Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - Para além do discurso otimista de que o regime de Nicolás Maduro está próximo do fim, o governo brasileiro não tem, de fato, informações concretas sobre possíveis negociações para o fim do regime ou de movimentos dos militares que ainda apoiam o atual governo venezuelano, admitiu nesta sexta-feira o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
"A inteligência que a gente acompanha é mais pelos contatos que temos nas forças democráticas da Venezuela, não temos uma inteligência específica das movimentações. Nós temos a expectativa, a esperança, de que haja realmente elementos que ainda eram fiéis ao regime de Maduro que possam transferir sua lealdade para o regime legítimo. Esperamos que esteja acontecendo, que se avolume", afirmou o chanceler em uma longa entrevista no Itamaraty.
O Brasil trabalha com outros países, no chamado Grupo de Lima, para aumentar a pressão sobre o governo de Maduro e forçar, diplomaticamente, uma mudança de regime. Parte do governo brasileiro admite que o atual presidente venezuelano só deixaria o poder se fosse dada a ele uma saída que não o levasse à prisão --uma posição que tem sido defendida pelo vice-presidente, Hamilton Mourão.
Perguntado sobre qual seria a saída para Maduro, Araújo respondeu que a melhor seria a "a porta da rua".
"O Brasil não está envolvido diretamente em negociar ou formatar o que seria essa saída. Nós entendemos que essa função é dos venezuelanos, desse novo quadro democrático que está se formando em torno do presidente encarregado Juan Guaidó", disse.
No entanto, frisou Araújo, qualquer solução só será aceitável com a saída do atual governo e de Maduro.
"O final da crise só virá quando houver uma substituição completa do regime atual, inclusive com seu líder, por um regime plenamente democrático, primeiro por seu presidente encarregado e depois por eleições livres", defendeu.
Araújo insistiu que o maior papel do governo brasileiro e de outros países é a pressão internacional e que isso teria levado o governo de Maduro a balançar pela primeira vez.
O governo brasileiro estuda ainda, segundo o chanceler, novas medidas de pressão. Admitiu que entre elas podem estar o congelamento de bens de venezuelanos no Brasil ou até mesmo a transferências de contas de créditos do atual governo para passarem a ser administradas pelo governo interino.
"Do ponto de vista de pressão externa sobre o regime, o congelamento de bens em muitos casos é um instrumento útil. Teremos que ver se seria possível implementar dentro da legislação brasileira", afirmou. "Temos que fazer dentro da legislação e das normas internacionais. Isso requer uma coordenação que no caso vai além do Itamaraty."
A legislação brasileira não autoriza sanções unilaterais, mas apenas aquelas determinadas por órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas. O congelamento de bens poderia ser feito, no entanto, em casos de pessoas condenadas por crimes, segundo as regras internacionais.
CHINA E RÚSSIA
O chanceler brasileiro disse esperar que Rússia e China, principais aliados internacionais da Venezuela, vejam a realidade do país e que o Brasil está disposto a contribuir para isso se os dois países se dispuserem ao diálogo.
"Esperamos que China e Rússia vejam a realidade da Venezuela. Se houver uma disposição deles de conversar com quem conhece a realidade, estamos dispostos", afirmou.
Araújo atacou duramente o governo do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, afirmando que o regime é fortemente ligado ao crime organizado, narcotráfico e terrorismo, mas que a pressão internacional e o papel do Brasil levaram o país pela primeira vez mais perto de ver o fim do regime.
"A situação ainda não está totalmente definida em favor da democracia. É preciso continuar trabalhando para consolidar essa esperança", defendeu.
(Reportagem de Lisandra Paraguassu; Edição de Alexndre Caverni)