Por Lisandra Paraguassu
(Reuters) - Se oficialmente o governo brasileiro tenta minimizar o impacto da eleição de Donald Trump para o país, nos bastidores fontes governistas e diplomáticas não escondem a preocupação com as dificuldades que o Brasil deve enfrentar, especialmente no campo comercial.
Avesso a acordos comerciais, que vê como uma exportação de empregos norte-americanos, Trump possivelmente não terá interesse em levar adiante as conversas de aproximação comercial iniciadas pelo governo brasileiro.
"Possivelmente vai enterrar o sonho da aproximação comercial. Esse é um tema que vai sim ficar complicado", disse à Reuters uma alta fonte diplomática.
A relação com os Estados Unidos foi colocada como uma das prioridades do governo de Michel Temer, assim que assumiu, ainda como interino, com o afastamento da ex-presidente Dilma Rousseff.
Apesar das dificuldades de um acordo comercial clássico, o Itamaraty trabalha para eliminar barreiras, especialmente não tarifárias, com o seu segundo maior parceiro comercial.
No governo brasileiro havia a certeza de que Hillary Clinton seria eleita --além de uma preferência pela democrata, já que a avaliação no Palácio do Planalto era de que Trump era excessivamente "imprevisível" e podia prejudicar os interesses comerciais do país.
A avaliação de que o republicano não tinha chances levou o ministro das Relações Exteriores, José Serra, a criticar abertamente Donald Trump e desconsiderar sua possível eleição.
Em junho deste ano, o chanceler havia dito, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, que Trump não podia ser eleito. Um mês depois, falando ao jornal Correio Braziliense, considerou a escolha do republicano como um "pesadelo".
"Eu considero a hipótese do Trump um pesadelo. Pesadelos, às vezes, se materializam? Se materializam, mas eu prefiro não pensar nisso, fazer o jogo do contente", disse, acrescentando que torcer por Hillary, tratava-se de "ser sensato, torcer para o bem do mundo".
Uma fonte diplomática considerou as declarações de Serra colocaram o governo brasileiro numa "situação delicada".
"Não vai ser fácil a retomada dessa relação. Precisamos mostrar que o Brasil é diferente (do resto da América Latina), que somos abertos e trabalhamos com todos", disse à Reuters uma fonte diplomática.
O diplomata lembra que a posição brasileira sempre foi de não comentar candidatos ou eleições em outros países e nunca escolheu parceiros, e agora terá que trabalhar para tentar minimizar o estrago.
"Temos de ter muito cuidado para não bater de frente com um presidente que representa a maioria da sociedade americana", disse.
No Palácio do Planalto, a ordem é seguir em frente e "trabalhar com o que temos". Imediatamente após saber o resultado da eleição norte-americana, o presidente Michel Temer iniciou o trabalho de mostrar que o Brasil não tem oficialmente preferências.
Temer deu entrevistas a duas rádios, enviou um telegrama a Trump e pôs seu porta-voz, Alexandre Parola, para dar declarações, em um primeiro trabalho de pavimentar uma relação ao menos institucional com o novo governo dos Estados Unidos.
Nem o Itamaraty nem José Serra haviam se manifestado oficialmente até o meio desta tarde. De acordo com assessores do ministro, ele deve fazê-lo ainda nesta quarta-feira.