Por Catarina Demony e Lisandra Paraguassu
LISBOA/BRASÍLIA (Reuters) - O governo brasileiro quer ampliar para 40% o transporte por ferrovia de cargas para exportação até 2035, em um esforço que envolve investimentos públicos e privados para tirar o país da concentração no modelo rodoviário, disse nesta quinta-feira à Reuters o ministro dos Transportes, Renan Filho.
Em Lisboa, onde faz um "roadshow" para apresentar a investidores europeus oportunidades na área de ferrovias, rodovias e hidrovias no âmbito do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o ministro afirmou em entrevista que a expansão do modal ferroviário é fundamental para um país do tamanho do Brasil.
"A nossa meta é: hoje o Brasil exporta por ferrovias somente 17% do que produz. O país deseja com o novo plano nacional de logística até o ano de 2035 levar esses 17% para 40%. Isso precisa somar esforços de investimentos privados com público para garantir o atingimento dessa meta", disse.
No pacote de obras de infraestrutura que serão oferecidas aos investidores, o setor ferroviário representa investimentos de 94,2 bilhões de reais, enquanto a maioria dos recursos -- 185,8 bilhões -- será dirigida a rodovias.
Ainda assim, Renan Filho explicou que o pacote inclui ligações a partir da conclusão da ferrovia Norte-Sul, finalizada este ano depois de 36 anos de obras, e também seis novas linhas ferroviárias de transporte de passageiros.
"Nós queremos fazer várias conexões com ela (Norte-Sul). Nós temos a Leste-Oeste projetada. Temos a conclusão da Transnordestina. Todas elas mais focadas no transporte de carga para garantir mais competitividade internacional", explicou.
Em construção há 15 anos, a ferrovia Transnordestina, planejada para ligar o município de Eliseu Martins (PI) aos portos de Pecém (MA) e Suape (PE), tem um projeto de 1.753 km, mas pouco mais da metade foi feita até agora. Segundo o ministro, a ligação é fundamental para alcançar a meta de chegar a 40% de transporte de cargas para exportação por ferrovias.
"A primeira parte do projeto, que é a ligação de Eliseu Martins a Salgueiro e Salgueiro a Fortaleza, estará pronta até o final do ano de 2026, começo do ano 2027. Estamos estruturando o braço para Suape. Essa obra iniciará esse ano. Esperamos que esteja pronto em cinco anos", afirmou.
O ministro admitiu as dificuldades de incluir as ferrovias no modal de transporte de passageiros no país, mas contou que o pacote de obras propostas irá incluir seis novas linhas -- o que, se confirmadas, irá multiplicar por quatro o total existente no Brasil. Hoje estão em funcionamento apenas duas ferrovias interestaduais, uma conectando Pará e Maranhão e outra entre Espírito Santo e Minas Gerais.
Estão sendo preparados projetos para ligações entre Luziânia (GO) e Brasília; na região de Feira de Santana (BA); e linhas de ligação entre São Paulo e Paraná.
"São algumas linhas que estão em finalização de estudos de viabilidade e em busca de atração de investimentos privados em parcerias público-privadas, porque linhas de trem precisam também de investimento público", explicou.
"O problema do Brasil é que é um país com dimensão continental e as cidades ficam longe uma da outra. Por exemplo, um trem rápido de São Paulo ao Rio de Janeiro tentou ser estruturado no passado, mas só a obra custaria 50 bilhões de reais. Para concorrer com transporte aéreo, esse trem tem de ser de alta velocidade", disse.
Questionado sobre os impactos ambientais de um transporte focado em rodovias, o ministro respondeu que o impacto maior é justamente dos caminhões, daí o motivo de o governo ter a preocupação de crescer rapidamente o transporte de cargas por trem.
"O Brasil pretende ampliar o transporte de cargas porque principalmente o que mais emite é o caminhão, e não o transporte apenas de pessoas. Os aviões emitem muito, mas a gente ainda voa pouco no Brasil", afirmou.
O governo espera investimentos de até 260 bilhões de reais nos próximos três anos apenas em rodovias e hidrovias. Os investimentos públicos, segundo Renan Filho, devem ser de 80 bilhões, enquanto espera-se recursos privados na ordem de 180 bilhões, uma boa parte disso vindo de investidores estrangeiros.
Daí a razão para os "roadshows" que o governo está fazendo para mostrar as oportunidades no exterior. Depois de Lisboa, a carteira de investimentos deve ser apresentada em Dubai, China, Índia e Alemanha, principais parceiros nessas áreas.
O pacote de concessões, espera o ministro, deve ficar entre 180 bilhões e 200 bilhões de reais, com 35 leilões até o final do governo Lula.
(Reportagem de Catarina Demony, em Lisboa, e Lisandra Paraguassu, em Brasília)