Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - Procuradores da força-tarefa da operação Lava Jato em São Paulo decidiram renunciar coletivamente alegando haver um processo de "desmonte" dos trabalhos e "incompatibilidades insolúveis" com a procuradora natural do caso, Viviane de Oliveira Martinez, segundo ofícios enviados para a cúpula do Ministério Público Federal divulgados na noite de quarta-feira.
O desligamento de sete membros que integravam a Lava Jato paulista, incluindo a coordenadora do grupo, a procuradora regional Janice Ascari, foi anunciada um dia após o anúncio da saída do procurador Deltan Dallagnol do posto de chefe da força-tarefa da operação em Curitiba, berço da Lava Jato, que passa atualmente por seu momento mais delicado.
Em um dos documentos, encaminhado ao procurador-geral da República, Augusto Aras, o grupo paulista cita "incompatibilidades insolúveis" com a procuradora natural do caso, pede o desligamento do grupo, mas se coloca à disposição para uma transição.
Em outro ofício a integrantes do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), órgão administrativo máximo da instituição, os procuradores detalham em 13 páginas uma série de dificuldades enfrentadas pela força-tarefa paulista --criada inicialmente em junho de 2017-- desde março deste ano, com a assunção de Viviane como procuradora natural do caso.
O grupo relatou que a procuradora, que chegou a dizer que "não faria parte da força-tarefa" e que nem sequer peticionou ou participou de reuniões sobre investigações, começou a criar embaraços para a realização de apurações. Houve, segundo o documento, um pedido feito por email por Viviane em junho para que uma operação planejada que tinha alvo o senador e ex-governador José Serra (PSDB-SP) fosse adiada.
Os procuradores argumentam que a procuradora não apresentou qualquer razão jurídica para fundamentar o pedido --ela teria argumentado apenas que, em agosto, o Conselho Superior do MPF poderia criar a unidade de combate à corrupção e os casos da Lava Jato deixariam a sua responsabilidade.
"Ao longo dos meses, os signatários tentaram, de todas as formas possíveis no limite de suas atribuições, impedir que esse processo de desmonte, conduzido pela nova titular do 5º ofício, seguisse adiante. Mesmo sem poderem contar com as ajudas dela ou de sua assessoria na condução dos casos afetos a esta força-tarefa, seguiram neles atuando e cumprindo com seus deveres", disse o grupo.
"A situação, entretanto, tornou-se insustentável a partir do momento em que a Procuradora da República Viviane, intensificando sua postura de desmonte do acervo da força-tarefa, passou a decidir unilateralmente, sem debater com estes signatários, ou mesmo sequer sem comunicá-los, declinando feitos e trabalhando em várias vias por suas redistribuições", completou.
Procurada, a procuradora Viviane não se manifestou a respeito das alegações que levaram ao desligamento dos colegas.
Em conversa no início do mês passado com a Reuters, sob a condição do anonimato diante da sensibilidade das investigações, um integrante da força-tarefa paulista avaliou que considera que a força-tarefa começou a funcionar, de fato, a partir de maio do ano passado, quando ela conseguiu uma maior estrutura de trabalho e procuradores com dedicação exclusiva.
Desde então, segundo essa fonte, operações passaram a ser deflagradas e denúncias foram feitas, envolvendo membros do PSDB, como Serra e o ex-governador Geraldo Alckmin. Havia a expectativa de novos desdobramentos das investigações serem realizadas até o fim do ano, afirmava a fonte na ocasião.
Recentemente, contudo, o Supremo passou a impor derrotas para a Lava Jato paulista ao retirar, por exemplo, ação contra Serra da primeira instância e remetendo para a corte. O STF já vinha impondo reveses desse tipo à força-tarefa de Curitiba.
No final de um dos ofícios, o grupo de procuradores de São Paulo lamentou o desligamento, disse que tinha "muito a produzir" e se colocou à disposição para discutir um novo formato que permita a continuar as investigações sem os problemas relatados.