(O autor é editor de Front Page do Serviço Brasileiro da Reuters. As opiniões expressas são do autor do texto)
Por Alexandre Caverni
SÃO PAULO (Reuters) - A eleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) como presidente da Câmara dos Deputados permite várias leituras, sendo as mais óbvias e imediatas as que dizem que o presidente interino Michel Temer ficou bem na fotografia e que o deputado suspenso Eduardo Cunha (PMDB-RJ) saiu derrotado do pleito.
Mas quando se olha para os papéis desempenhados pelo PMDB e pelo chamado centrão na disputa as coisas não são tão simples.
Se é verdade que foi eleito um aliado do governo, também é verdade que nenhum dos candidatos com chance de ganhar era da oposição, mas isso não foi suficiente para evitar que o governo atuasse fortemente contra um desses concorrentes.
Para tentar não embolar mais uma disputa com potenciais sequelas à sua base, o governo não queria que o PMDB lançasse um candidato para se juntar aos vários nomes do centrão --bloco ligado a Cunha-- e da antiga oposição que já estavam na corrida.
Mas o PMDB não só lançou um candidato, como o escolhido pela bancada foi Marcelo Castro (PI), um ex-ministro da presidente afastada Dilma Rousseff que votou contra o impeachment da petista.
A candidatura Castro mostrou a insatisfação de uma parcela dos deputados peemedebistas com o tratamento dado pelo governo a legendas aliadas, incluindo aí a distribuição de cargos.
Pode não ter sido mais do que uma mensagem, mas a candidatura recolocou na disputa o PT e os contrários ao impeachment e isso, mais do que qualquer outra coisa, foi o que levou o Palácio do Planalto a entrar para valer no jogo.
Não que Castro viesse a ser um incômodo se tivesse ganhado, mas sua eleição permitiria que alguém dissesse que o PT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma tinham saído vitoriosos e, por consequência, que Temer tinha sido derrotado. Daí o esforço do Planalto para impedi-lo de sequer chegar ao segundo turno.
O trabalho funcionou, mas o recado dos peemedebistas foi dado. Castro ficou em terceiro lugar e o segundo turno ocorreu com os candidatos desejados pelo governo: Maia e Rogério Rosso (PSD-DF), que no início do processo era o preferido pelo Planalto.
O resultado final (285 a 170), porém, levanta outro ponto.
Como representante do centrão na segunda votação, Rosso teria, teoricamente, ótimas chances de vencer. Mas ele acabou não conseguindo garantir nem o apoio de todos os cerca 200 deputados que o bloco tem.
Em boa medida inspirado e organizado por Cunha, o centrão iniciou o governo Temer como a principal força da Câmara, a ponto de ter conseguido impor um membro do grupo como líder do governo na Casa.
Com a redução do poder do deputado suspenso, o bloco pode estar começando a perder a liga que unia mais de dez partidos sem um projeto comum e isso pode explicar por que Rosso não conseguiu todos os votos que o centrão poderia lhe dar.
Por outro lado, o fato de o deputado do PSD ser ligado a Cunha foi decisivo para que ele não conseguisse votos fora da esfera de influência do ex-presidente da Câmara.
Enquanto isso, no segundo turno Maia atraiu votos dos adversários de Cunha, incluindo da nova oposição, apesar da crítica ferrenha que o deputado do DEM fez aos governos petistas.
A perda de força e unidade do centrão demonstrada na votação de Rosso pode ser um prenúncio de uma nova correlação de forças na Câmara e uma coisa boa para o governo. Afinal, o que era poder de barganha do bloco para uns, era visto como simples chantagem pelos críticos.
Mas um enfraquecimento grande demais do centrão não é do interesse do Palácio do Planalto porque se o grupo se dispersar demais algumas negociações na Câmara podem ficar até mais complicadas ou, pelo menos, mais demoradas.
O importante para o governo agora não é tentar nem enfraquecer mais, nem fortalecer o centrão. A tarefa neste momento é trabalhar junto com Maia para curar eventuais feridas decorrentes da disputa.
Não por acaso, logo depois de eleito, o novo presidente da Câmara falou em diálogo e em "pacificar o plenário" e, nesta manhã ao comentar o pleito, Temer falou em "harmonia muito maior".
Tudo o que o presidente interino não precisa é ter que lidar com retaliações inesperadas nas importantes votações que acontecerão no segundo semestre.