Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro voltou a reclamar, em pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV, de restrições impostas por governadores para a circulação de pessoas para conter o avanço do coronavírus e chamou novamente a pandemia --que já matou 46 e infectou 2.201 pessoas no país-- de uma "gripezinha".
Durante o pronunciamento do presidente, houve o registro de uma série de panelaços em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, como tem ocorrido nas últimos noites.
Bolsonaro defendeu que algumas poucas autoridades estaduais e municipais deixem de lado o discurso de "terra arrasada" e novamente disse que o país não pode parar em razão do vírus, uma vez que os empregos têm de ser preservados. O presidente voltou a minimizar os efeitos da pandemia.
"O vírus chegou, está sendo enfrentado por nós e brevemente passará. Nossa vida tem que continuar. Os empregos devem ser mantidos. O sustento das famílias deve ser preservado", disse.
"Devemos, sim, voltar à normalidade. Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, como proibição de transporte, fechamento de comércio e confinamento em massa", completou.
Bolsonaro atacou novamente os meios de comunicação por estarem supostamente criando pânico e histeria entre os brasileiros. Ele disse que, "contra tudo e todos" o governo federal tomou medidas de esclarecimento e preparo do Sistema Único de Saúde (SUS) para atender possíveis vítimas, ao mesmo tempo em que traçou estratégia para "salvar vidas e evitar o desemprego em massa".
"Grande parte dos meios de comunicação foram na contramão. Espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro chefe o anúncio de um grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com um clima totalmente diferente do nosso. Um cenário perfeito, potencializado pela mídia, para que uma verdadeira histeria se espalha-se pelo nosso país", criticou.
O presidente ressalvou que, de segunda para esta terça-feira, "parte da imprensa" mudou seu editorial e tem pedido calma e tranquilidade. "Isso é muito bom. Parabéns, imprensa brasileira. É essencial que o equilíbrio e a verdade prevaleça, entre nós", afirmou.
Bolsonaro disse que no mundo o grupo de risco para o coronavírus é de pessoas acima de 60 anos. Contrariando o que dizem especialistas mundo afora, ele questionou medidas de isolamento social.
"Então, por que fechar escolas? Raros são os casos fatais de pessoas sãs, com menos de 40 anos de idade. Noventa por cento de nós não teremos qualquer manifestação caso se contamine. Devemos, sim, é ter extrema preocupação em não transmitir o vírus para os outros, em especial aos nossos queridos pais e avós, respeitando as orientações do Ministério da Saúde", afirmou.
GRIPEZINHA
O presidente afirmou que pessoalmente, pelo histórico dele que chamou de "atleta", se fosse contaminado pelo vírus não precisaria se preocupar. "Nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadinho", disse.
Em linha com o que tem dito o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Bolsonaro disse que o mundo busca tratamento para a doença, citando atuação do órgão regulatório de remédios dos EUA e um hospital particular em São Paulo que estudam o uso de uma medicação já usada para o tratamento do novo coronavírus.
"Acredito em Deus, que capacitará cientistas e pesquisadores do Brasil e do mundo na cura desta doença. Aproveito para render as minhas homenagens a todos os profissionais de saúde. Médicos, enfermeiros, técnicos e colaboradores que, na linha de frente nos recebem nos hospitais. Nos tratam e nos confortam", disse.
"Sem pânico ou histeria, como venho falando desde o início, venceremos o vírus e nos orgulharemos de estar vivendo neste novo Brasil, que tem tudo, sim, para ser uma grande nação. Estamos juntos, cada vez mais unidos, Deus abençoe nossa pátria querida", finalizou.
REAÇÃO
Rapidamente, o discurso de Bolsonaro gerou duras reações.
Uns dos primeiros a se manifestarem foram o presidente do Congresso Nacional e Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), ele próprio infectado pelo novo coronavírus, e o primeiro vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSD-MG).
"Neste momento grave, o país precisa de uma liderança séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população", disse Alcolumbre e Anastasia em nota.
"Consideramos grave a posição externada pelo presidente da República hoje, em cadeia nacional, de ataque às medidas de contenção ao Covid-19. Posição que está na contramão das ações adotadas em outros países e sugeridas pela própria Organização Mundial da Saúde (OMS)."
Os dois senadores defendem na nota que "é momento de união, de serenidade e equilíbrio, de ouvir os técnicos e profissionais da área para que sejam adotadas as precauções e cautelas necessárias para o controle da situação, antes que seja tarde demais".
"A nação espera do líder do Executivo, mais do que nunca, transparência, seriedade e responsabilidade. O Congresso continuará atuante e atento para colaborar no que for necessário para a superação desta crise", conclui a nota.