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ANÁLISE-Investidores temem que negociações com FMI deixem Argentina leniente com questão fiscal

Publicado 02.03.2020, 16:41
Atualizado 02.03.2020, 16:45
© Reuters.

Por Hugh Bronstein e Cassandra Garrison

BUENOS AIRES (Reuters) - Um novo programa que está sendo discutido pela Argentina e seu maior financiador, o Fundo Monetário Internacional (FMI), pode definir grandes perdas para detentores de títulos privados sem exigências de cortes de gastos necessários para tornar o país solvente, dizem investidores.

A Argentina e o FMI anunciaram no mês passado que iriam iniciar consultas do Artigo IV --permitindo que o FMI inspecione as contas da Argentina-- como trampolim para um possível novo programa que substituiria um vencido contrato de empréstimo de 57 bilhões de dólares feito pelo governo anterior em 2018.

Uma equipe técnica do FMI deve chegar a Buenos Aires esta semana para se reunir com funcionários do Ministério da Economia e revisar os planos econômicos do governo de esquerda.

As negociações com o FMI fazem parte de uma reestruturação mais ampla de cerca de 100 bilhões de dólares em dívidas que o governo argentino alega que consegue pagar contanto que tenha tempo para ressuscitar o estagnado crescimento econômico.

Analistas e detentores de títulos disseram que as discussões sobre um novo programa entre o governo do presidente Alberto Fernández e o FMI são melhores do que a alternativa de a Argentina unilateralmente impor seus termos sem retorno do FMI.

Mas até agora o Fundo não contestou a recusa da Argentina de impor austeridade fiscal a uma economia em recessão.

Isso está provocando inquietação entre investidores --os quais esperam que o novo programa inclua critérios para conter os gastos, à medida que se preparam para grandes "descontos" ou reduções nos principais pagamentos de seus títulos.

"Nossa visão é que a capacidade da Argentina de pagar sua dívida é muito maior do que o governo alega, e eles deve ter como objetivo um superávit fiscal maior", disse Steffen Reichold, gestor de recursos da Stone Harbor Investment Partners, que detém algumas dívidas argentinas.

"Muitas pessoas levantaram esse ponto. Nós o levamos ao FMI. Essa será uma questão importante nas discussões quando a Argentina fizer sua primeira oferta", afirmou ele.

O ministro da Economia da Argentina, Martín Guzmán, enfatizou dois pontos em conversas com o FMI e comentários ao Congresso: o governo, no comando do país desde dezembro, não vai continuar pagando dívidas que considera insustentáveis e a austeridade fiscal apenas prejudicará a capacidade de pagamento do país ao piorar a economia.

Guzmán insiste que o crescimento, não os superávits fiscais, deve ser o primeiro ponto da agenda, enquanto tenta orientar a terceira maior economia da América Latina em direção à solvência. Wall Street, ciente da história de décadas de má administração financeira da Argentina, quer uma supervisão rigorosa do FMI.

"O mercado gostaria que o Fundo usasse sua credibilidade e experiência institucional para incentivar as autoridades a fortalecer sua posição fiscal e adotar reformas estruturais", disse Alberto Ramos, analista de mercados emergentes da Goldman Sachs.

"Mas parece que o FMI não fará isso. O Fundo parece feliz com a falta de compromisso da Argentina em melhorar significativamente o quadro fiscal de médio prazo e lidar com seus perenes desequilíbrios fiscais", afirmou Ramos.

Guzmán disse que deseja evitar um novo calote como ocorrido no passado ao firmar um acordo de colaboração com os detentores de títulos desta vez.

Não vai ser fácil. Os preços dos títulos já mostram expectativas de um desconto de 40% a 50%, dependendo do vencimento dos títulos e se a dívida é gerida pela lei local, disse Marco del Pont, chefe de operações da Silver Cloud Advisors em Buenos Aires.

A grande questão, disseram os analistas, é se o FMI vai assinar um programa que não contém determinações para corte de gastos, a fim de garantir a capacidade do governo de pagar suas dívidas.

"O FMI pedirá medidas mais duras para a Argentina, e o governo deve tomá-las se quiser o apoio do Fundo", disse Marco del Pont.

"Há uma grande incerteza, e o tempo está passando", disse ele. "Eu ficaria muito cauteloso."

(Por Hugh Bronstein e Cassandra Garrison)

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