser resolvidas pelos governos e não pelos bancos centrais.
Todas as seis fontes afirmaram que o BCE deveria manter uma abordagem simétrica em relação à sua meta de 2%, mas algumas argumentaram que ele deveria remover seu compromisso com uma resposta especialmente vigorosa ou persistente aos preços baixos. Outras querem um reconhecimento claro de que as compras prolongadas de ativos não são um instrumento de política adequado.