Por Roberta Rampton e Mitra Taj
WASHINGTON, 10 Abr (Reuters) - O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cancelou sua primeira viagem oficial à América Latina, anunciou a Casa Branca nesta terça-feira, provocando uma mistura de alívio e críticas de uma região que Trump tem repetidamente menosprezado por conta de imigração, narcóticos e comércio.
Trump quer se focar na resposta que o país dará a um possível ataque a armas químicas na Síria e irá enviar em seu lugar o vice-presidente, Mike Pence, para a Cúpula das Américas, em Lima, informou a Casa Branca. O anúncio acontece no momento em que Trump também contenta uma operação do FBI nos escritórios e na casa de seu advogado pessoal.
A participação de Trump no encontro de chefes de Estado do hemisfério ocidental era esperada, mas com uma certa tensão, por causa de sua retórica desagregadora e relações conturbadas com líderes como o presidente do México, Enrique Peña Nieto.
“Nós vamos sentir falta dele”, disse o ministro da Economia do México, Ildefonso Guajardo, que deve falar sobre esforços para atualizar o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta) com seus homólogos dos EUA e Canadá.
Para uma fonte do governo brasileiro, a decisão de Trump "não é uma surpresa, mostra a prioridade que Trump dá à região".
"Mas isso não impede que se avance em algumas pautas, talvez até facilite", acrescentou.
O cancelamento fez com que ao menos um líder regional, o presidente da Bolívia, Evo Morales, reconsiderasse participação.
“Eu gostaria de me encontrar com o presidente dos EUA cara a cara para debater políticas econômicas e sociais”, disse Morales, um crítico a Trump, em comentários televisionados em um evento público.
O cancelamento marca uma nova primeira vez para os EUA sob o governo Trump, que vem contrariando tradições da Casa Branca desde que assumiu, em janeiro de 2017. Todas as edições da Cúpula das Américas tiveram participação de um presidente dos EUA desde a primeira, em 1994.
Richard Feinberg, da Universidade da Califórnia em San Diego, que liderou política latino-americana na Casa Branca de Clinton, chamou as mudanças de planos de “um abandono chocante de liderança dos EUA em nosso próprio hemisfério” e disse que isto “deixa um vácuo de liderança que outros irão se apressar para preencher”.
Trump havia planejado usar a cúpula para instar líderes latino-americanos a trabalharem com os EUA e não com a China em comércio e adotarem uma postura dura em relação à Venezuela, de acordo com uma autoridade dos EUA na semana passada.
Um diplomata peruano, que pediu para não ser identificado, disse que pode ser mais fácil para líderes regionais enfrentarem questões duras, variando de corrupção à Venezuela, sem Trump.
“Você tira o constrangimento do quadro”, disse o diplomata, que citou a impopularidade de Trump na América Latina.
Para muitos na América Latina, no entanto, a decisão de Trump de não comparecer à cúpula aprofundou a visão de que Trump não se importa com a região. “Previsível”, disse Juan Jiménez, ex-autoridade da Organização para os Estados Americanos (OEA), que também é ex-primeiro-ministro do Peru, em publicação no Twitter.
Ana Quintana, uma analista da conservadora Heritage Foundation, disse que Trump tomou a decisão correta em focar na questão mais urgente, da Síria.
Trump prometeu tomar ações fortes após um possível ataque com armas químicas na noite de sábado na cidade síria de Douma matar mais de 60 pessoas e ferir mais de mil. A Síria e a Rússia, sua aliada, disseram que não há evidências de que um ataque a armas químicas aconteceu e propuseram que inspetores internacionais visitem Douma para verem por si mesmos.
No ano passado, Washington bombardeou uma base aérea do governo sírio após um ataque a armas químicas.
(Reportagem de Roberta Rampton, em Washington, e Mitra Taj , em Lima; Reportagem adicional de Marco Aquino, em Lima, Luc Cohen, em Buenos Aires, Adriana Barrera, na Cidade do México, e Danny Ramos, em La Paz)