BRASÍLIA (Reuters) - Na decisão liminar que determinou a devolução do passaporte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o juiz convocado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), Bruno Apolinário, disse que somente com um "grande exercício de imaginação" chegar à conclusão de que o petista poderia fugir do país.
O magistrado rebateu os dois argumentos usados pela Justiça Federal de Brasília para reter o documento de Lula, determinado a pedido do Ministério Público Federal, um dia após ele ter sua condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) por lavagem de dinheiro e corrupção passiva no processo do tríplex do Guarujá, no litoral paulista.
Bruno Apolinário não concordou com a alegação de que haveria risco de que Lula pedisse asilo político em outro país, em razão de supostos comentários de aliados dele e confirmado por declarações do petista segundo as quais o Poder Judiciário teria lhe aplicado um golpe ao condená-lo.
"Trata-se de uma conjectura do magistrado desprovida de demonstração concreta desse suposto intento do paciente. Pode-se discordar das tais críticas, mas daí a afirmar que, por esses pronunciamentos, ele estaria dando mostras da intenção de fixar domicílio no exterior, como 'exercício de um suposto direito de defesa', como colocado pelo julgador, há um patente excesso, em razão da inexistência de indicação de declarações explícitas ou atitudes concretas que, efetivamente, revelassem o intento de fuga", destacou o juiz convocado, na decisão.
O magistrado destacou que é "fato notório" que Lula se lançou pré-candidato à Presidência da República em 2018, o que desautoriza a suposição de que ele pretenda ser acolhido por qualquer Estado estrangeiro. O juiz ressalvou que isso independe do fato de a candidatura do petista ser confirmada, porque ele foi condenado em segunda instância - Lula poderá, dessa forma, ser barrado pela Lei da Ficha Limpa.
Apolinário também rechaçou o fato de que as viagens internacionais poderiam retardar o andamento de processos criminais em que Lula figura como réu na 10ª Vara Federal de Brasília. Em uma das ações, ele tem um interrogatório marcado para este mês.
O juiz disse que não houve a demonstração de que o petista tenha colocado obstáculos à realização de atos processuais.
"Mais especificamente, não há qualquer evidência de que ele tenha procrastinado o andamento do processo em razão de eventual viagem internacional que tenha feito. À falta de demonstração clara de comportamento do paciente atentatório ao bom andamento do processo, tem-se que o receio esposado pela autoridade coatora não passa de elucubração sem correspondência com o caso concreto", criticou o magistrado, ao destacar que Lula sempre compareceu a prestar esclarecimentos nas investigações contra ele.
Apolinário citou ainda todas as medidas que Lula tomou, antes mesmo do julgamento que o condenou pelo TRF-4, para informar sobre a viagem que faria à Etiópia, onde participaria de evento em que seria discutido o combate à fome na África. Para ele, não há como concluir que o ex-presidente pretendesse fugir do país com a finalidade de frustrar a aplicação da lei penal.
"Ao contrário, percebe-se na conduta do paciente o cuidado de demonstrar, sobretudo ao Poder Judiciário, que sua saída do país estava justificada por compromisso profissional previamente agendado, seria de curta duração, com retorno predeterminado, e que não causaria nenhum transtorno às ações penais às quais responde perante nossa Justiça, uma vez que nenhum ato processual que demandasse a sua presença estava previsto para ocorrer no período de sua ausência", afirmou.
O juiz aceitou a liminar para suspender os efeitos da decisão, com a devolução do passaporte de Lula e a exclusão do nome do ex-presidente do Sistema Nacional de Procurados e Impedidos da Polícia Federal.
(Reportagem de Ricardo Brito)