Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, vai deixar o cargo para o qual foi escolhido pessoalmente pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, desde o início do governo Jair Bolsonaro, disse à Reuters uma fonte com conhecimento direto do assunto nesta quinta-feira.
Moro trabalha para fazer o sucessor de Valeixo no cargo e disse que não aceita a escolha de um nome do presidente ou uma indicação política. Se isso ocorrer, o ministro vai deixar o governo, disse essa fonte.
Mais cedo, em reunião no Palácio do Planalto, Bolsonaro avisou a Moro que iria trocar o chefe da PF, disse a fonte. O ministro da Justiça disse ao presidente inicialmente que não via sentido em permanecer no cargo caso houvesse a mudança de Valeixo, segundo a fonte.
Os ministros da Casa Civil, Braga Netto, do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, começaram a atuar então para garantir a permanência de Moro e passaram a buscar uma solução que atenda tanto ao ministro da Justiça quanto ao presidente.
Segundo a assessoria de imprensa do Ministério da Justiça, Moro não pediu demissão do cargo. O ministro ganhou notoriedade por seu trabalho como juiz da operação Lava Jato e é um dos mais populares ministros do governo.
A saída de Valeixo é uma derrota para Moro, que escolheu o chefe da PF no início do governo, em janeiro do ano passado. Os dois trabalharam juntos na Lava Jato em Curitiba (PR) --Valeixo foi superintendente da PF no Estado. Oficialmente, a asssesoria de imprensa da corporação não se manifestou sobre o assunto.
Essa não foi a primeira vez, no entanto, que Bolsonaro buscou trocar a chefia da polícia.
Em agosto do ano passado, o presidente disse que pretendia trocar Valeixo e destacou na ocasião ser o responsável pela indicação do chefe da polícia e não Moro, a quem a instituição é funcionalmente ligada. Mas na ocasião a mudança não prosperou após Moro também ter ameaçado sair.
Uma segunda fonte avaliou que a troca do diretor-geral da PF pode ser vista como um movimento de Bolsonaro para provocar Moro, a quem o vê com desconfiança e como potencial adversário na sucessão presidencial em 2022. A discussão sobre o comando da polícia seria apenas uma isca em todo esse lance, na avaliação dessa fonte. "O presidente quer testar para ver até onde Moro vai", disse.
Em um ano e quatro meses, o ministro da Justiça --um dos mais populares integrantes do governo-- teve embates com o presidente e com parte do Congresso Nacional, que o retaliou por ações quando ele esteve à frente da Lava Jato como na desidratação do chamado pacote anticrime.
A iniciativa do presidente de mudar o comando da PF ocorre após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter autorizado a abertura de um inquérito para apurar os organizadores de atos do domingo que pediram o fechamento da corte, do Congresso e uma intervenção militar.
Bolsonaro participou de um dos atos em frente ao QG do Exército em Brasília. O presidente, no entanto, não é alvo da apuração, que será conduzida pela PF e foi requerida pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.
O presidente também se aproximou nas últimas semanas de parlamentares do centrão, grupo de influente partidos no Congresso e que têm parlamentares como alvo da operação Lava Jato.
A nova investida de Bolsonaro sobre a PF ocorre depois também de o presidente ter demitido na semana passada Luiz Henrique Mandetta, titular da Saúde e que ficou bastante popular durante o combate à epidemia do coronavírus no país.
REUNIÃO
O coordenador da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado federal Capitão Augusto (PL-SP), disse ter conversado por telefone duas vezes com Moro nesta quinta-feira. A primeira delas, por volta das 11h, quando tratou de marcar uma reunião com o ministro na próxima terça-feira a fim de tratar sobre questões referentes a soltura de presos.
Posteriormente, os dois voltaram a se falar às 14h, assim que surgiram informações de eventual saída de Moro, o coordenador da bancada da bala quis saber se o encontro da semana que vem iria ocorrer. Segundo o deputado, Moro disse que a reunião estava mantida e a notícia da saída dele não procedia.
Na manhã desta quinta, o diretor-geral da PF teve uma reunião por videoconferência com superintendentes da corporação dos 27 Estados e do Distrito Federal. No encontro, segundo uma fonte, ele mencionou que não tem apego ao cargo ao lembrar que a função é de livre nomeação.
O presidente da Associação de Delegados da Polícia Federal, Edvandir Paiva, admitiu à Reuters na tarde desta quinta que o diretor-geral da PF não estava confortável no cargo desde o ano passado. Disse que ele é um policial sério, mas toda hora há essa conversa de troca na PF mesmo sem ele ter feito "nada de errado".
"Aí ele vai se cansando, me parece natural que após um ano e meio nesse processo, ele queira sair", disse Paiva à Reuters. "Quem vai ficar nesse processo?", questionou.
(Reportagem adicional de Lisandra Paraguassu)